A infância privilegiada em Caracas

Maria Carolina Josefina Pacanis y Nino nasceu a 8 de janeiro de 1939 em Caracas, na Venezuela. Cresceu no seio de uma família abastada e numerosa – tem três irmãs -, onde as mulheres foram figuras fulcrais na sua vida. O seu estilo de vida privilegiado, repleto de viagens ao estrangeiro, roupas de luxo e convivência com a alta sociedade permitiu-a cultivar o gosto por coisas belas e requintadas.

A par da leitura, a equitação e o desporto foram as suas grandes paixões durante a adolescência. Apesar do fascínio que sempre sentiu pelo estilo das grandes estrelas de Hollywood – tendo criado o seu primeiro vestido com apenas 14 anos -, a moda só surgiu como uma opção profissional mais tarde na sua vida. "Talvez a moda estivesse adormecida dentro de mim e surpreendentemente despertou. Durante a minha adolescência, os meus grandes interesses eram os cavalos, o ténis, os meus cães e a vida normal, não era a moda", disse em fevereiro de 2012 à agência Reuters.

Após completar 18 anos casou-se com Guillermo Behrens Tello e desse matrimónio, que terminou em divórcio sete anos mais tarde, nasceram Mercedes e Ana Luisa.  Em 1968 dá o nó pela segunda vez com o aristocrata Reinaldo Herrera Guevara, Marquês de Torre Casa, com quem teve duas filhas, Patricia e Carolina Jr., que atualmente trabalham na empresa da família.

Aos 42 anos e com praticamente nenhuma experiência profissional – o seu único trabalho foi como relações-públicas de Emilio Pucci -, a estilista decidiu que a vida de mãe e dona de casa para a qual tinha sido educada não eram para si. O seu objetivo? Fazer algo diferente. Com o apoio do marido, com quem celebrou recentemente 44 anos de matrimónio, aventurou-se naquela que viria a ser uma das jogadas mais arriscadas da sua carreira: a incursão no mundo da moda. "Ele acreditou que eu deveria fazê-lo, e isso foi muito importante para mim. Temos de ter o apoio da nossa família, porque se trabalharmos em algo em que não concordem é um inferno", referiu em entrevista à Beyond, a revista do hotel St. Regis em 2014.

A criação da maison Carolina Herrera e a paixão por camisas brancas

O ano de 1981 é um momento de viragem na vida de Herrera uma vez que foi nesse ano que Diana Vreeland lhe sugeriu lançar-se em nome próprio. A ideia inicial da estilista venezuelana era desenhar os seus próprios tecidos, mas a amiga e ex-editora da revista Vogue convenceu-a a apostar numa linha de roupa. Ainda que sem qualquer tipo de experiência na área e com o investimento de um grande amigo, Herrera realizou o seu primeiro desfile no Metropolitan Club, em Nova Iorque. A coleção foi um sucesso, levando a que se mudasse para Big Apple e desse início nascesse aquele que viria a ser o império Herrera.

"Nunca esperei que isto se tornasse em algo desta magnitude. Tenho de dizer que era muito inocente na altura em que apresentei a minha primeira coleção. Pensei que tinha aparecido e que já era bem-sucedida. Não me apercebi do quão difícil é a indústria da moda, mas tenho tido muita sorte porque as mulheres à volta do mundo adoram os meus designs. É graças a elas que a Carolina Herrera tem sido tão bem-sucedida", afirmou à revista Glamour em novembro de 2012 sobre esse momento-chave na sua carreira profissional.

Ainda hoje recorda com emoção a primeira vez que viu uma das suas criações fora das passerelles. Durante uma ida à Ópera viu uma mulher entrar com um vestido de noite e uma capa de penas marabu da sua primeira coleção. "Quase saltei [dos camarotes] para cima dela. Estive para lhe dizer ‘Essa criação é minha’," disse sobre esse momento no vídeo ‘The Conversation’ publicado na sua conta oficial de Youtube.

É indiscutível que a marca Carolina Herrera é sinónimo de elegância, feminilidade e sofisticação. Aliás, não é à toa que as suas criações continuam a conquistar mulheres em todo o mundo e a atrair celebridades como Renée Zellweger, Taylor Swift, Tina Fey ou a duquesa de Sussex, Meghan Markle. O facto de ter crescido rodeada de coisas bonitas e mulheres sempre bem-vestidas ajudou-a a desenvolver um olho clínico no que diz respeito à confeção de roupa e a ter uma visão muito específica para a sua marca.

"Tinha jeito para aquilo. E neste mundo, isso é mais importante do que saber coser um botão. Eu tenho as ideias e uma equipa que já trabalhou para grandes marcas ao meu lado. Digo-lhes o que quero; digo-lhes como quero as mangas e os ombros, o comprimento da saia, a cintura, as cores. Tens de ter um sentido de proporção e corte. E isso não se aprende. Ou o tens ou não. E eu sei fazê-lo. A moda deve ser agradável aos olhos. E eu sei como o fazer. Sei aquilo que fica bem", explicou ao jornal El País em janeiro de 2017. É de recordar que o bom gosto e a arte de bem vestir é um traço inerente a Carolina Herrera que, em 1980, entrou para o International Best-dressed Hall of Fame.

A par das saias compridas e dos vestidos de gala, a camisa branca de algodão é uma das peças mais icónicas da marca, estando presente em praticamente todas as suas coleções, ainda que com pormenores e detalhes diferentes. Para a estilista este é um essencial no seu roupeiro e a sua peça de eleição quando não sabe o que vestir. Mas como e quando é que começou este love affair? "Na escola primária usava um uniforme que tinha uma camisa branca com o colarinho à Peter Pan. Deve ser por isso que gosto tanto de camisas brancas, é como se fossem uma peça que me faz sentir confortável", explicou numa entrevista concedida em fevereiro de 2016 ao site de moda The Cut.

A relação com Jackie Kennedy Onassis, as noivas Herrera e o lançamento do primeiro perfume

Após o lançamento da sua empresa, a estilista venezuelana teve a sorte de ter parte do clã Kennedy como suas fiéis clientes. Jackie Kennedy Onassis teve também um papel importante na história da marca de moda, que devido à sua exposição mediática deu ao nome Carolina Herrera uma visibilidade de valor incalculável.

"[Para além da Diana Vreeland,] uma pessoa que me ajudou muito foi a Jackie Kennedy Onassis. Ela acreditou em mim e desenhei muitas roupas para ela nos seus últimos 12 anos de vida", disse sobre a relação com a ex-mulher de John F. Kennedy e que ainda hoje é considerada um ícone de moda pelas suas indumentárias. Segundo o jornal El País ninguém vestiu mais primeiras-damas do que a estilista venezuelana.

Em 1986 teve a oportunidade de desenhar o vestido de casamento da filha ex-primeira-dama, Caroline Kennedy, que subiu ao altar nesse ano. Para a ocasião usou uma criação em organza de seda, com mangas em balão e um corpete adornado com trevos. No ano seguinte lançou a sua coleção de noivas, Carolina Herrera Bridal.

"As pessoas dizem que o [sucesso do] vestido da Caroline foi a razão pela qual eu desenvolvi a minha linha de noivas. Não! Desde o começo, eu sempre encerrei os meus desfiles com um vestido de noiva, e estava a planear uma coleção de noivas porque sempre acreditei neste dia, que é repleto de esperança e romance e fantasia", disse à revista Vogue em maio de 2018.

Em 1988 associou-se ao grupo espanhol Puig – que desde 1995 é detentor da marca Carolina Herrera – para criar aquela que viria a ser a sua primeira fragrância: Carolina Herrera. "É o acessório invisível. Dá-nos personalidade, dá-nos identidade", referiu à bíblia da moda sobre este complemento indispensável no dia a dia de qualquer mulher. Desde que a sua filha Carolina Herrera de Baez se juntou à empresa, a divisão de perfumes cresceu exponencialmente, contando atualmente com 20 fragrâncias no seu portefólio. Entre os best sellers da marca estão os famosos 212 e Good Girl, que ajudou a criar ao longo dos anos.

"O frasco do Good Girl tem o formato de um salto alto. Trabalhámos nesse frasco durante três ou quatro anos. É definitivamente um trabalho de equipa. O design não é meu, mas é muito importante e trabalhámos arduamente e fizemos muita pesquisa. […] Fomos pioneiros quando criamos o 212, que parecia um comprimido. Foi em 1996, e o formato era inovador para a época. A Carolina Herrera sempre foi arrojada em termos do design dos seus frascos. Sempre foram espetaculares", disse Baez, que atualmente é diretora criativa de beleza, em setembro de 2021 à Interview magazine.

E a expansão da marca Herrera não abrandou nem um pouco nos anos que se seguiram com o lançamento da CH, uma linha de produtos mais acessíveis, uma linha de óculos de sol e, mais recentemente, uma linha de maquilhagem. Em tudo aquilo que se propôs fazer ao longo da sua carreira fazer, uma coisa é certa: sempre sobressaiu a sua busca incessante pela beleza.

2018: O fim e o início de uma nova era

Após quase quatro décadas à frente daquele que veio a ser um dos grandes amores da sua vida – a moda -, em 2018 trocou o cargo de diretora de criativa pelo de embaixadora global da marca Herrera. "Eu não me estou a reformar! Estou a seguir em frente", disse em fevereiro de 2018 ao The New York Times sobre esta nova etapa na sua vida profissional.

Wes Gordon, que até então trabalhou como consultor criativo da marca e lado a lado com Carolina Herrera, foi o escolhido para ocupar o cobiçado cargo de creative director, decisão essa que a estilista manteve em absoluto segredo até ao seu anúncio formal.

"Estou muito feliz com a evolução da empresa nos últimos 37 anos. O nosso sucesso tem sido enorme e um verdadeiro sonho. Existem ainda muitas oportunidades e estou entusiasmada em continuar a representar esta marca e os seus projetos à volta do mundo. Estou satisfeita que o Wes faça parte da House Herrera – é a pessoa certa para este cargo", disse a designer na altura, num comunicado citado pelo site Refinery 29.

O seu desfile de despedida realizou-se no dia 12 de janeiro de 2018 durante a Semana da Moda de Nova Iorque. O evento, que teve lugar no Museum of Modern Art, prestou homenagem às peças mais icónicas da estilista, com as modelos a surgiram na passerelle de camisa branca e saias coloridas. Uma curiosidade prende-se com facto de, ao longo da sua carreira, sempre ter feito questão de ler todas as reviews sobre as suas coleções.  Entre os prémios mais importantes que recebeu destacam-se a Gold Medal for Merit in the Fine Arts atribuída pelo rei Juan Carlos I (2002), o Geoffrey Beene Lifetime Achievement Award (2008) e o CFDA Founder’s Award (2018).

Apesar de a sua imagem ser indissociável da famosa camisa branca e vestidos compridos, a estilista diz que gosta de variar de roupa quando não está a trabalhar ou em eventos. "Não estou sempre de camisa branca. As pessoas acham que vivo num vestido de gala ou numa camisa branca. Elas acham mesmo que uso um vestido de gala para passear pela Madison Avenue? Peço desculpa. E uso uma camisa branca quando me apetece", disse em março de 2015 à revista Harper’s Bazaar. Independentemente do que os outros possam achar ou dizer sobre si, Carolina Herrera põe sempre em prática esta máxima: manter-se fiel ao seu estilo, vestir-se para si própria e nunca para agradar os outros.