Em declarações à agência Lusa, Renata Benavente admitiu que os números revelados através do relatório final da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja, que recebeu 512 testemunhos válidos e que admitiu que o número de vítimas ascenda a 4.815, não são surpreendentes, uma vez que demonstram que “o abuso sexual existe em diferentes contextos e em diferentes cenários”.
Sobre o apoio e tratamento psicológicos adequados às vítimas, a vice-presidente da Ordem dos Psicólogos defendeu que “faz sempre efeito”, mesmo que iniciado em idade adulta, uma vez que a necessidade desse acompanhamento é comprovada “a partir do momento em que a pessoa sente que esta questão (…) é uma questão que é um problema no momento atual, que gera sofrimento, gera dor”.
“Isso é o suficiente para se justificar uma intervenção que tem resultados e efeitos positivos no bem-estar e na promoção da saúde das pessoas que viveram estas experiências dramáticas”, defendeu.
Explicou que o abuso, apesar de vivido na infância, pode cruzar-se com outros aspetos da vida adulta, nomeadamente no momento de criar relações afetivas ou na exploração da sexualidade, que podem “desencadear essa experiência negativa” e trazer ao momento atual “aquela mágoa que ficou encapsulada e retida”.
“Isso pode acontecer uns anos depois, 10, 20 anos ou 30 ou 40 anos. Falar-se do assunto é importante porque muitas vítimas poderão até reconhecer-se como tal, eventualmente muitas nem tinham bem perceção do que se passou, ou aquela memória ficou difusa”, sublinhou.
De acordo com Renata Benavente, a própria pessoa tem mecanismos para se proteger ao lidar com essas memórias traumáticas que podem levar a que “aquela memória fique ali contida”.
“Falar-se disso pode desencadear essas experiências negativas e ser um bom momento para a recuperação e para que a pessoa ultrapasse aquela experiência muito traumática”, sublinhou.
No entanto, admitiu que faltam os meios humanos necessários para que todas as vítimas tenham o acompanhamento psicológico necessário, bem como os abusadores.
“Os recursos são insuficientes”, denunciou Renata Benavente, acrescentando que as vítimas necessitam de um apoio psicoterapêutico continuados e especializado em trauma e explicando que este impacto traumático não é, muitas vezes, visível no imediato, surgindo a médio e longo prazo.
“No nosso contexto, estes recursos são insuficientes, temos uma carência grande de psicólogos no Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente nos centros de saúde e também ao nível dos cuidados hospitalares”, apontou a responsável, afirmando que esse apoio às vítimas não está a ser assegurado por causa da falta de recursos.
De acordo com a vice-presidente da Ordem dos Psicólogos, o mesmo se passa ao nível do Ministério da Justiça, responsável pelo tratamento e acompanhamento dos agressores sexuais, que não tem os recursos necessários, pela “carência de psicólogos”.
“Há muito a fazer nesta área, sobretudo nesta questão dos recursos humanos, para apoiar quer as vítimas, quer intervir com os agressores”, concluiu.
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