Os vinhos franceses têm uma fama global. Mas em Portugal, por estarmos tão habituados aos nossos vinhos, não são pouco conhecidos?
Isso não é um exclusivo português, acontece um pouco em toda a faixa mediterrânica. Os franceses gostam de beber os vinhos deles, os italianos os deles, os espanhóis os deles e nós os nossos. Acho que o interessante neste desafio é convidar os consumidores, por momentos, a descobrir alguns vinhos franceses, com uma qualidade bastante aceitável, com preços simpáticos, e mostrar-lhes como em França também há uma enorme diversidade. Há aqui um foco maior em Bordeaux, como seria de esperar, mas viaja-se também por outras regiões como Cote de Rohne, Languedoc. O objetivo é fazer com que as pessoas descubram aromas e sabores diferentes e perfis de vinhos diferentes. Provavelmente há pessoas que até vão sentir algum choque na primeira prova, mas tem muito a ver com tudo o que está por trás dos vinhos franceses. Como todos os vinhos do velho mundo, estão muito focados no terroir: clima, solo, castas, e é isso que faz a diferença. Embora aqui em Portugal tenhamos hoje uma diversidade claramente mais rica em termos de castas, em França também há uma enorme diferenciação em termos de castas, de regiões.
Portugal tem evoluído bastante nos últimos anos, desde a produção à promoção e marketing dos seus vinhos. Os franceses continuam a investir também nesta área ou encostam-se a glórias antigas?
A grande diferença é que os franceses levam-nos alguns séculos de avanço. Nós estamos hoje em dia a trabalhar a um ritmo muito acelerado para podermos, de alguma forma chegar, a um patamar semelhante. Os franceses têm de facto um reconhecimento muito grande em todo o mundo. Tem a ver com a qualidade, a história que têm, com o facto de terem levado os vinhos um pouco a todo o mundo, o facto da ligação aos ingleses, apesar de todo o antagonismo, que levaram as vinhos a um nível muito forte. E a escassez – hoje em dia não se fala muito disso, mas há 10 anos não havia 10 grandes colheitas, apenas uma ou duas boas colheitas. Isso fazia com que a procura fosse muito grande, havia uma grande ênfase à volta disso.
Nós de facto não estamos aí ainda, somos um país mais pequeno, temos mais dificuldade de penetração nos mercados, mas temos feito um ótimo trabalho para sermos mais conhecidos.
Como deve um leigo escolher um vinho francês?
Aí não é muito diferente dos vinhos portugueses. É preciso ter algum conhecimento, ou tentar aconselhar-se com uma pessoa que saiba de vinhos. Ser francês, por si, não significa nada…
Não basta ter “château” qualquer coisa...
Não, até porque há muitos château que têm muito pouco de château… Obviamente há as regiões emblemáticas, como Bordeaux, Champagne, mas há outras que também têm vinhos com histórias interessantes. Em França há muitos vinhos que são protegidos pelos produtores, há vinhos que são vendidos pelos comerciantes de vinhos. O mercado é muito diverso, por isso convém procurar algum aconselhamento. Se possível, procurar vinhos com algum reconhecimento de mercado, algum traço que os distinga. Não necessariamente os supercaros, embora a tendência seja os mais conhecidos serem muito caros.
O preço continua a ser um fator diferenciador?
Claro. O que faz o preço dos vinhos é o misticismo que está por trás. Quando falamos dos vinhos franceses mais reconhecidos, eles são muito caros, mas se os colocarmos numa prova cega ficaríamos surpreendidos com os resultados. Os vinhos valem não só pelo vinho, também pela história. Há muita gente que compra a garrafa e nunca vai beber na vida, é só para dizer que tem. Esse misticismo demora um tempo a construir.
Qual foi o seu papel nesta campanha do Lidl?
Não tenho nada a ver com a seleção, o que me pediram foi para construir historias à volta dos vinhos. O meu trabalho foi um pouco encontrar motivos que tornassem a compra interessante, não só pelo vinho mas como pela história das regiões.
Pode dar-nos alguns exemplos?
O que tentamos fazer dentro de cada região as castas que estão por trás, de uma forma simples, sem muitos tecnicismos, evidenciar o que tem de especial cada um. O Cabernet torna as coisas especiadas; se formos para a zona oriental, com solos calcários, um Merlot é muito mais interessante, mais delicado e frágil na boca. Essas diferenças têm uma razão por trás. A cada vinho, a cada região, está agregada alguma informação.
Ana César Costa
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