Sentemo-nos. Setembro já corre a meio calendário. O sol nascente ainda não fere, o rio rumoreja a uma trintena de metros, corre a brisa marinha e a manhã ainda tem muito para se espreguiçar até se encostar ao almoço. Pois assim sentados, deleitamo-nos num exercício inverso aos demais. Os que passam e agitam Lisboa. Andando, correndo, buzinando, de casa para o trabalho, do hotel para a descoberta da capital. Hoje não somos parte participante neste agitar da grande cidade. Hoje, sentamo-nos numa das maiores praças da Europa e, assim, a vemos passar.
Sentamo-nos e dispomo-nos a um outro exercício. Aquele que tantas vezes é esquecido na voragem do pouco tempo. O pequeno-almoço. Esse mesmo, a refeição que sabemos indispensável, mas que teimamos em delegar num pastel ou bolo desinteressantes, ingeridos sem vagar.
Temos pequeno-almoço servido em sala com 36 mil metros quadrados, o mesmo é dizer, para quem aprecia o preciosismo, com 180 por 200 metros. E sala cheia, por sinal. Estamos naquela que é a mais emblemática praça da capital. A do Comércio, que já foi Terreiro do Paço, casa de reis, de edifícios governamentais, que de fachadas amarelas, passou a rosa com a revolução de 1910, voltando à tonalidade torrada atual. Hoje praça convertida em função mais próxima do comum mortal. Um espaço de lazer, de restaurantes, bares, hotéis. Uma feição que parece não incomodar o olhar altivo de D. José, empinado na estátua equestre no centro da praça.
Daqui, desta Casa Lisboa onde nos sentamos, não descortinamos o cenho do monarca. Nas alturas, a mais de dez metros, mantém-se impávido no seu olhar brônzeo sobre o Tejo. Por aqui, à mesa da esplanada, temos o olhar vivo, preso na carta de pequeno-almoço desta casa lisboeta, de comeres e de nome, orquestrada pelo chefe Luís Gaspar. Uma nova morada do chefe que, não abandonando um seu outro lar uns quantos quarteirões a poente, a Sala de Corte, se lançou há poucos meses num projeto de boa amplitude culinária, como lhe demos conta aqui.
Em concreto, esta carta de pequeno-almoço não é papel que nos confunda. Não apregoa “mundos e fundos” só para encher papel. Temos duas opções. Uma escolha entre A e B, o mesmo é dizer um pequeno-almoço “Continental”, com um pãozinho de mafra de boa massa, uns ovos mexidos cremosos, tomate assado bem equilibrado entre a doçura e a acidez e barriga de porco fumada, acompanhada de cogumelos shitake saltados. Por 11,00 euros uma opção bem encorpada de pequeno-almoço ao estilo do velho mundo.
No caso vertente, optamos pela opção B, a “Veggie”, não por prática de vida no universo do veganismo, mas porque a antecipação gustativa de uns ovos benedict bem escalfados, vertentes de gema cremosa sobre o pão, sobrepõe-se momentaneamente a todo o quadro da Lisboa matinal que serve de entorno. E, assim se vai, pela opção B, com os ditos ovos a chegarem à mesa sobre um bolo do caco de alfarroba fofinho, acompanhados de cogumelos shitake e espinafres (12,50 euros).
Nos bebíveis, um incontornável das manhãs, o sumo de laranja natural (também há Cappuccino). Vinte minutos volvidos e tendo tornado os ovos benedict uma memória no prato, mas ainda bem presentes no palato, segue o pequeno-almoço para o ato final, um café. Isto enquanto Lisboa continua a passar. Corre ligeira, atarefada, do rio para a Augusta artéria e do coração bombeante da Baixa, fluindo de hordas de turistas para o Tejo. Será que tomaram um bom pequeno-almoço?
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