Os números não deixam lugar para dúvidas. Nos últimos anos a obesidade triplicou na Europa, afetando 20 por cento da população.

 

Estima-se que uma, em cada cinco crianças europeias, tenha excesso de peso. E o nosso país não é exceção.

 

Dados divulgados pela Plataforma contra a Obesidade revelam que, em Portugal, o excesso de peso atinge 30 por cento de crianças e mais de dez por cento são obesas. Este problema não é apenas estético, tem graves repercussões na saúde, autoestima e esperança de vida da criança.

 

Patologias associadas à idade adulta, como a diabetes tipo 2, começam agora a surgir na infância. Siga as orientações de Paula Veloso, nutricionista, e ajude o seu filho a fazer as melhores escolhas alimentares. A saúde dele agradece!

Prevenção

«A obesidade infantil está globalizada e surge em qualquer idade. Por isso, os especialistas recomendam que a prevenção se faça cada vez mais cedo, até mesmo antes do nascimento», defende Paula Veloso, exemplificando que «as grávidas devem evitar um aumento de peso excessivo (mais do que nove a dez quilos) durante a gravidez, prevenir a diabetes gestacional e promover a amamentação».

Em questões de balança, a regra é igual à dos adultos: o aumento de peso resulta de um aporte de calorias superior às necessidades do organismo e à falta de atividade física. Para a especialista, «as crianças terão menos tendência para engordar nas fases de crescimento ativo (até aos 18 meses, entre os dois e os seis anos e a partir dos sete ou oito anos até aos 11 ou 14), mas tal não significa que não engordem».

Sinais de alarme

Face ao crescimento da criança como podemos saber se tem um peso preocupante? «Normalmente, quando os pais ou avós acham que o filho é gordinho ou forte, ou seja, quando a gordura já se observa a olho nu, isso corresponderá a uma pré-obesidade ou obesidade», alerta a especialista.

Para fazer o rastreio recorre-se ao Índice de Massa Corporal (IMC), um cálculo válido para crianças após os dois anos de idade. Primeiro «deverá encontrar o Índice de Massa Corporal que se obtém dividindo o peso em quilos pelo quadrado da altura em metros, depois consultar a tabela de IMC no boletim de saúde e verificar em que percentil se encontra a criança», explica.

«Se está acima do percentil 85 encontra-se numa situação de sobrepeso ou pré-obesidade.

Acima do percentil 95, será já obesidade franca», sublinha Paula Veloso. Mesmo que a silhueta não o denuncie, outros sinais podem dar o alarme, «se a criança se cansa muito, tem dificuldades de relacionamento com os colegas ou de integração na escola», enumera.

O veredito

Os laços de afeto que unem pais e filhos explicam, em parte, a dificuldade que muitos têm em reconhecer o excesso de peso. Aqui o médico é uma boa ajuda.

«As visitas ao pediatra nas alturas certas, com as avaliações periódicas do peso e altura, logo do IMC, ditarão o momento da intervenção. O pediatra será a primeira pessoa a constatar o excesso de peso e a aconselhar certas medidas ou mudança de hábitos», esclarece.

Muitas vezes tudo se resolve com um incremento da atividade física. Se a situação se agravar, poderá ser necessária a intervenção de uma equipa multidisciplinar, que inclua nutricão, psicologia e exercício físico», aponta.

Fazer dieta?

Ao contrário do que possa pensar, a solução não passa por uma dieta rigorosa. «Na maior parte dos casos, basta que façam o número de refeições adequadas ao número de horas de atividade, que comam sopa no início das refeições e não bebam refrigerantes em vez da água. E que se mexam o mais possível, seja a brincar ou numa qualquer outra atividade física, pelo menos uma hora por dia (dançar, saltar à corda, andar de bicicleta). Fazer dieta, no sentido convencional do termo, desaconselho», afirma Paula Veloso.

Os resultados não são imediatos. O segredo é ser paciente e encarar o processo como uma alteração gradual e duradoura dos hábitos de vida da criança e da família. «O importante é inverter o processo, ou seja, deixarem de acumular quilos e começarem a perdê-los ainda que muito lentamente», realça.

Trabalho de equipa

A estratégia para pôr termo ao problema de peso depende, sobretudo, da família. «Quanto mais cedo se incutirem bons hábitos alimentares maior será a taxa de sucesso», assegura o especialista.

«Mas é importante que os pais percebam que tal implica o envolvimento de toda a família», refere ainda.

«Isto é, querer que o filho emagreça tendo a despensa ou o frigorífico cheio de alimentos tentadores não possui qualquer efeito prático», acrescenta.

 

«Se para um adulto é difícil resistir a alguns alimentos, imagine para uma criança que a isso não atribui qualquer significado» exemplifica a especialista.

 

«Serão os pais, com o seu exemplo de boas ou más práticas, que conseguirão ou não que as crianças mudem a sua atitude face aos alimentos e à atividade física», frisa ainda.

Menu do dia

Começar o dia com um pequeno-almoço completo é o primeiro passo a seguir por todos os elementos da família. Este deve incluir, pelo menos, alimentos de três grupos diferentes da roda dos alimentos, cereais, fruta ou laticínios. Ao longo do dia, o intervalo entre as refeições não deve ser superior a três horas. Para garantir um bom aporte de legumes e saciedade, o almoço e o jantar devem ser «precedidos por sopa e, quando a criança tem muito apetite, a fruta no início, antes ou a seguir à sopa», aconselha.

Durante a tarde, se o intervalo entre o lanche e o jantar exceder três horas ou se a criança tem muito apetite, é aconselhável fazer um segundo lanche. Ao deitar, beber um copo de leite nem sempre é indicado. «Se a criança cumpriu o plano de refeições, e partindo do princípio que o jantar ocorreu cerca das 19h30/20h00 e esta não se deita depois das 21 ou 22 horas, não haverá necessidade de comer mais nada», frisa.

Boas escolhas

Esqueça a publicidade, ignore as cores das embalagens e, sobretudo, não dê importância às exigências dos mais pequenos. Tal como nos outros aspetos da educação, também na alimentação são os pais quem deve decidir. Encha o frigorífico com alimentos saudáveis e variados, fruta, legumes, laticínios, e adquira doces apenas ao fim de semana. No dia a dia, evite incluir no menu infantil produtos embalados ou pré-confecionados que, por norma, contêm mais sal, açúcar ou gordura.

Na opinião da nutricionista, «não é só o excesso de calorias e de substâncias nefastas desses alimentos que é preocupante, mas também a ausência de nutrientes indispensáveis ao crescimento e a uma boa saúde». As porções são outro aspeto preocupante, «muitas crianças comem numa dose de batatas o equivalente a metade das calorias do dia todo», alerta.

Erros comuns

Fomente uma relação saudável entre a criança e a comida, evitando associá-la a uma recompensa. Na questão do peso, adote um discurso positivo e evite tornar este problema no tema central das conversas em casa.

 

«Estar constantemente a recriminá-la por ser gorda ou pelo que come não é solução» alerta a especialista, apontando outro erro comum, a proibição.

«Se a criança vai estar sujeita a um regime de apartheid alimentar, tal só poderá agravar a situação porque ainda se sentirá mais discriminada», adverte ainda.

Por fim, não se alongue em explicações, sobretudo junto das crianças mais pequenas. «Não é necessário nem desejável falar em questões de saúde que eles não entendem. Basta que percebam que há alimentos e bebidas que não podem ser consumidos todos os dias», conclui a nutricionista.

A atitude certa

E quem disse que uma alimentação saudável tem de ser aborrecida? Seja criativa e desafie os seus filhos a participarem na preparação de pratos coloridos e equilibrados. Aposte numa rotina familiar saudável, tornando-a mais apelativa para os mais pequenos. Se forem rapazes pode, como recomenda Paula Veloso, «sensibilizá-los para um melhor desempenho no desporto, utilizando figuras de referência do futebol, por exemplo.

Nas raparigas, relacionar a alimentação com uma pele, olhos e cabelos bonitos. Pode até inventar nomes sugestivos para pratos que pensam não gostar, utilizando os seus heróis». Acima de tudo, dê o exemplo para manter a obesidade à distância.

Em equilíbrio

Menu para uma criança de quatro a oito anos, segundo Paula Veloso, nutricionista:

Pequeno-almoço

- 240 ml de leite meio gordo ou iogurte
- Meio pão com fiambre de frango ou perú
- Meia peça de fruta

Merenda da manhã

- Iogurte ou 125 ml de leite
- Bolachas tipo Maria ou 1 peça pequena de fruta

Almoço

- Sopa de legumes
- 45g de carne, peixe ou 1 ovo e meio
- 2-3 colheres de sopa de arroz ou massa cozidos ou 3-4 de leguminosas ou 1/2 a uma batata
- 1/2 chávena de hortícolas
- 1 peça de fruta

Lanche 1

- 120 ml de leite
- 1/2 pão com 20 g de queijo

Lanche 2 (opcional)

- 1 peça de fruta, 1 cenoura ou 1 tomate pequeno (ou 4-5 tomates cereja)
- 2 bolachas torradas

Jantar

- Sopa de legumes
- 45 g de carne, peixe ou 1 ovo e meio
- 2-3 colheres de sopa de arroz ou massa cozidos ou 3-4 de leguminosas ou 1/2 a uma batata
- 1/2 chávena de hortícolas (pode ser incluído no prato)
- 1 peça de fruta

O segundo lanche é indicado se o intervalo entre o lanche e o jantar for superior a três horas ou se a criança tem muito apetite.

Texto: Manuela Vasconcelos com Paula Veloso (nutricionista)