Os hábitos e as preocupações alimentares dos portugueses alteraram-se, em muitos casos, radicalmente nos últimos anos. De uma alimentação tradicional evoluiu-se para uma dieta mediterrânea com mais vegetais e gorduras saudáveis e houve ainda quem optasse por um regime vegetariano, sem recurso a produtos de origem animal.

A par da tendência, várias questões devem ser colocadas quando se trata de aplicar certos tipos de dieta na infância, sobretudo em idades muito precoces. Deverão os pais passar estes hábitos alimentares aos filhos? Rodrigo Abreu, nutricionista, esclarece todas as dúvidas que o assunto ainda gera. 

Variar é preciso

Desde pequenos que ouvimos pais e médicos alertarem para a importância de uma alimentação variada. Na escola, a roda dos alimentos é, muitas vezes, colada numa das paredes da sala, para estar presente na memória das crianças. Assim sendo, é natural que a fuga a estes princípios levante dúvidas. Será saudável crescer sem comer carne e peixe?

Para Rodrigo Abreu esta é uma questão delicada. Na sua opinião, a carne e o peixe são importantes, uma vez que fornecem nutrientes essenciais ao crescimento. Ao contrário do que seria desejável, o especialista considera que estes nutrientes são difíceis de encontrar em quantidade suficiente noutros alimentos.

Por este motivo, «uma alimentação que retire completamente os produtos de origem animal será deficitária em alguns nutrientes essenciais, pelo que não é recomendada a crianças em idade de crescimento», afirma.

Prós e contras

Colocando os pratos na balança, Rodrigo Abreu realça os vários riscos desta opção na infância e adolescência. «Existem alguns problemas de saúde que estão frequentemente associados a dietas vegetarianas nas crianças, como o baixo desenvolvimento de peso e estatura, a diminuição das capacidades do sistema imunitário, as anemias e algumas irritações no intestino, associadas das ao excesso de fibras nas verduras e leguminosas», refere.

Por estas razões, recomenda que se vigie atentamente o crescimento da criança e que se avaliem periodicamente alguns indicadores do seu estado nutricional. Para o caso de ter dificuldades a este nível, procure um médico ou um nutricionista.

Tendo estipulado esta regra, e compreendendo que será difícil para pais vegetarianos prepararem refeições distintas para os filhos, por questões de tempo e de princípios, Rodrigo Abreu aceita algumas exceções.

Existem diferentes tipos de dieta vegetariana e que, em certos casos, se os pais tiverem um conhecimento consistente e uma prática continuada, é possível que uma criança com um regime ovolacto-vegetariano (que inclui ovos e laticínios) se desenvolva de forma saudável.

Ainda assim, o nutricionista deixa um alerta. «Os regimes vegetarianos mais restritos não são recomendados antes dos 16 a 18 anos, implicando sempre o recurso a suplementos nutricionais», realça.

Menu à la carte

É fundamental que os pais se centrem nos nutrientes essenciais, em vez de elaborarem listas de alimentos que a criança deve ingerir. «Na fase de crescimento são necessários nutrientes cujas principais fontes são os produtos de origem animal, nomeadamente vitaminas do complexo B, minerais como o ferro e certos tipos de aminoácidos. Neste sentido, é importante que a criança os receba através de combinações corretas de grupos de alimentos», refere o nutricionista.

«Os cereais devem ser combinados com leguminosas ou outras fontes de proteínas. Os legumes devem ser corretamente cozinhados para preservarem o máximo de vitaminas e minerais. Os legumes cozidos em água perdem cerca de 80 por cento do seu teor de vitaminas hidrossolúveis e uma quantidade igualmente significativa de minerais», explica.

Para ter uma noção das porções, imagine um relógio. «Um prato saudável deverá conter meia hora de legumes (metade do prato), um quarto de hora de proteínas (carne ou peixe) e outro quarto de hora de hidratos de carbono (batatas, arroz ou massa)», sublinha.

Apoio médico

Antes de iniciar qualquer regime alimentar vegetariano, a criança deve ser analisada pelo pediatra, que verá se ela reúne as condições de saúde mínimas para suportar este tipo de alimentação. Em seguida, deverá consultar um nutricionista que faça um plano alimentar personalizado que cubra da melhor forma as necessidades nutricionais.

Para as dietas vegetarianas mais restritivas, Rodrigo Abreu considera fundamental a toma de suplementos de vitamina B12, que são frequentemente acompanhados de suplementos de ferro, zinco, vitaminas do complexo B.

«A suplementação deve ser sempre indicada pelo médico assistente, mediante os valores observados nas análises de rotina», alerta.

E deve ser feita com conta, peso e medida.

 

«A toma indiscriminada de suplementos deve ser evitada, sobretudo em crianças, pois pode sobrecarregar de forma perigosa os rins e o fígado», conclui.

Três pratos

Especialista explica as diferenças entre as principais dietas vegetarianas:

Dieta vegan
Todos os alimentos de origem animal são retirados. Para Rodrigo Abreu, «esta dieta é pobre em vitaminas do complexo B, ferro, zinco, alguns aminoácidos e não fornece vitamina B12, sendo por isso desaconselhada na infância».

Dieta ovolactovegetariana
Inclui alguns alimentos de origem animal, nomeadamente ovos, leite e derivados. «Se for corretamente planeada e praticada, pode fornecer todos os nutrientes necessários ao normal desenvolvimento da criança. No entanto, é necessário que os pais estejam muito familiarizados com este regime e que consigam cozinhar e combinar corretamente vários tipos de alimentos», afirma.

Dieta que retira a carne, mas inclui peixe, ovos e laticínios.
Para o especialista, «este tipo de alimentação consegue mais facilmente aportar todos os nutrientes necessários ao salutar crescimento da criança».

Texto: Ana Catarina Pereira com Rodrigo Abreu (nutricionista)