Uma adega que nasceu de uma sociedade, e que era virtual, mas que afinal também é um centro de exposições e um dos 11 melhores Best Of Wine Tourism 2023. Confuso? Manuel Oliveira, distribuidor de vinhos pensou o mesmo. “De repente para nós é um desafio. Não estamos só a falar de vinho, estamos a falar de arte”, partilha num momento de prova de vinhos, na sede da Quanta Terra, em Favaios, no concelho de Alijó.

Celso Pereira e Jorge Alves já andam nestas andanças há tempo suficiente para serem nomes reputados nesta coisa de fazer vinhos. Afinal, estamos a falar do enólogo do Vértice, aquele que é considerado um dos melhores espumantes portugueses e de Jorge Alves que recentemente apresentou mais uma colheita de Mirabilis, o branco e o tinto 2021, da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo.

Mas esta cumplicidade começou muito lá atrás, quando ambos trabalharam no Departamento de Enologia das Caves Transmontanas, nos idos anos 1990. Jorge saiu para outros projetos, Celso continuou. Mas a separação não foi por muito tempo e juntaram-se para criar vinhos que não se pensavam há mais de 20 anos e para revolucionar de certa forma o papel da enologia na arte de os fazer.

“Apesar de termos criado este projeto em 1999 fomos dos primeiros a explorar esta vertente mais fresca e mineral das uvas brancas, olhando também para as uvas tintas. Afinal o primeiro vinho que fizemos em 1999 foi um tinto”, explica Celso Pereira à chegada à Quanta Terra.

“A sociedade chama-se Quanta Terra, mas era para se chamar Quanta Terra Vinhos Tintos o que depois seria um problema porque depois não íamos poder produzir nem brancos, nem espumantes, nem rosés”, diz a rir Jorge Alves, fazendo referência aos primeiros passos de uma empresa que comemora 25 anos no próximo ano.

“Entre 1998 e 2000 apareceram oito empresas deste género, que chamávamos de adegas virtuais: nem tínhamos vinha, nem tínhamos adega. Comprávamos as uvas a produtores e alugávamos o espaço a uma adega já existente e fazíamos lá o vinho”, recorda ainda o enólogo em relação aos primeiros anos de atividade. Das oito adegas, apenas Quanta Terra persistiu. “Entretanto transformou-se numa adega física. Demorou 15 anos, mas conseguimos”, explica fazendo referência ao edifício onde nos encontramos.

A sede desta sociedade é onde em tempos funcionou a Destilaria nº 7, edifício construído em 1934 sob a responsabilidade da Casa do Douro, instituição criada dois anos antes e que tinha um papel de certificação, além de ter o monopólio da produção de água ardente na região.

As obras começaram em janeiro de 2020 e em março deu-se o primeiro lock down. “Nós estávamos a fazer uma adega para o futuro, mas não sabíamos como ia ser o amanhã. Felizmente correu bem”, recorda. “O que importa é que os vinhos sejam bons, estamos numa região magnífica, com pouco trabalho, pouca intervenção, pouca manipulação e conseguimos fazer vinhos com cuidado. Uns fazem mais para a esquerda, outros mais para a direita, mas a região é fantástica”, resume Jorge Alves.

Exposição de Joana Vasconcelos
Exposição de Joana Vasconcelos créditos: Lusa

A inauguração do espaço aconteceu em março de 2022, com uma intervenção artística de Joana Vasconcelos que incluiu sete peças, entre as quais obras como “Pavillon de Vin” e “Coração Independente”, que nos últimos anos têm percorrido centros culturais internacionais. Mas a parceria com a artista já vinha de trás quando, em 2021, houve um lançamento de dois vinhos Quanta Terra (um tinto com Touriga Nacional, Touriga Franca e Sousão e um espumante Pinot Noir) com o rótulo desenvolvido pela artista plástica. A edição especial é vendida em caixas de três garrafas, sendo que a de tinto tem um PVP de 950€ e a de espumante um PVP de 1000€.

Quanta Terra é necessário ter para se ter uma adega e produzir vinho? Em Favaios, a Destilaria nº 7 é agora outra coisa
Quanta Terra é necessário ter para se ter uma adega e produzir vinho? Em Favaios, a Destilaria nº 7 é agora outra coisa Leni Van Lopik, artista plástica holandesa que reside na região há 23 anos créditos: Lino Silva

Neste momento é a exposição “Cor do Douro” de Leni Van Lopik, artista plástica holandesa que reside na região há 23 anos, perto de Armamar, patente na adega até outubro. As peças são produzidas a partir de materiais naturais e orgânicos, como folhas de eucalipto, bugalhos e pedras, quase sempre recolhidos durante as suas caminhadas, quando sai para passear o cão, pelos socalcos durienses, explicou-nos a artista plástica. É possível visitar a Quanta Terra e a exposição de quarta a domingo, das 10h às 18h.

Quanta Terra é necessário ter para se ter uma adega e produzir vinho? Em Favaios, a Destilaria nº 7 é agora outra coisa
Quanta Terra é necessário ter para se ter uma adega e produzir vinho? Em Favaios, a Destilaria nº 7 é agora outra coisa Exposição “Cor do Douro” créditos: Lino Silva

Mas se estamos a falar de uma adega, há também novidades vínicas, três para sermos mais exatos – o Terra a Terra branco 2022 (com Viosinho e Gouveio e estágio em barricas de inox), o Quanta Terra Grande Reserva branco 2021 (também com Viosinho e Gouveio, mas com estágio em barricas de carvalho francês usadas) e o Phenomena Rosé 2022. Damos destaque a este último.

Phenomena Rosé 2022

Phenomena Rosé 2022
Phenomena Rosé 2022 créditos: Lino Silva

Este vinho feito a partir da casta Pinot Noir, uma das mais usadas nos espumantes, dá corpo a este rosé de 2022, cujas vinhas se encontram a 600 metros de altitude, no planalto de Alijó, e que teve a sua primeira edição em 2018.

De acordo com Jorge Alves e Celso Pereira, este vinho quer conquistar as gerações mais jovens, nomeadamente os millenials e aproximá-los deste mundo de consumo. Trata-se de um rosé pouco alcoólico (12% de volume), que se apresenta numa cor que lembra mais um salmão e não os carregados rosés que antes se faziam, seguindo a tendência que começou em Provença, França, e que ano após ano tem ganhado cada vez mais espaço nos vinhos portugueses.

Na realidade, o Phenomena quer mesmo ser um fenómeno ao assumir-se como um vinho especial para aqueles que pensam fora da caixa. Algo que os próprios criadores quiseram transmitir ao querer dar elegância a um vinho que muitas vezes é considerado como apenas de verão ou menor, apreciado por aqueles que não gostam assim tanto desta bebida. “Eu o e Jorge decidimos olhar para o rosé como um vinho e não mais um vinho. Então pegámos nesta casta que se dá muito bem em solos de granito e em 2018 tivemos a felicidade de sermos reconhecidos como o melhor rosé a nível nacional”, partilha Celso Pereira.

Para isso, a colheita das uvas foi feita manualmente, com prensagem ligeira e fermentação parcial (apenas 50%), com estágio em barricas de carvalho francês. E o que distingue este rosé de outros? O facto de ter capacidade de guarda, algo impensável quando o consideramos um vinho de verão ou de piscina.

A sugestão é que o guarde para beber daqui a dois ou três anos e aprecie o Phenomena na sua plenitude. Por via das dúvidas disponha de duas garrafas: uma para beber agora e outra para daqui a um tempo. Só assim vai perceber a evolução deste vinho, que vai bem com pratos de peixe e mariscos, mas também com massas, pizzas ou tábuas de frios. O importante é desfrutar.

Esta edição de Phenomena tem 6500 garrafas e um PVP de 27€.

O SAPO Lifestyle visitou a adega a convite da Quanta Terra.