O número de cidadãos sem médico de família ainda é elevado, sendo a reorganização das listas de utentes nos centros de saúde um projeto que vai contribuir para a melhorai desta realidade.
Este é um projeto futuro da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), o qual é abordado por Luís Cunha Ribeiro, presidente do Conselho Diretivo da ARSLVT.
Por Sofia Filipe
Hospital do Futuro (HdF): Entre os projetos especiais, a ARSLVT tem dois dedicados aos jovens – “Aparece” e “Olá Jovem”, que já terminou. Qual a razão da aposta nas faixas etárias mais jovens? Que balanço pode ser feito até à data?
Luís Cunha Ribeiro (LCR): O projeto “Olá Jovem” enquanto tal foi concluído em 2011. Foi um projeto criado e destinado ao atendimento exclusivo de adolescentes, composto por uma equipa multidisciplinar proveniente de várias unidades de saúde da área.«
Uma vez que no último ano a atividade neste projeto era já diminuta, tomou-se a decisão de redirecionar os recursos humanos para prestação direta de cuidados à população. No entanto, todo o atendimento que era prestado no “Olá Jovem” continua a ser prestado no Centro de Saúde da Amadora, embora sem a designação formal, mas beneficiando da integração e transmissão dos conhecimentos e da experiência que daquele resultaram. Já o “Aparece – Saúde Jovem” é um projeto que mantém a sua atividade. Estamos a falar de um Centro de Atendimento a utentes entre os 11 e os 24 anos de idade, criado em 1999.
O princípio que entusiasmou a criação de uma consulta voltada exclusivamente para os problemas da adolescência - naturalmente, com maior enfoque no sexo feminino - teve razão de ser, essencialmente, quando se considerou útil disponibilizar uma consulta totalmente abrangente da saúde dos jovens, em que estes pudessem confiar, sem a presença dos pais, fora da relação estreita preconizada e estabelecida pelo espírito do médico de família.
Quando todos os elementos da família estão inscritos na lista do médico de família, os jovens receiam alguma inconfidência sobre as questões mais sensíveis da sua vida/saúde poderem ser colocadas pelo médico de família aos seus pais, daí esta estruturação do projeto. Assim, o “Aparece - Saúde Jovem”, tem uma equipa com formação específica para a abordagem, tratamento e, quando necessário, encaminhamento para outros serviços de saúde mais especializados das situações clínicas que lhes chegam.
HdF: Quais os benefícios concretos do Perfil Social da Região?
LCR: O Perfil Social da Região inclui a caracterização da população, das famílias, a forma como vivem no que respeita à natalidade, mortalidade, causa dos óbitos, nível de instrução, características dos alojamentos da população, despesa das famílias em saúde, etc. São numerosos e diversificados indicadores que nos permitem compreender onde falta informação, onde é preciso comunicar, adequando assim as políticas de saúde à realidade concreta da região.
Este tipo de indicadores permitem não só colmatar lacunas ao nível do conhecimento, através da investigação, mas também permitem promover políticas e estratégias de saúde adequadas, atualizando-as sempre que necessário, melhorando a comunicação através da sensibilização, da formação e da educação dos profissionais e da população em geral. Somente através de dados como estes e do seu tratamento é possível elaborar planos de saúde com a missão máxima de reduzir a carga de doença na população da região.
Em suma, o Observatório Regional de Saúde tem como objetivo melhorar a eficácia das políticas de prevenção, de controlo e a redução de riscos para a saúde. Com esta estratégia consideramos que contribuímos para promover a integração do conhecimento e a inovação, criando melhores condições para o desenvolvimento económico e social do país.
HdF: Existe algum projeto para o futuro que nos queira dar a conhecer?
LCR: O acesso a cuidados de saúde de qualidade assenta na disponibilidade real de cuidados de saúde primários. Estamos a falar, muito concretamente, na disponibilidade do médico de família enquanto ponto de interação primordial e preferencial do cidadão com o Serviço Nacional de Saúde.
Na região de Lisboa e Vale do Tejo, à semelhança do resto do país, verifica-se que o número de cidadãos sem médico de família é ainda elevado. É igualmente expressiva a percentagem dos que, tendo médico atribuído, não são frequentadores regulares das unidades de saúde.
A reorganização das listas de utentes é de fundamental importância para o SNS. Em quatro Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES) de Lisboa e Vale do Tejo, conseguimos dar médico de família a mais 131 mil utentes, que até então não tinham este verdadeiro suporte na prevenção da doença e manutenção da saúde. Apenas no ACES Lisboa Oriental, o número de utentes sem médico de família caiu de 52.246 para 2.202, o que significa uma taxa de sucesso de 96%.
A experiência-piloto teve início em fevereiro de 2012, no ACES Lisboa Oriental, com objetivo de reorganizar as listas de utentes dos médicos de famílias, e foi posteriormente alargada aos ACES Amadora, Oeiras e Oeste Norte. A percentagem de utentes sem médico de família foi reduzida numa média de 73%. (Ver quadro 1)
Os utentes que ao longo de três anos não tenham qualquer contacto com o Centro de Saúde são considerados «não-frequentadores», dando assim lugar a um utente que procura o Centro de Saúde da sua área, ou seja, um utente «frequentador». Refira-se, pois tal é muito importante, que este projeto-piloto nenhum registo de utente é eliminado, trata-se apenas de uma reorganização para os serviços, sem qualquer prejuízo para o utente.
No entanto, e apesar do comportamento dos utentes «não-frequentadores» não apresentar variação significativa nos últimos anos, caso um utente «não-frequentador» pretenda ser atendido no Centro de Saúde da sua área, rapidamente adquire a situação de «frequentador» e será atendido em consulta.
A metodologia adotada visou otimizar a capacidade instalada dando prioridade à atribuição de médico de família aos utentes que apresentam um histórico de contactos com o Serviço Nacional de Saúde nos últimos três anos, colocando a oferta dos serviços prestados ao dispor daqueles que realmente necessitam e recorrem aos serviços.
Os utentes considerados «não-frequentadores» - recorde-se, sem contacto com o SNS nos últimos três anos - não perdem nenhum dos seus direitos, nomeadamente o vínculo ao seu médico de família. Em caso de necessidade, sempre que regressem ao centro de saúde veem o seu processo ativo de novo.
HdF: Poderia indicar números exatos dos utentes residentes e frequentadores?
LCR: Na ARSLVT o número de inscritos é de 4.117.097 utentes, o número de residentes é de 3.653.217 e o número de utentes «frequentadores» é de 3.299.576. A existência de um número de registos superior ao de residentes é explicável na sua maior parte pela presença de registos duplicados e de óbitos.
A diferença entre cidadãos residentes e «frequentadores» explica-se ainda no facto de existir um número significativo de utentes que por serem saudáveis não precisam de recorrer a cuidados de saúde. Temos ainda situações de pessoas que, por sua livre opção, utilizam sistemas privados ou subsistemas públicos.
HdF: Em termos práticos, o que é que este processo vai permitir?
LCR: A dimensão da resposta em termos de infraestrutura e de recursos humanos deve ser estabelecida pelos utentes que efetivamente utilizam os serviços num período alargado, no caso, de três anos. Toda a monitorização do processo, que tem sido feita de forma cuidada e permanente, demonstra que não têm sido gerados novos duplicados, que é uma condição indispensável para o sucesso do processo de reorganização das listas de utentes.
Ao permitir identificar a dimensão real da procura de cuidados, este processo permitirá um planeamento adequado da resposta, dimensionando todo o investimento em instalações e em recursos humanos às necessidades efetivas. A conclusão da aplicação do processo referido aos restantes ACES da região aponta para uma situação em que o número de utentes sem médico de família será reduzido de 1.131.000 para cerca de 300.000, correspondendo a uma diminuição verdadeiramente assinalável de 73,5%.
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