Todos conhecemos a piada pueril sobre quem nasceu primeiro: se o ovo ou a galinha. Se todas as galinhas nascem de ovos, mas estes apenas são produzidos pela galinha, torna-se um desafio intelectual argumentar sobre qual dará origem ao outro.
Ora, este dilema também surge muitas vezes ao pensarmos sobre a obesidade.
Sendo certo que a obesidade é definida com base num excesso de peso, relativo ao considerado normal para a altura do indivíduo, não podemos dizer que a doença metabólica chamada obesidade resulte do aumento de peso. Por outro lado, as disfunções metabólicas e hormonais, associadas à obesidade e ao síndrome metabólico, favorecem o aumento de peso e a progressão da doença.
Sabemos que durante o desenvolvimento da obesidade, os indivíduos ficam progressivamente com mais apetite (causado por um aumento da produção e uma diminuição da supressão da grelina, a hormona da fome), têm maior dificuldade em atingir a saciedade e em produzir insulina (por perda da ação das hormonas “incretinas”, produzidas no intestino delgado e responsáveis pela sensação de saciedade e pela regulação do funcionamento do eixo intestino-pâncreas) e perdem ainda a resposta à leptina (que sinaliza a existência de tecido adiposo em suficiente abundância).
Se estes mecanismos se vão agravando à medida que a pessoa aumenta de peso, também são eles próprios causadores do desarranjo metabólico que culmina no aumento de peso e de tecido adiposo. Esta complexidade de regulação comprova que a obesidade é uma doença multifatorial, que ainda não compreendemos plenamente, e que é difícil uma resposta assertiva ao nosso desafio inicial.
O pensamento aritmético, usado durante décadas, de que comemos demais, logo aumentamos de peso e desenvolvemos obesidade é, hoje em dia, afastado pela evidência científica. A obesidade comporta-se mais como um sistema quântico em que várias ações ocorrem em simultâneo, com profundas ligações entre si e com consequências, por vezes, inesperadas. Fica então no ar a dúvida sobre quem aparece primeiro: o peso ou a obesidade? Mas os dados da investigação científica parecem apontar que a doença em si precede a sua expressão, ou seja, as pessoas ficam com excesso de peso porque têm obesidade, e não o contrário.
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