Qual o impacto que o vício em gaming tem, atualmente, na população portuguesa?

Os videojogos são uma atividade utilizada de forma generalizada pela população portuguesa, estimando-se que cerca de 1/5 da população jogue videojogos de forma regular, subindo para cerca de 2/3 se focarmos a análise na adolescência e início da vida adulta. Pensa-se que cerca de 5% da população jogue 4 ou mais horas/dia e é importante salientar que a grande maioria das pessoas utiliza esta atividade que está estigmatizada de forma normal e sem problemas em termos de saúde mental.

Quais os primeiros sinais de alerta de que a dependência pelo videojogo está presente na vida da pessoa?

Os sintomas de dependência raramente estão presentes e pode haver indícios de perturbação psíquica preocupante – se definida como uma perturbação que promove sofrimento ou tem impacto no funcionamento profissional, académico ou social – sem os critérios de dependência estarem presentes. Na perturbação de uso de videojogos na internet a atividade torna-se central na vida da pessoa, começando progressivamente a negligenciar aspetos importantes da sua vida e a abandonar atividades que antes gostava de fazer. Numa primeira fase, as pessoas não valorizam o processo por estarem entusiasmadas e a atividade pode funcionar como um alívio para stress ou como uma fuga para problemas que não conseguem resolver. Considera-se que aspetos, tais como fazer a regulação do humor através da atividade ou ficar com grande alteração do humor quando privado de jogar de forma inesperada (computador estragado ou família mudar planos), são sinais de alarme. 

Do ponto de vista físico e cognitivo, esta dependência deixa sequelas?

Do ponto de vista físico, há estudos a relacionar o número de horas online com o aumento do índice de massa corporal e sedentarismo. Há doenças ortopédicas descritas que, apesar de mais raras, não são específicas do gaming, mas em que há maior risco como o síndrome do canal cárpico, problemas na coluna associadas a má postura, lesões musculares e nos tendões. A grande estimulação que o uso de videojogos gera nas pessoas com suscetibilidade está associada ainda a redução das horas de sono e de descanso com efeitos negativos na saúde física e mental. Apesar de por vezes surgir em idades críticas do ponto de vista académico e de início da carreira profissional, não se pode dizer que tenha sequelas do ponto de vista cognitivo, podendo até treinar certas competências como a resolução de problemas, visão espacial e reflexos variando naturalmente com o tipo de jogo. 

Esta adição tem sintomas físicos?

Habitualmente não. 

Provoca abstinência? Quais os sinais e sintomas?

Provoca sintomas de abstinência quando lhe é retirado o acesso a videojogos online, tipicamente irritabilidade, ansiedade e tristeza. No entanto, não há sintomas de abstinência física. Os outros sintomas são:

- Preocupação constante com videojogos online (o indivíduo recorda o que esteve a jogar antes ou antecipa o ato de jogar; videojogos tornam-se a atividade dominante na vida diária);

- Tolerância: necessidade de aumentar o tempo passado a jogar na Internet;

- Incapacidade de controlar a participação nos videojogos online;

- Perda de interesse em hobbies anteriores e entretenimento, à exceção dos videojogos online;

- Continuação do uso excessivo de Internet, apesar se ter consciência dos problemas psicossociais;

- Enganar membros da família, terapeutas ou outras pessoas a respeito da quantidade de tempo passada a jogar;

- Utilização de videojogos online para escapar ou aliviar um humor negativo (sentimentos de desespero, culpa ou ansiedade);

-Negligência ou perda de relações significativas, trabalho, estudos ou oportunidades de carreira como consequência da participação em jogos online. 

Identificada essa dependência, que medidas devem ser tomadas para minimizar o impacto de dependência física e emocional?

Os casos graves devem ser avaliados em Psicologia ou Psiquiatria. As abordagens variam com a idade e maturidade da pessoa, e ainda com a cultura familiar, registando-se um corte radical do acesso, a redução progressiva da atividade até deixar de ter impacto negativo na vida da pessoa. As medidas gerais passam por atividades ocupacionais, tais como como estudar ou trabalhar temporalmente antes de utilizar os videojogos, promover a crítica para o impacto negativo que os videojogos possam ter na vida da pessoa, ou estimular atividades alternativas. 

Que faixas etárias são mais afetadas em Portugal pela dependência do videojogo?

As faixas etárias mais afetadas são adolescência e início da vida adulta. A prevalência é claramente maior nas pessoas do género masculino, variando entre 5 a 9 vezes mais.  

O que é que a família/amigos deve fazer?

Habitualmente as pessoas próximas sabem do problema vários meses antes de se começar a fazer alguma coisa. A atividade ter um cariz social, ou seja, ser feita em grupo, poderá ser um sinal de alarme, mas a intervenção é difícil, porque por norma a pessoa não reconhece o problema. Quebras de produtividade laboral ou académica também são muito frequentes. Estimular a reflexão e atividades alternativas poderá ser uma forma de ajudar, principalmente se for feito por indivíduos com quem a pessoa se identifique.