Nestes dias de incerteza e questionamento provocados pela pandemia da COVID-19, frugalidade e reaproveitamento alimentar podem bem vir a ser importantes nos tempos que se avizinham e, só por si, seriam razões importantes para aprendermos o básico do cultivo em casa. Mas, mesmo sem pandemias há vários motivos que justificam o darmo-nos ao trabalho de reaproveitar partes dos vegetais que consumimos para voltar a cultivá-los.
Se seguirmos as instruções do novo livro de Katie Elzer-Peters, poderemos não só aprender a reduzir os desperdícios na cozinha e poupar dinheiro, ter ingredientes frescos sempre à mão, enquanto controlamos a origem da nossa comida. Como sublinha a autora, “os nossos recursos são demasiados preciosos para desaproveitar. Não penso que as pessoas queiram desperdiçar comida, apenas não sabem o quanto podem ‘reciclar’ - mesmo o que parece lixo.
Poupa-se dinheiro e outros recursos” e, acrescenta, “O meu livro insere-se numa filosofia de sustentabilidade, sendo que uma das definições de sustentável é usar recursos de forma a que esses recursos não sejam depredados ou danificados de forma permanente, e é isso exatamente que o meu livro preconiza”.
Uma horta caseira, de desperdício zero ou não, é também uma fonte valiosa de entretenimento e aprendizagem para toda a família. Claro que já todos nós colocámos um feijão num algodão e vimos o milagre acontecer em frente aos nossos olhos, tendo obtido, em poucos dias uma nova plantinha que, se transplantada, daria origem a um feijoeiro e, mais tarde a novos feijões. Mas não é bem disso que se trata neste “Tudo se aproveita”; a questão aqui é a de fazer crescer comida a partir dos desperdícios de vegetais que, normalmente, acabam no lixo. É possível “fazer” novos alimentos a partir dos frutos e legumes que temos na despensa ou no frigorífico. Com explicações simples, desenhos e fotografias coloridas este livro é um manual útil quer para principiantes ou experientes nas lides da horticultura.
Depois de responder a todas as questões do “porquê dar-me ao trabalho” a autora mergulha nos aspetos científicos da horticultura. Aprendemos sobre as várias partes das plantas, como fazer germinar uma semente, as diferentes formas de propagação, as fases de desenvolvimento das plantas e como fazer o reaproveitamento a partir dessas fases e sobre compostagem. Katie Elzer-Peters brinda-nos ainda com dicas e curiosidades relacionadas com diversos vegetais, pequenas pérolas capazes de condimentar a conversa mais insípida. Por exemplo, sabia que os nabos foram as lanternas de Halloween originais? Ou que as batatas-doces podem servir para fabricar cola ou tinta?
Conhecida a ciência por detrás da horticultura de desperdício zero, a autora segue para nos ensinar a recultivar uma enorme variedade de vegetais que podem ser replantados a partir dos talos, caroços ou folhas que, habitualmente, desaproveitamos na preparação das refeições. Mas atenção, conseguir reaproveitar os desperdícios de um vegetal nem sempre significa obter outro. Por exemplo, o aproveitamento de uma cenoura não significa conseguir produzir novas cenouras, mas sim fazer crescer folhas que podem ser utilizadas como verduras.
O aproveitamento de uma cenoura não significa conseguir produzir novas cenouras, mas sim fazer crescer folhas que podem ser utilizadas como verduras.
Desengane-se se pensa que fazer horticultura de desperdício zero só é possível numa horta. Até num apartamento poderá fazê-lo, mesmo quem não tem uma varanda pode aventurar-se no cultivo caseiro. Segundo a autora, os vegetais mais indicados para hortas interiores são aqueles “em que aproveitamos as raízes ou folhas, tais como cebolinha ou alho-francês (desde que o recipiente seja grande o suficiente) e microvegetais. Acredite que é possível cultivar microvegetais num apartamento e que são extremamente nutritivos”.
Quando questionada sobre quais as plantas melhores para quem tem pouco espaço a autora elegeu as alfaces: “Os vegetais de folha, tais como as alfaces, são ótimos para os moradores em apartamentos porque toleram a luz que existe na maioria das casas e são fáceis de plantar. Se não tiver uma janela virada a este ou a sul pode sempre usar-se uma luz artificial para cultivo [Grow light]”.
Para aqueles que não têm quaisquer conhecimentos particulares de horticultura e estejam a pensar começar a cultivar os seus próprios alimentos Katie Elzer-Peters deixa alguns conselhos: “Se estivermos a pensar em cultivar vegetais em geral, diria para começar em pequena escala, em recipientes. Usar um bom substrato para o cultivo em recipiente e não esquecer de regar. Mas mais importante do que isso, qualquer um pode perguntar e pesquisar – seja num livro, num grupo de horticultores, aos vizinhos... Aprender o máximo que conseguir e tentar fazendo”.
Se estivermos a pensar em cultivar vegetais em geral, diria para começar em pequena escala, em recipientes.
Com mais este livro sobre horticultura, a autora “Adoraria que os leitores acreditassem que é possível produzir a sua própria comida, mesmo a partir de desperdícios alimentares. Eu não sou assim tão diferente, se eu consigo acreditem que vocês também podem fazê-lo.”
Apaixonada desde cedo pela horticultura, Katie Elzer-Peters transformou o seu hobby de sempre numa carreira profissional com créditos firmados.
Possui uma licenciatura em Horticultura Pública e um mestrado em Gestão de Jardins Públicos e apresenta um extenso percurso profissional ligado à área. Trabalhou como diretora de jardins, horticultora, coordenadora de programas educativos, gestora de desenvolvimento e administradora de jardins botânicos em diversos locais nos Estados Unidos.
Escreveu e editou vários livros de jardinagem e horticultura e é também editora-chefe do The Designer, o jornal trimestral da Association of Professional Landscape Designers.
Atualmente, para além de fazer jardinagem na sua casa na Carolina do Norte, é proprietária da The Garden of Words, LLC, uma empresa de marketing e relações-públicas especializada em clientes da indústria da jardinagem.
Esta é a terceira de uma série de três entrevistas sobre o movimento "zero waste". Reveja as entrevistas a Ana Milhazes e a Eunice Maia
Texto: Isabel Reis
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