“O fenómeno italiano tem a ver com a perda de capacidade de contenção do vírus numa parte determinada de Itália (…). Essa contenção revelou-se difícil e a atividade de contenção dependente dos estímulos importados”, afirmou à Lusa o antigo diretor-geral da Saúde e professor jubilado da Escola Nacional de Saúde.

Constantno Sakellarides respondia quando questionado sobre o caso concreto de Itália e sobre as eventuais razões que terão desencadeado a significativa progressão nos últimos dias de casos de Covid-19 (nome atribuído pela Organização Mundial Saúde à doença provocada pelo novo coronavírus) no território italiano.

Itália anunciou os dois primeiros casos importados de Covid-19 no final de janeiro, mas seria já em pleno mês de fevereiro que seria confirmado o primeiro caso de contaminação interna numa cidade a cerca de 60 quilómetros de Milão (no norte de Itália), uma “área central da economia italiana”, “um dos polos económicos fundamentais da Europa” e “uma zona populosa”, segundo caracteriza o ex-diretor-geral da Saúde.

O facto de o vírus ter entrado “com força na região” e “pela parte do país que tem mais contactos com o exterior” é um dado a ter em conta para Constantino Sakellarides, que acrescenta: “Expandiu-se como é próprio de uma epidemia".

“O fenómeno italiano é caracterizado por uma transmissão numa parte do país muito desenvolvida, como muitas interações, onde as pessoas se movem, como se movem numa cidade moderna. E daí a grande expansão da curva epidémica”, prosseguiu.

“Mas, não encontro nada, por enquanto e pela informação que temos, que nos diga que em Itália descobrimos um fenómeno que é diferente do que acontece em outras partes do mundo”, nomeadamente China, Coreia do Sul e Irão, realçou o especialista em saúde pública.

Constantino Sakellarides falou à Lusa na segunda-feira, dia em que Itália ultrapassou a fasquia dos 9.000 casos de contágio (dos quais 724 pessoas tinham recuperado) desde o início da crise e contabilizava 463 mortes associadas ao novo coronavírus.

Estes números tornaram Itália o caso mais grave da epidemia fora da China, onde a nova estirpe foi detetada pela primeira vez em dezembro.

Sobre a taxa de mortalidade associada ao vírus e registada até à data em Itália, nomeadamente entre as pessoas mais idosas, o especialista de saúde pública, e apesar de admitir tratar-se de um dos países mais envelhecidos da Europa e da idade avançada ser um fator de risco, prefere focar-se no método de cálculo dos óbitos, ou seja, se o cálculo está a ser feito em função da população do país ou se o cálculo é em função do número de doentes.

As autoridades italianas explicaram, até ao momento, que a maioria das mortes ocorre em pessoas idosas, sobretudo octogenários e nonagenários, assim como em pessoas já afetadas por patologias graves.

Itália é o país da Europa com a população mais envelhecida e apenas o segundo do mundo a seguir ao Japão: 22,6% da população tem mais de 65 anos e a esperança de vida é de 85 anos para as mulheres e 81 para os homens.

Momentos depois das declarações de Constantino Sakellarides à Lusa, o primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, anunciava que as medidas de quarentena, já impostas no norte, iam ser expandidas a todo o país num esforço para conter a propagação do novo coronavírus.

Estas medidas sem precedentes abrangem uma população de 60 milhões de pessoas.

Ainda à Lusa, Constantino Sakellarides realçou a importância de ser “cuidadoso” nas análises e “não especular” com a informação disponível.

O especialista frisou ainda a importância de “não perder a confiança nas instituições”.

“Se perdermos o equilíbrio desta perceção sobre o que se passa no país, o nosso comportamento não favorece a contenção do fenómeno”, concluiu.