Em época de exames, é comum encontrar alunos que fazem longos períodos de estudo noturno, abdicando de uma noite de sono reparador. As “diretas” (noites sem dormir), habitualmente na véspera de avaliações, são frequentes e tornaram-se populares entre os estudantes universitários. A existência de espaços de estudo abertos 24 horas/dia, com áreas de estudo e lazer, tornaram mais aprazível e mais social o ato de estudar pela noite dentro.
Apesar da maioria dos alunos reconhecer o sono como importante, na hora de estudar é-lhe dado um papel secundário. Este não é um fenómeno novo, tanto que os efeitos da privação de sono na aprendizagem estão largamente documentados, e contrariam os adeptos de longas noites de estudo. Também é sabido que os nossos jovens dormem cada vez menos e com pior qualidade, consequência de hábitos sedentários, as novas tecnologias e o ambiente poluído, entre outros, que fragmentam o sono.
O sono e a sua importância
O sono é um processo homeostático que influencia não apenas a qualidade da vigília (estar acordado), mas também a atividade e plasticidade neuronal. O sono contribui para a regulação do organismo, auxiliando o funcionamento dos sistemas endócrino, nervoso, circulatório e imunitário. Além disso, o sono afeta a aprendizagem, tendo grande impacto na atenção e memória.
A investigação mostra que o sono tem um papel fundamental no funcionamento físico, cognitivo e emocional. Este papel é ainda mais relevante em adolescentes nos quais as mudanças no ritmo sono-vigília acontecem mais rapidamente. Alterações hormonais, comportamentais e sociais levam os adolescentes a deitarem-se mais tarde. Como necessitam acordar cedo para a sua rotina escolar, vão acumulando privação de sono (pouca quantidade e qualidade de sono). O mesmo ocorre em estudantes universitários cujas rotinas de sono são inconstantes com horários irregulares (sem hora certa para adormecer e acordar).
As consequências da privação de sono são claras: um sono pouco reparador está associado a piores desempenhos escolares em todos os níveis de ensino. A falta de um sono de qualidade perturba o funcionamento do cérebro e impede o seu correto desenvolvimento.
Recentes estudos mostram que alunos com privação de sono apresentam:
- piores desempenhos em tarefas de atenção, memória e aprendizagem;
- menor desempenho na aprendizagem da matemática, na leitura e escrita;
- maiores dificuldades na regulação do humor e comportamento;
- maior probabilidade de desenvolver problemas de saúde mental (por exemplo, ansiedade e depressão);
- maior propensão para doenças cardiovasculares, endócrinas e metabólicas.
Para dormir mais e melhor, é importante manter uma rotina de sono constante, isto é, deitar e acordar sempre à mesma hora. Os estudos mostram que, para um melhor desempenho escolar, mais importante que dormir um número de horas adequado, é manter uma rotina de sono estável e regular.
Um sono irregular parece atrasar em cerca de 3 horas o relógio interno (mecanismo biológico que regula os ritmos), atrasando a libertação de melatonina, que é a principal hormona responsável pelo sono. A exposição à luz artificial pode prejudicar a qualidade desta hormona, pelo que o uso de tecnologias, à noite ou em excesso, é desaconselhado.
Um sono estável, de boa quantidade e qualidade, contribui para a consolidação de memórias. É durante o sono que o cérebro organiza a informação processada durante o dia. Uma noite de pouco sono não permite ao cérebro uma adequada integração da informação, tão importante em épocas de estudo.
Sono de qualidade e em quantidade + estudo = boas notas
Em particular na época de exames, mas em qualquer altura, é fundamental que os alunos sigam as seguintes recomendações:
1) Deitar cedo e dormir o suficiente
Deitar cedo assegura uma maior oportunidade para uma boa noite de sono. É importante considerar as necessidades individuais de sono: um adolescente necessita, em média, de dormir 8.30 a 9.30 horas/noite. Um adulto necessita entre 7 a 9 horas.
2) Afastar as insónias
Se o seu filho estiver a tentar adormecer há mais de 20 minutos, sugira-lhe que se levante e faça algo relaxante para descontrair até ficar sonolento (por exemplo, relaxamento respiratório, mindfulness, ler, ouvir música calma). Ver TV ou ir às redes sociais não são uma boa opção pois inibem a produção da melatonina, a hormona que dá sono.
3) Preocupações fora da cama
O seu filho deve evitar estudar, ver televisão ou usar telemóvel quando estiver na cama. A cama deve ser usada apenas para dormir. Tudo o resto poderá deixá-lo muito ativado e perturbar-lhe o sono.
4) STOP sestas
Se o seu filho não tem recomendação médica para fazer sestas, e tem mais de 6 anos, não necessita de sestas durante o dia. Dormir uma sesta poderá desorganizar-lhe o sono de noite. No entanto, se estiver mesmo a precisar de um descanso diurno, recomenda-se uma pequena sesta com cerca de 20-30 minutos, antes das 15-16h horas.
5) Mantém o mesmo horário de despertar, mesmo no fim de semana
A melhor forma para “regular o relógio interno” é manter sempre a mesma hora de deitar e acordar, independentemente de ser dia de semana ou fim de semana. Se o seu filho tiver o hábito em levantar cedo durante o fim de semana, à noite terá sono mais cedo. Esse ritmo de sono-vigília estável assegura uma noite de sono mais reparadora e, como vimos, está relacionado com melhores desempenhos escolares.
6) Evitar cafeína
Não é por acaso que a cafeína tem fama de “despertar”. Esta substância é, de facto, ativadora do organismo e, como tal, deve ser evitada 4-6h antes de dormir para que não perturbe o sono.
7) Pouca luz e nada de eletrónica
A luz artificial (isto é, tudo o que ilumina além do sol) é incompatível com o sono. Uma luz intensa deteriora a qualidade da principal hormona que induz e mantém o sono. Uma solução passa por ter pouca luz no quarto e aplicar um “filtro de luz azul” nos dispositivos eletrónicos, embora esteja demonstrado que este filtro não é totalmente eficaz. Também se recomenda desligar todos os equipamentos pelo menos 30 minutos antes de deitar.
8) Refeição leves
Antes de dormir, as comidas “pesadas” devem ser evitadas. O seu filho pode optar por um snack saudável e ligeiro. Sugere-se, também, o controlo da ingestão de líquidos à noite para que não tenha de interromper o sono para uma ida à casa de banho.
Um bom sono é reparador e revigorante, desde que seja de qualidade e na duração necessária. Se durante o dia, o jovem estiver bem-disposto, com energia e ânimo, então, à partida, estará a dormir bem e em quantidade suficiente.
Um bom sono contribui para a aprendizagem, atenção e memória, assegurando uma maior eficácia do estudo. Uma boa noite de sono e um estudo adequado e atempado são a chave do sucesso para os exames!
Texto: Marco Martins Bento/Psicólogo Clínico/Núcleo de Perturbações de Sono (PIN)
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