Eduarda Abbondanza é a cara da ModaLisboa e congratula-se com o interesse sempre crescente que o evento tem suscitado junto dos principais órgãos de comunicação social de todo o mundo.

O que é a moda?
É a disciplina criativa que mais reflete sobre a atualidade e sobre o paradigma de mudança sempre permanente. E uma esponja que consome tudo e depois de consumir devolve através da criação de vários imaginários.  É o “l’air du temps”…

Terminou este Outono a 37ª edição da ModaLisboa, 20 anos depois da primeira apresentação no São Luiz. Alguma vez imaginou chegar até aqui?
Não. Porque a ModaLisboa funciona à semelhança da própria moda por ciclos de seis meses. Aquilo que para o comum das pessoas é um ano, para nós são sempre dois blocos e o trabalho é tão intenso que vamos andando de edição para edição, ou seja de estação para estação, sem contabilizar o tempo. E, de fato, o tempo passa e nós nem damos por ele…

O que a moveu a si, ao Mário Matos Ribeiro e ao Pedro Felgueiras para iniciar a ModaLisboa?
Nós os três fizemos só o ano zero, que foi o balão de ensaio, em 1990, no Jardim do Tabaco. Na primeira edição da ModaLisboa, no São Luiz, o Pedro Felgueiras já não estava, já tinha ido para Londres onde ainda hoje reside.

Recebemos um convite da Câmara Municipal de Lisboa, do Pelouro do Turismo, a propósito das festas da cidade.
Para além do Pátio da Galé, onde se voltou a realizar este ano, já tivemos ModaLisboa no Museu de História Natural, no Museu de Eletricidade, na Cidadela de Cascais, no Casino Estoril, entre outros.

Há um lugar particularmente mágico?
Houve um momento muito importante da ModaLisboa que foi o Pavilhão Terlis, em Alcântara, onde se realizaram cinco ou seis edições. Era um pavilhão exatamente com as dimensões que nós necessitávamos, e que nos permitia trabalhar bem. Esse espaço permitiu-nos apurar a excelência do trabalho das equipas. O Pátio da Galé neste momento está a posicionar-se da mesma maneira, é um espaço muito central na praça principal da cidade com uma acessibilidade muito grande.

Houve outros espaços emblemáticos?
O São Luiz, onde começámos, e que se tornou exíguo logo na primeira edição, o Museu de História Natural e o Mercado da Ribeira porque toda a gente dizia que era impossível fazer a ModaLisboa ali, e fizeram-se edições memoráveis. O Museu da Cidade onde ficámos durante vários anos, o Museu da Eletricidade e a Cidadela de Cascais, entre vários

Houve algum espaço indesejável?
O Tivoli, Convento do Beato, e Parque das Nações, nomeadamente a Torre Vasco da Gama, não foram os mais apropriados. Temos de ter espaços que permitam acessos para o público e corredores interiores para a organização se movimentar com rapidez. Quando isso não é possível surgem imensas dificuldades no desempenho da nossa atividade organizativa.

O que mudou na moda em Portugal nos últimos 20 anos?
Tudo. Há 20 anos atrás não havia sequer essa designação, havia fenómenos como a Ana Salazar e a Manuela Gonçalves e um fenómeno muito jovem e emergente do qual nós fazíamos parte, mas não havia indústria de moda. Foi com o nascimento da ModaLisboa sobretudo nos três primeiros anos que passou a haver uma indústria de moda.

Essa é que é a mais-valia da ModaLisboa para Portugal?
É a primeira de todas. Com exceção da Ana, toda a gente trabalhava em cima a estação. Por exemplo, para o Verão começava-se em Março e às vezes em Julho ainda se estava a entregar as últimas peças. Com a ModaLisboa essa alteração tinha de existir, ou seja, pela primeira vez, esse conjunto de pessoas teve de começar a projetar e a planear a seis meses de distância. A partir daí passou a trabalhar-se de uma forma profissional

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Porque é que a nossa moda não se internacionaliza?
A nossa moda internacionaliza-se enquanto marca, mas há uma série de nós nessa teia que impede que as exportações se concretizem. Curiosamente, há criadores que apresentam as suas coleções na ModaLisboa, as suas empresas estão sediadas cá, mas não vendem cá, vai tudo para o mercado externo. De facto não temos grandes marcas em Portugal, mas isso tem a ver com o tecido industrial. 

Existe um estilo português na moda?
Existe uma moda portuguesa. Talvez a mistura de cores nos distinga. Trabalhamos muito bem a mistura de cores em styling.

Teme que a crise possa ameaçar o futuro da Moda Lisboa?
O que pode afetar a ModaLisboa é o medo que se vive dentro do país. Aliás, sempre que viajo, quando chego ao aeroporto, sinto energicamente essa carga porque está tudo contaminado de notícias negativas por todo o lado. A informação tem de ser dada mas essa realidade já devia ter sido comunicada desde 2008.

A imprensa internacional tem vindo a interessar-se cada vez mais pela ModaLisboa?
Tem. Desde o início da ModaLisboa sempre foi nosso objetivo que a imprensa internacional entendesse a moda portuguesa no contexto do próprio país. Na última edição tivemos mais de 100 meios internacionais no Terreiro do Paço, e, em termos televisivos, estivemos no mundo inteiro em direto.

A moda é uma indústria ou uma forma de arte?
É as duas coisas. Toda a arte se transaciona.

Já houve quem chamasse à ModaLisboa uma “teia de amor”. É uma emoção organizar este evento?
Umas vezes é uma teia de amor, outras vezes é uma teia complicada mas efetivamente é sempre emocionante.

Começou a dar aulas na Faculdade de Arquitetura dois anos depois do início da ModaLisboa. Tem sido uma experiência compensadora?
Dei aulas durante17 anos e fiz uma pausa este ano. Hei-de voltar porque gosto muito da área do ensino de design de moda.

As turmas ainda são maioritariamente femininas. O estigma do homem na moda ainda existe?
Existe. Hoje em dia a juventude fica em casa até muito tarde e as famílias aceitam melhor que uma rapariga estude moda do que um rapaz. Os pais preferem que o filho estude engenharia, medicina, direito ou gestão porque tem mais hipótese de ser um homem de sucesso do que se seguir moda. E como mantém os filhos em casa têm uma palavra a dizer.

Qual é a sua peça de vestuário preferida? 
Camisas e casacos.

É fiel ao seu estilo. É sua imagem de marca?
Sou. O meu estilo assenta num vestuário constituído por básicos de boa qualidade e muitos acessórios.

A sua filha Sofia também segue o gosto da mãe pela moda?
Tem um gosto muito próprio que tem a ver com o seu grupo social e com os seus 18 anos.

Qual foi o momento mais importante da sua vida?
O nascimento da minha filha.

Qual foi a compra mais extravagante que já fez?
Só faço dois tipos de compras: as necessárias ou as extravagantes. As necessárias são basicamente as dos bens essenciais. Todas as outras são por inerência extravagantes. 

As portuguesas vestem-se bem?
Vestir bem é muito subjetivo porque tem a ver com os grupos sociais nos quais a mulher se insere. Eu posso achar que estou bem vestida e outra pessoa achar o contrário. O que eu sinto é que as portuguesas começam a arriscar mais e a ter mais preocupações com a forma de vestir e isso são dados positivos.

 

Texto: Palmira Correia