A lipossucção ou lipoaspiração é a técnica cirúrgica empregue para eliminar depósitos de gordura em determinadas partes do corpo. Ao longo do tempo, a lipossucção convencional tem dado passos significativos até chegar às megalipossucções, intervenções em que se extraem volumes de gordura antes impensáveis. Mas será que, apesar de ser muito procurada em muitas partes do mundo, se trata de uma técnica segura? Quais os riscos para a saúde?

A que critérios deve obedecer a sua realização? Conheça o ponto de vista do cirurgião plástico Biscaia Fraga no que se refere à lipo e à megalipo. A lipoaspiração convencional é uma técnica que consegue níveis estupendos de eficácia e segurança em pessoas que possuem um peso dito normal mas que têm gordura acumulada em determinadas áreas. A sua principal indicação terapêutica são, assim, as situações em que há adiposidade localizada em áreas anatómicas muito bem definidas.

Já a megalipossucção consiste em retirar uma grande quantidade de gordura por método aspirativo com o objetivo de correção de obesidade mórbida», esclarece Biscaia Fraga, diretor da Clínica Biscaia Fraga e ex-diretor do Serviço de Cirurgia Plástica Maxilo-Facial do Hospital Egas Moniz, em Lisboa.

A grande diferença entre ambas é que a primeira é dirigida a áreas anatómicas muito bem localizadas e definidas e a última é «uma terapêutica adjuvante para a obesidade mórbida quando há a necessidade de extrair grandes quantidades de gordura», defende o especialista.

O que caracteriza a megalipoaspiração

A megalipoaspiração pode definir-se como uma cirurgia de características especiais que tem como objetivo retirar, mediante uma avançada técnica de sucção, a maior quantidade possível de tecido gordo. Desta forma, aborda uma maior extensão corporal que as lipoaspirações convencionais e os resultados são espectaculares, defendem os especialistas.

Como é óbvio, as megalipoaspirações são mais complexas que as lipoaspirações convencionais, pelo que é necessária a participação de uma equipa multidisciplinar altamente experiente que selecciona e trata cuidadosamente cada caso. «A grande regra relaciona-se com o bom senso clínico do médico que atua. O clínico é que conhece a fisiologia e as reacções do paciente. Portanto, a regra de ouro é que o médico cirurgião tenha noção do que deve ou não fazer», acrescenta Biscaia Fraga.

Mas existem outras regras específicas que devem ser obrigatoriamente seguidas. «Tem de se utilizar obrigatoriamente a vasoconstrição para não haver sangramento e tem que haver uma unidade de cuidados intensivos para receber o doente no pós-operatório, já que esta cirurgia não pode ser realizada em regime ambulatório, requer internamento».

O preço e as limitações

O custo de uma megalipoaspiração corporal depende do paciente e da intervenção a realizar, mas é de aproximadamente 12.000 euros, repartida em dois ou três tempos operatórios. Existem alguns critérios para seleccionar os pacientes. A média de idades está entre os 30 e os 50 anos e o peso pode oscilar entre os 150 e os 200 quilos.

Biscaia Fraga assinala que os principais candidatos para a intervenção são pacientes que não perdem peso com dieta e outras medidas convencionais. Excluem-se as pessoas com diabetes, problemas cardiovasculares, valores baixos de hemoglobina, problemas de coagulação e doenças de rins, pulmões e fígado.

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Os cuidados que a intervenção exige

Há, contudo, que seleccionar muito bem o paciente, o volume a extrair e o tipo de anestesia a utilizar. «Esta cirurgia é predominantemente aplicada nas coxas, nas ancas, na cintura e no abdómen», sublinha. «Muitas vezes, é aplicada à situação de obesidade mórbida porque ainda há uma grande acumulação de gordura, que é retirada pela megalipoaspiração», explica o conhecido especialista português. «Na mesma altura, dá-se a adaptação da pele», salienta ainda Biscaia Fraga.

Os preparativos

A preparação para a megalipossucção começa um mês antes da intervenção com todo o tipo de controlos, nomeadamente sanguíneos, gordura corporal, entre outros. Os preparativos incluem uma extracção de sangue do paciente para o caso de ser necessária uma transfusão durante a intervenção. Biscaia Fraga adianta que «é uma medida preventiva que permite um pós-operatório em melhores condições e muito menos penoso».

A megalipoaspiração envolve um maior risco de sangramento do que a lipoaspiração convencional. E, nestes casos, é ideal que se contemple uma auto-transfusão. É um método mais seguro do que uma mera transfusão de sangue.

A intervenção

Basicamente, a técnica é a mesma das lipossucções convencionais com a diferença que as áreas a tratar são maiores e se extraem maiores quantidades de gordura. «A técnica cirúrgica deve ser tumescente, ou seja, o tecido adiposo tem de ser abundantemente infiltrado com soro frio e com vasoconstritor. Depois, a gordura deve ser aspirada de forma rápida e o menos traumática possível», indica Biscaia Fraga.

Realiza-se com anestesia local ou geral. «Com uma boa sedação, a anestesia local ou epidural podem ser utilizadas. A anestesia geral também pode ser contemplada», defende o cirurgião plástico. O anestesista tem de controlar a tensão arterial, a frequência cardíaca e respiratória.

«Um obeso mórbido é um doente de risco e o tempo de anestesia deve ser devidamente controlado», salienta Biscaia Fraga. É realizada uma pequena incisão de 0,5 centímetros e infiltra-se uma solução tumescente, uma solução salina combinada com anestesia local para evitar a dor e um vasoconstritor para evitar o sangramento. A solução é injectada através de umas cânulas.

«A quantidade de gordura que é retirada é equivalente à quantidade salina que se infiltra porque isto cria uma homeostasia (equilíbrio interno) adequada(o). Se se tiram seis litros, infiltram-se seis litros», sublinha. Posteriormente, procede-se à lipoaspiração, seguindo o método convencional com cânulas metálicas de 5 milímetros de diâmetro, aspirando tanto a níveis superficiais como profundos. Uma vez terminada a intervenção, coloca-se imediatamente uma cinta elástica nas áreas tratadas.

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O que acontece no(s) dia(s) seguinte(s)

Ainda que, nas lipossucções convencionais, o pós-operatório seja de três a quatro dias, na megaliposucção há que esperar umas três semanas para voltar ao trabalho e à vida social. Depende muito da situação clínica da pessoa. Com a megalipoaspiração, consegue-se uma mudança corporal incrível, assegura Biscaia Fraga.

Ainda que deva ser sempre acompanhada por um protocolo de emagrecimento e um programa de exercício físico personalizados, «a grande mudança do volume, da morfologia da pessoa e a redução de peso resultam da cirurgia», refere. Esta cirurgia permite baixar entre cinco a 10 números no tamanho de roupa, o que se repercute de forma muito positiva na autoestima do paciente, no seu regresso à vida social e profissional e até na sua saúde.

«Um número significativo de doentes hipertensos passa a ter uma tensão normal. Além disso, doentes com glicemias antigas (próprias de diabetes tipo 2) normalizaram o açúcar no sangue. Esta cirurgia é um investimento na saúde e na longevidade da pessoa que não se pode quantificar», defende o cirurgião plástico.

Outra das vantagens é que evita que se recupere o peso anterior à intervenção e, além disso, consegue-se uma retração da pele mais favorável do que quando se baixa de peso sem cirurgia. Curiosamente, muitas mulheres que passaram por megalipoaspirações, ao fim de uma média de dois anos, «aumentaram um número de copa de soutien», diz Biscaia Fraga. «Como na periferia da mama existe tecido adiposo, essas células mamárias captam os nutrientes e aumentam de volume», diz.

A polémica

Nem todos os cirurgiões plásticos estão de acordo no que respeita à conveniência de realizar uma megalipoaspiração. Em muitos países, é necessário o consentimento de um comité ético-hospitalar para autorizar a prática destas intervenções. É o caso de Biscaia Fraga, que recomenda a realização de megalipos em três tempos. «Não se retiram de uma só vez 15 litros de gordura porque é uma atitude agressiva», justifica.

«Para um obeso, prefiro retirar quatro a cinco litros de cada vez, sem necessidade de internamento. É mais confortável para o doente que, assim, vive uma vida praticamente normal. E há menores riscos se esta cirurgia for repartida», prossegue. «Com a minha experiência, o método de ambulatório reduz os riscos espectacularmente. O doente levanta-se depois da cirurgia e toda a actividade circulatória é desenvolvida», explica.

«Em quatro meses, consigo transformar completamente um paciente», defende ainda Biscaia Fraga. Por outro lado, há quem considere que o próprio tratamento da obesidade com megalipoaspiração não tem razão de ser. Os métodos actualmente disponíveis na luta contra a obesidade, como a cirurgia bariátrica, balões intra-gástricos e dietas com proteínas, podem resolver o problema de fundo e permitem ao paciente alcançar um peso normal.

O assunto, apesar de já não ser propriamente novo, ainda é polémico. Daí que Biscaia Fraga opte pela segurança de fasear este processo cirúrgico, tornando-o mais adequado para o paciente.

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Onde está o limite?

A média de gordura extraída nestas intervenções é de aproximadamente 10 litros mas, em alguns centros especializados, podem extrair-se até 15 quilos de gordura numa única sessão. Tendo em conta as alterações que tal remoção causa no organismo são, por isso, são necessários cuidados especiais. «Um obeso mórbido é um doente grave, crónico e fatal, como tal, é um doente de alto risco em termos médicos e cirúrgicos», alerta Biscaia Fraga.

«Para o tratamento correcto de um obeso mórbido, devem intervir as especialidades de endocrinologia, psicologia, psiquiatria, cirurgia geral (numa primeira etapa), nutrição, gastrenterologia, anestesiologia, cuidados intensivos e a cirurgia plástica», acrescenta o cirurgião plástico.

Texto: Cláudia Pinto