Existem situações em que o sistema imunológico humano deixa de reconhecer determinados alimentos, muitas vezes devido ao seu consumo excessivo, gerando uma reação imunológica anormal e formando anticorpos sempre que eles são ingeridos, ainda que esse consumo não desencadeie nenhum processo alérgico propriamente dito. Não existindo qualquer reação alérgica nem qualquer sintoma que a ele se associe diretamente de uma forma imediata e consciente, a tendência é para que continue a ser ingerido.

Em consequência disso, surgem por vezes, inesperadamente e sem que se perceba porquê, sintomas de barriga inchada, de retenção de líquidos, de celulite edematosa e de flatulência, enxaquecas, ansiedade, problemas de pele e/ou dificuldade em emagrecer. Em casos mais complexos, as reações a esses alimentos podem estar na origem da libertação de anticorpos IgE (imunoglobina E), que conduzem a alergias alimentares ou chegam mesmo a estar na origem de doenças gastro-intestinais, como a disbiose intestinal, a doença celíaca ou a doença de Crohn.

Para detetar intolerâncias e saturações alimentares, foi recentemente introduzido um novo teste em Portugal. Denominado ProNutri, recorre à bioressonância e ao biofeedback para fazer essa avaliação. Em entrevista à Prevenir, Paula Henriques, especialista pós-graduada em Nutrição e diretora da clínica iCare, em Lisboa, onde essa análise pode ser feita, explica como funciona, o que deteta e como pode ser usado para prevenir e tratar problemas gastro-intestinais.

Como funciona este teste?

O teste funciona através de bioressonância. Existem 361 pontos no nosso corpo onde podemos fazer a medição de impulsos nervosos. Usamos dois pontos de acupuntura, os polegares, porque é o que nos dá mais jeito e não precisamos de despir o paciente. Isto, no fundo, é também a técnica a que chamamos de biofeedback. Vamos estimular essa zona com uma caneta eletrónica e essa estimulação vai enviar uma mensagem diretamente ao cérebro, ao hipotalamo.

O software está instruído com os nutrientes de 520 alimentos e, portanto, vai fazer a medição da capacidade de resposta que a pessoa tem em relação ao impulso que foi dado. Nos termos da digestão dos alimentos, há enzimas a funcionar. São as enzimas que fazem a digestão dos nossos nutrientes e o que acontece é que as células libertam energia durante este processo. É um bocado essa energia que medimos.

Que tipo de informações obtêm após essa medição?

Aparece
um gráfico que, no fundo, funciona como se fosse um semáforo. Apresenta
grupos de alimentos a vermelho, que são os alimentos a que nós
apresentamos uma elevada intolerância. Dá-nos também informação sobre
essa tolerância.

Se o valor ou o parâmetro estiver abaixo de -90,
consideramos que podemos estar perante uma intolerância grave e, nessas
situações, podemos sugerir que a pessoa retire esse alimento da sua
dieta por um período de dois ou três meses.

Depois, temos os
grupos que estão assinalados a cinzento, que no fundo correspondem ao
amarelo do semáforo. São alimentos que podemos consumir duas a três
vezes por semana, não mais do que isso, porque são alimentos que, se nós
abusarmos, poderão vir a estar futuramente nos grupos vermelhos. E
temos, finalmente, os verdes, que são os alimentos que nós toleramos.
Muitas vezes, não são alimentos que são saudáveis, é preciso sublinhar
isso.

Pode ser o álcool, podem ser alimentos do grupo dos açúcares. Isso
significa que uma pessoa ao consumi-los, e não estou a dizer para o
fazerem, não vai ter reações adversas do organismo. Se der, no
teste, que uma pessoa é tolerante ao chocolate e intolerante à alface,
não lhe digo para comer chocolate e não comer alface. Explico-lhe que,
se consome muita alface, por exemplo, há uma saturação no seu quadro
enzimático em relação a esse alimento. Deve, por isso, dar-lhe um
descanso durante algum tempo.

É então porque isso que os
resultados de alguns destes testes são favoráveis ao consumo de ovos,
por exemplo, apesar destes serem um alimento que não é recomendado a
quem tem problemas de colesterol?

O ovo é um alimento bom,
mas sabemos que tem muita gordura, sobretudo na gema. Aquela história de
molhar o pãozinho na gema [do ovo estrelado] não é recomendável. Mas,
nalguns casos, as pessoas podem fazê-lo. Do ponto de vista das
perturbações gastro-intestinais e de outras, como enxaquecas, algumas
perturbações ao nível respiratório e alguns problemas do foro
dermatológico, se nada disso existir significa que os ovos não estão a
provocar intolerância. No entanto, podem provocar um mal como o
colesterol.

Como é que procura explicar essa aparente contradição às pessoas?

Digo-lhes
que, se pretendem fazer uma alimentação racional equilibrada e
saudável, não devem consumir em excesso os alimentos que surgem grupo
vermelho. Do ponto de vista das intolerâncias e das perturbações
gastro-intestinais, não devem ingerir esses alimentos. Nós temos alguns
grupos [alimentares] de risco e alguns dos alimentos que os integram até
são considerados saudáveis.

É o caso dos laticínios, sobretudo o
leite e a lactose, que é o açúcar do leite. São as carnes vermelhas, os
frutos secos e os cereais, nomeadamente o trigo. Esses são grupos
[alimentares] de risco. Se formos a ver, os cereais são, supostamente,
alimentos saudáveis, não é? A carne vermelha, se não for uma carne
gorda, é saudável. Comer carne de vitela é uma coisa saudável. Isto não é
tão estanque assim. As pessoas efetivamente podem ser intolerantes a
alimentos que são prescritos numa dieta hipocalórica.

Existe
uma escala. A partir de que número é que um alimento é considerado
alarmante em termos de intolerâncias e de saturações alimentares?

A
partir de -90, começa a ser considerado alarmante e esse grau aumenta à
medida que vamos registando valores como -100, -120,
-220 ou até -480,
como uma senhora que já aqui tive a fazer o teste e que era intolerante
ao tomate, porque comia muito.

O tomate é um fruto e ela comia-o à
dentada, como se come uma maçã. Havia uma evidente saturação do
alimento.

E esse tipo de saturações manifesta-se de alguma maneira no organismo?

Nas
mulheres, manifesta-se muito através da celulite edematosa, que é a
célebre retenção de líquidos, que é um processo inflamatório.
Normalmente, o que está por detrás disso é o grupo dos cereais. As
pessoas que apresentam umas pernas tipo esponja têm um pico brutal no
[consumo de] pão e nas farinhas. E também se manifesta através
do inchaço da barriga. A pessoa chega ao fim do dia e tem a barriga que
parece um balão. Sofre de flatulência e de gases. Estas situações podem
acontecer muito com quem consome muito pão, café com leite e/ou massa
lêveda ou com as pessoas que abusam dos legumes de folha verde escura.

Este teste já incide sobre 520 alimentos. E se a pessoa for intolerante a um alimento que não esteja nessa lista?

Não
conseguimos saber. Este teste ainda não é perfeito. É um teste alemão,
que continua a ser testado num laboratório na Alemanha e nós já enviámos
para lá uma lista de alimentos que detetámos que são inexistentes nesta
lista e que são importantes, nomeadamente o bacalhau. O teste já
contempla o bacalhau fresco mas ainda não faz essa avaliação em relação
ao bacalhau seco, que é o que nós, portugueses, comemos mais.

Tem feito muitos testes. Nota já algumas tendências que possa apontar?

Sim,
as pessoas que nos procuram vêm porque registam alguns dos sintomas que
descrevi anteriormente e querem saber se os alimentos que ingerem estão
associados a eles ou não. Há uma coisa que é muito típica. Normalmente,
são as mulheres, porque não conseguem emagrecer ou têm efetivamente um
problema, que pesquisam sobre este assunto e depois arrastam os maridos
com elas. Têm aparecido muitos casais.

Depois, há pessoas que
vêm porque têm curiosidade. Têm uma amiga ou conhecem alguém que já fez o
teste e também porque querem fazer uma alimentação mais saudável. Eu
explico-lhes a importância de fazer uma alimentação variada porque as
intolerâncias estão na base de passarmos a vida a comer sempre o mesmo.

Normalmente,
as pessoas vêm ainda com aquela mentalidade que nós temos que é, como
os sintomas já lá estão, vamos ver como é que os vamos resolver. Não vêm
tanto com a perspetiva de agir para evitar que eles se instalem. Só
algumas pessoas mais jovens é que já vêm com essa perspetiva e com o
objetivo de fazer uma alimentação mais cuidada. Mas são poucas ainda.

Este
teste acaba por ser também um pouco o ponto de partida para a deteção
de problemas mais graves e até para a prescrição de alguns tratamentos
para determinadas doenças?

Estes testes permitem, por
exemplo, despistar aquilo a que chamamos uma disbiose intestinal. A
pessoa manifesta intolerâncias alimentares muito negativas, muitos picos
vermelhos com variações altas.

Isso pode significar que a pessoa tem
uma disbiose intestinal e que, no fundo, o seu intestino está permeável.

Nessas situações, há uma reação intolerante da membrana
intestinal a tudo o que é consumido. Os resultados deste teste são muito
semelhantes aos resultados de um exame ao sangue. Temos um processo
inflamatório que está em bola de neve e que pode conduzir a uma doença
celíaca ou, em situações mais graves, a uma eventual doença de Crohn.

Estes
testes de análise de intolerâncias alimentares são muito bons para
despistar futuras patologias a nível do intestino. Nós, de uma maneira
em geral, não tratamos muito do nosso intestino e não temos essa noção. O
intestino é um órgão fundamental, que está na base do nosso sistema
imunológico e não o tratamos do modo como deveríamos.

Se
tivesse que dar dois ou três conselhos às pessoas que sofrem deste tipo
de intolerâncias e saturações que conselhos lhes daria?

Fazer
uma alimentação variada é sempre importante, dentro daquilo que nós
consideramos saudável. Existem grupos com alimentos que não são
considerados saudáveis. Devemos comer bastantes frutas e bastantes
legumes e beber bastante água. O problema é que as sopas são geralmente
sempre feitas à base dos mesmos legumes. Os portugueses têm muito pouca
imaginação a esse nível.

Geralmente, digo às pessoas para não
comerem tantos espinafres ou tanta sopa de agrião. Sugiro-lhes que mudem
a base das suas sopas. Além disso, devem moderar o consumo de leite.
Eu, normalmente, até costumo dizer que o leite é mais aconselhado nas
fases em que o ser humano não tem dentes, basicamente quando somos bebés
ou na terceira idade. Aí o leite faz efetivamente falta.

Existem,
de resto, outros alimentos, como os bróculos, que são muito ricos em
cálcio e que são um excelente substituto do leite de vaca. Eu, quando
vejo que os laticínios estão a ficar ligeiramente negativos ou até mesmo
neutros, retiro logo o leite. Depois, alerto também muito as pessoas
para o excesso de consumo de pão. O pão de trigo é muito lêvedo, é
muito feito à base de farinha branca e o pão de mistura não tem grande
qualidade, de uma forma em geral. Quando vejo que as pessoas estão muito
inchadas e vejo ali um pico de negativo nas farinhas, normalmente
retiro-lhes também o trigo.

Falou dos bróculos. As leguminosas também são um bom alimento de substituição?

Sim, são um excelente alimento de substituição dos hidratos de carbono.

Como é que as pessoas as devem consumir para potenciar os seus efeitos?

Devem
ingeri-las juntamente com a carne ou com o peixe e devem ter cuidado com as combinações alimentares que fazem.

Quando têm
leguminosas no prato, não devem adicionar-lhes arroz nem massa nem
batata porque as leguminosas já os estão a substituir, para além de
também serem bastante ricas em proteínas. No fundo, também fazem um
pouco o papel do peixe e da carne, com a vantagem de não terem o mesmo
índice de gordura que sobretudo a carne vermelha tem.

Quanto é que custa fazer um teste deste tipo?

É
muito acessível. Nós fazemos aqui na clínica consultas de nutrição e de
diagnóstico para tratarmos de casos de celulite e de gorduras
localizadas. Comecei a perceber que, pelo facto do teste ao sangue que
fazemos custar 350 €, as pessoas não o faziam e esta é uma ferramenta
importante para nós. Este teste custa 120 €, com consulta de nutrição
incluída, o que representa uma poupança imensa em relação ao teste ao
sangue venoso.