A atividade sindical tem a necessidade insubstituível de dispor de plena democraticidade de funcionamento, de transparência total em todos os seus processos de decisão e de um total envolvimento dos associados representados.
Quando estes princípios e valores são espezinhados, a atividade sindical fica muito debilitada nas suas capacidades reivindicativa e de mobilização dos trabalhadores de um dado setor laboral, e surgem inevitavelmente fraturas entre os seus membros que conduzem à procura de novos instrumentos de intervenção.
Um dos alvos nucleares da ideologia neoliberal tem sido desarticular e destruir as organizações sindicais, consideradas como entidades subversivas devido às suas práticas de democracia direta e como maus exemplos nas sociedades.
Os processos de formação dos três sindicatos regionais que, mais tarde, em 1989, constituíram a FNAM, foram claros exemplos de uma ampla pluralidade de opiniões e de posicionamentos políticos que convergiram para tornar o espaço sindical num instrumento para a defesa mais dinâmica dos seus interesses socioprofissionais.
A experiência acumulada ao longo de décadas mostrou sempre, de forma muito evidente, que os processos de luta reivindicativa dos médicos que tiveram êxito obedeceram a traços distintivos assentes em amplas convergências de interesses, de criação de plataformas de ampla unidade na ação, de harmonização das diferentes reivindicações das várias carreiras médicas e dos setores etários dos médicos, bem como na capacidade de tomada de iniciativa em trazer a público os problemas que afetavam esta classe profissional.
Esta iniciativa foi sempre crucial para não andar a reboque das decisões do Poder político e para promover medidas de antecipação que melhor possibilitassem a defesa adequada dos nossos interesses profissionais.
Nos últimos 20 anos, os médicos e o SNS têm estado sob fogo intenso de enormes apetites destruidores de poderosos interesses privados e mercantilistas.
Ora, num contexto tão desfavorável como este, as respostas das organizações médicas em geral exigiam, de forma inadiável, alargamento das formas democráticas de funcionamento, de mais participação, de mais informação e de maior empenho na mobilização dos médicos para formas de luta com maior impacto.
No entanto, aquilo a que assistimos foram práticas suicidárias de isolamento e de divisionismo, sem capacidade para produzir documentos negociais estratégicos, afunilando tudo em greves sucessivas sem estarem inseridas em qualquer abordagem reivindicativa global, não se traduzindo em quaisquer resultados negociais para a resolução dos agudos problemas profissionais com que os médicos estão confrontados.
As greves foram levadas por diante como um fim em sim mesmo, as agendas da sua concretização andaram a reboque de agendas partidárias, a intervenção reivindicativa resumiu-se à fraseologia radical sem quaisquer propostas concretas devidamente fundamentadas.
A mais importante reivindicação da parte desta direção da FNAM passou a ser o pedido de demissão dos últimos três ministros.
A nível do Sindicato dos Médicos da Zona Sul (SMZS), um dos sindicatos regionais que integram a FNAM, o golpismo político passou a ser a prática permanente de um grupo de dirigentes que se comportam como membros de uma seita religiosa, dominados por um sectarismo patológico e por um funcionamento imbuído de secretismos e de conceções conspirativas.
No dia 12/4/2024 realizaram uma assembleia geral com o objetivo de introduzirem alterações aos estatutos em que algumas das matérias visadas exigiam um número mínimo de participantes para que as deliberações tomadas fossem válidas.
Em vez de cerca de 400 presenças exigidas como quórum mínimo estavam 30 e tal associados. Apesar de alguns dos presentes terem logo alertado para essa situação, a maioria dos presentes decidiu levar por diante decisões antiestatutárias.
O resultado inevitável foi um parecer desfavorável da entidade pública que acompanha estas matérias ( DGERT do Ministério do Trabalho) que apresentou queixa ao Ministério Público e que, por sua vez, enviou o processo para tribunal.
Apesar desta vergonha que atinge a credibilidade e a imagem de toda a nossa classe profissional, o golpismo continua impune nos seus propósitos de transformar o SM ZS numa agência partidária que utiliza os problemas dos médicos para a mera agitação política.
No dia 31/3/2025, realizou-se nova assembleia geral para aprovar, de acordo com a legislação, o relatório e contas do ano anterior.
Durante a discussão, e perante opiniões diferente, o presidente da direção afirmou várias vezes que quem manda ali é ele porque é o presidente.
Este singular conceito do papel de um presidente no exercício de funções sindicais, tipo norte coreano ou do Trump, mostra bem quais são os valores políticos dos atuais dirigentes do SMZS. O “chefe” assume-se com o ditadorzinho de serviço e os restantes membros que aceitam ser “paus mandados” só revelam que não têm estatura política e cívica para estarem a representar médicos.
Mas o golpismo voltou a mostrar os seus propósitos ao convocar nova assembleia geral a realizar, pasme-se, no intervalo de um debate promovido pela FNAM.
A 23/4/2025, enviou um mail aos associados a informar que vai realizar um Fórum no dia 24/5/2025 para “debater a nossa profissão “ e que “entre as 2 sessões de debate vamos também realizar uma assembleia geral extraordinária …de forma ratificar as alterações estatutárias …”.
No dia 30/4/2025, enviaram novo mail a informar que pagam as deslocações, a estadia, o almoço e o serviço de babysitting durante o fórum.
Ou seja, pretendem “ratificar” as alterações ilegais aos estatutos que estão em processo judicial e até recorrem a processos de triste memória tão utilizados no Estado Novo para arregimentar participantes em iniciativas políticas.
A FNAM possui um estatuto legal de estrutura de coordenação nacional de três sindicatos regionais e não pode imiscuir-se nos assuntos internos de qualquer desses sindicatos.
Os associados da FNAM são os três sindicatos regionais e, como tal, não possui associados individuais. Estes só existem nos sindicatos regionais.
Ora, aproveitar um debate da FNAM para, no seu intervalo, realizar uma assembleia geral, constitui um escandaloso exemplo das práticas golpistas que esse grupo dirigente tem vindo a desenvolver num total desrespeito pela dignidade dos órgãos legais de deliberação estatutária ao dispor dos associados e na assunção de que para esse grupo qualquer espaço democrático está banido a nível do SMZS.
Será que a grande maioria dos associados do SMZS aceitam que as decisões sindicais passem a ser da exclusiva competência de um só indivíduo que inaugura uma era trumpista na vida de um sindicato com uma cultura tão rica de, até há três anos atrás, práticas de unidade, de democracia rigorosa e de desenvolvimento de um pensamento estratégico na elaboração das suas propostas reivindicativas e negociais?
Os grupos extremistas, sempre odiaram a livre expressão de opiniões porque como dizia o outro quem manda ali é ele.
Só que, a livre opinião é decisiva para caracterizar uma realidade concreta bem como denunciar as práticas atentatórias das mais elementares regras democráticas.
Sempre me assumi como um cidadão praticante da livre opinião e com preocupações de bons costumes éticos, nunca temendo afrontar os “vendilhões do templo”.
Num momento tão difícil como aquele que os médicos atravessam, tão carregado de ameaças para o seu futuro profissional, a situação que esses dirigentes do SMZS estão a criar constitui um enorme frete político aos círculos governamentais e aos interesses mercantilistas que sempre se aproveitam de uns ”radicais úteis”.
Aquilo que está em curso é um característico processo de destruição do SMZS enquanto organização sindical democrática e autónoma, cuja intervenção esclarecida na defesa dos interesses dos médicos não pode ser dispensada.
As organizações sindicais não podem ser um refúgio de ditadores de “pacotilha”.
Por mais campanhas organizadas que desencadeiem contra mim em algumas redes sociais como aconteceu, de forma miserável durante meses a fio, devido às minhas denúncias deste complot contra a independência do SMZS, eu não deixarei de emitir as minhas opiniões livres, ditadas pela minha consciência cívica de cidadão sem tutelas.