O glaucoma é uma doença ocular traiçoeira que, se não for diagnosticada e tratada precocemente, pode cegar.
A adoção de um estilo de vida saudável e a observação periódica pelo oftalmologista podem reduzir o risco de vir a desenvolvê-la. Saiba como.
Surge de uma forma silenciosa por não apresentar sintomas iniciais e é responsável pela ocorrência de um número elevado de casos de perda da visão periférica (visão lateral).
O glaucoma atinge principalmente pessoas idosas mas pode surgir numa idade mais jovem caso haja uma história de doença na família e não tenha havido prevenção. Conheça melhor esta doença ocular, os seus fatores de risco, a sua forma de prevenção e o seu tratamento.
O que é o glaucoma?
O glaucoma mais prevalente é o crónico simples de ângulo aberto, que se caracteriza pela «destruição das células nervosas da retina e de fibras do nervo ótico resultante de uma isquemia (falta de irrigação) provocada nessas células, que provoca a sua morte, comprometendo a condução dos impulsos nervosos para o sistema nervoso central, com efeitos muito graves na visão», define Jorge Breda, chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital de S. João, no Porto.
«As imagens chegam ao olho mas não são recebidas nem interpretadas pelo sistema nervoso central devido à perda de função das células cujos axónios formam o nervo ótico», acrescenta. O especialista explica ainda que, geralmente, a doença não é percebida pelos doentes, porque a sua progressão é lenta, gerando no início somente uma perda da visão periférica (lateral).
Doença silenciosa
O nervo ótico do ser humano é constituído por milhões de fibras nervosas que, com o glaucoma, se vão perdendo lentamente e de forma silenciosa, isto é, sem sintomas, que apenas se manifestam numa etapa em que já houve a perda de 60% dessas fibras nervosas.
«A pessoa só nota que está doente quando já perdeu muito campo visual e, nesse momento, vai ao médico e é-lhe diagnosticado o glaucoma», frisa Jorge Breda. A precocidade do diagnóstico afigura-se, portanto, de importância crucial para evitar a progressão desta doença ocular.
Segundo o especialista, é fundamental «diagnosticar antes de surgirem sintomas, pois quando estes emergem, normalmente, já houve danos substanciais no nervo ótico (que é como que um cabo coaxial que leva a informação da retina para o sistema nervoso central)».
Quais os fatores de risco?
A tensão ocular é o fator de risco mais conhecido do glaucoma e, por ser mensurável, assume uma importância significativa em termos de prevenção. Mas há outros fatores associados como, por exemplo, a hereditariedade. Segundo o oftalmologista, o sofrimento do nervo ótico e a morte das suas células resultam da dificuldade de circulação sanguínea (ou seja, da perfusão), que faz com que o sangue não chegue em condições aos tecidos nervosos.
«O sangue chega às células da retina cujos axónios compõem o nervo ótico com muita dificuldade por muitos motivos, sendo um dos principais a hipertensão ocular que vai originar danos nessas células», descreve.
Quando a tensão ocular está alta há uma pressão exercida sobre os capilares dificultando a circulação, «é como a senhora que está a regar o seu jardim. Se colocar um pé em cima da mangueira, a água não chega lá ou atinge o destino com maior dificuldade», compara.
Ressalva, no entanto, que a medição da tensão ocular por si só é insuficiente, porque há pessoas que têm uma tensão considerada normal para a média mas que para elas não o é, havendo na mesma sinais de isquemia das células nervosas.
O oftalmologista facilmente nota isso quando observa a cabeça do nervo ótico em exames de rotina. São então pedidos exames auxiliares, como a Tomografia Óptica Coerente, e é feito o diagnóstico de glaucoma de baixa tensão. «Há uma média de tensão ocular para a população, que é sensivelmente 19/20/21, o que não significa que não possa haver pessoas com um nervo ótico bastante bem conservado e com uma tensão ocular de 24», justifica.
Como prevenir?
Segundo Jorge Breda, a prevenção pode ser feita de duas formas:
- Vigilância médica
«As pessoas com doença na família devem ir periodicamente ao médico e essa regularidade varia.
Uma pessoa com mais de 40 anos deve ir, pelo menos, de dois em dois anos. Se tem glaucoma na família, aos 30 anos deve fazer um rastreio», explica.
Para o especialista, a consulta oftalmológica é essencial para medir a tensão ocular e avaliar a fisiologia do nervo ótico. «Se este tiver um aspeto suspeito, o médico manda fazer um exame para avaliar a saúde das suas fibras nervosas. Por vezes, a necessidade de medicação só tem sentido após o seguimento do paciente ao longo de anos e de se verificar que efetivamente tem a doença», revela.
- Vida saudável
A adoção de um estilo de vida saudável é fundamental para minimizar a emergência de doenças cardiovasculares, uma vez que «o glaucoma é, em última análise, uma doença cardiovascular», salienta Jorge Breda.
O especialista aconselha, por isso, todas as pessoas a deixarem de lado o tabaco e o álcool e a seguirem uma dieta saudável que exclua, principalmente, gorduras que prejudiquem a circulação sanguínea.
Em contrapartida, lembra que «os óleos polinsaturados e os ómega-3 são benéficos para o bem-estar cardiovascular, daí deverem ser integrados na dieta».
Como tratar
O tratamento do glaucoma baseia-se, principalmente, na redução da pressão ocular, para melhorar o funcionamento do nervo ótico.
«A pressão ocular baixa-se através da inibição do humor aquoso ou da promoção da excreção do humor aquoso para fora do globo ocular», afirma Jorge Breda.
Para que esta meta seja atingida com sucesso há que seguir com disciplina uma medicação à base de gotas e de comprimidos, realça o especialista.
Por vezes, esta medicação não é suficiente e surge a indicação para a realização de laser ou de cirurgia invasiva, criando vias artificiais para facilitar a drenagem do humor aquoso e, por conseguinte, baixar a tensão ocular.
Mas é preciso lembrar sempre que no glaucoma nunca se recupera o que se perdeu. Tenta-se somente impedir a progressão da doença, daí a importância do diagnóstico precoce.
A importância da hereditariedade
Jorge Breda afirma que o fator hereditariedade é decisivo, porque «um indivíduo que tenha uma mãe ou pai com glaucoma tem fortes probabilidades de vir a desenvolver a doença». Realça que este conhecimento é fulcral, pois embora atualmente não seja possível intervir para mudar os genes responsáveis pelo desenvolvimento da doença, pode constituir um ponto de partida para uma prevenção precoce.
Uma pessoa nestas condições «deve começar desde cedo a pedir a observação do nervo ótico, a medir a tensão ocular, a fazer campos visuais e análises ao seu nervo ótico. E se a sua tensão estiver elevada, pode baixá-la para evitar danos nas fibras nervosas do nervo ótico», frisa ainda.
Quais os grupos de risco?
Além das pessoas que têm pais ou mães com glaucoma, existem outros grupos de risco. Um deles é constituído pelas pessoas da terceira idade com problemas de aterosclerose.
O que dificulta a perfusão celular
«Os olhos estão enquadrados num organismo e, portanto, se as artérias tiverem gordura isso prejudicará a circulação em geral, e a irrigação do nervo ótico, em particular», refere o oftalmologista.
«E, quando as paredes das artérias estão mais duras, a perfusão celular é mais difícil», esclarece, ainda, Jorge Breda.
O especialista refere ainda que o glaucoma é mais prevalente nas pessoas de raça negra. Segundo estudos internacionais, esta etnia tem quatro vezes maior propensão para a doença.
Alimentos aliados da saúde ocular
Segundo a nutricionista Magda Roma, existem alimentos cujas propriedades nutritivas são funcionais e cruciais para a manutenção de uma boa saúde ocular. «As pessoas devem aumentar a ingestão de vitamina A, E e C e associar o zinco a estas vitaminas para prevenirem os problemas oculares. A luteína tem-se vindo a demonstrar também essencial para a saúde ocular», refere.
Onde encontrar estes nutrientes
Em alimentos como os cereais, vegetais de folha verde, oleaginosas, brócolos, pimento, tomate, leguminosas secas, sementes de abóbora, laticínios, citrinos, ameixas, damascos, meloa, alperce, gema de ovo e fígado.
Tipos menos prevalentes
Sabia que existem outros dois tipos de glaucoma menos prevalentes? ão eles o glaucoma de ângulo fechado e o glaucoma congénito.
Texto: Daniela Gonçalves
Revisão científica: Dr. Jorge Breda (chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital de São João no Porto)
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