No passado dia 3 de outubro de 2012, foi diagnosticado o primeiro caso de dengue na ilha portuguesa da Madeira. Até à data, não existem nem tratamento nem vacina contra este vírus, transmitido por algumas espécies de mosquitos Aedes. A doença causada pelo dengue pode manifestar dois quadros de desenvolvimento: um menos grave, semelhante a uma gripe forte, e outro mais grave, eventualmente mortal, designado de febre hemorrágica.

Este último ainda não é uma realidade na ilha, embora tenham havido até à data bastantes casos (cerca de 1357 casos notificados pela Direção Geral de Saúde à data de 14 de novembro) todos eles com bom encaminhamento clínico. No entanto, o aparecimento de casos mais graves e mortais na Madeira poderá ser uma questão de tempo.

Informação útil: sintomas, proteção e prevenção

Para quem vive na ilha (ou pretende deslocar-se ate lá), os cuidados de proteção devem ser redobrados, sobretudo entre julho e dezembro, altura em que a população do mosquito é maior e, portanto, o risco de picada/transmissão é mais elevado.

Os cuidados a ter devem incluir o uso de roupas claras e compridas, a aplicação de repelente (por fora da roupa), a utilização de redes nas janelas, e o uso do ar condicionado nos espaços interiores, uma vez que todos estes procedimentos evitam a picada, a única forma de transmissão da doença (o Dengue não é contagioso de pessoa para pessoa).

Qualquer residente ou viajante que seja picado e que sinta dores de cabeça, dores nas articulações, dores musculares, dores atrás dos olhos (retro orbitais), manchas na pele ou pequenas hemorragias nas gengivas ou no nariz, deverá procurar aconselhamento médico. Em caso algum deverá tomar medicamentos à base de ácido acetil-salicílico (como a Aspirina® ou Aspegic®), pois poderão complicar o quadro da doença em caso de infeção pelo dengue.

Para além disso, os residentes das áreas infestadas deverão informar-se e colaborar no controlo deste mosquito ao longo do ano. A intervenção comunitária é essencial para a redução do mosquito na ilha e só assim se poderão evitar próximos surtos ou, pelo menos, reduzir a sua dimensão. A colaboração da população passa por reduzir, cobrir ou eliminar recipientes que acumulem água no ambiente doméstico. Estudos para promover o envolvimento comunitário no controlo vetorial da Região da Madeira foram iniciados em setembro do ano

passado, no âmbito do projeto “Dengue no arquipélago da Madeira”, levado a cabo pelo Instituto de Higiene e Medicina Tropical, em colaboração com os Serviços de Saúde Regionais da Madeira e com a Universidade do Porto. As conclusões abordam o estado e os próximos passos da Educação para a Saúde na Madeira e serão divulgadas brevemente.

Panorama europeu

Antes deste surto surgir na Madeira, o dengue já tinha surgido noutros pontos da Europa, como França (em 2010).

Na Europa continental, o dengue tem sido transmitido através do mosquito Aedes albopictus, uma espécie semelhante ao Ae. Aegypti (presente na Madeira desde 2005).

O Ae. albopictus é o segundo vetor mais competente de dengue, febre amarela e chikungunya. Este mosquito está espalhado pelo sul da Europa, podendo chegar a também a Portugal a qualquer momento.

Este surto na Madeira marca o aparecimento de mais um foco de dengue na Europa. Parece estar a chegar o fim da era em que nós, europeus, nos achávamos imunes às “doenças tropicais”.

É sobretudo a globalização: aumento do fluxo de mercadorias e de pessoas por todo o mundo, que contribuem para a dispersão geográfica descontrolada de “doenças tropicais” (e dos seus respetivos vetores), a que estamos a assistir.

Perspetiva de passado e futuro

Seja através do Ae. Albopictus que chega pelo país vizinho já infestado (a Espanha), seja pelo Ae. Aegypti vindo da ilha da Madeira, o que é facto é que Portugal continental pode enfrentar, a qualquer momento, uma potencial invasão destes vetores.

Até 1956, Portugal alojou o Aedes aegypti, o que revela que o nosso país tem as características climatéricas necessárias para o mosquito se estabelecer, caso ele atinja novamente o território português (tal como afirma o European Centre for Disease Prevention and Control, no seu site oficial). Pensa-se que a sua erradicação terá sido consequência indireta do uso massificado de DDT (inseticida) durante a erradicação da Malária na Europa após a segunda guerra mundial.

Obviamente, hoje em dia este poderoso químico já não é utilizado no controlo vetorial, pois são conhecidos as suas propriedades tóxicas e cancerígenas.

Em geral, a utilização de inseticidas no controlo vetorial deverá constituir apenas uma opção de último recurso. Para além de caros e potencialmente perigosos para a saúde e ambiente, são muitas vezes ineficazes visto que os mosquitos rapidamente se tornam resistentes à sua ação.

A possível utilização de novos inseticidas na região da Madeira em caso de agravamento da situação está ser estudada pelo Instituto de Higiene e Medicina Tropical, os resultados serão divulgados em breve.

Perante isto, estamos em risco de ter Dengue em Portugal? Estamos. Mas não vale a pena alarmismos. Devemos mantermo-nos informados, pois só assim estaremos mais e melhor preparados para reagir à (mal) dita invasão.

Por Teresa Nazareth, Estudante de Doutoramento GABBA, Universidade do Porto | Instituto de Higiene e Medicina Tropical- UNL