A pedra é a grande senhora no Largo de Camões, praça principal de Ponte de Lima, com vista sobranceira ao rio e à milenar Ponte Romana, mandada construir pelo imperador Augusto no século I.

Amanda Lista Rey, médica galega cheia de vida nos seus 37 anos, chega ao encontro iluminando o largo com o seu sorriso. Veio para a vila por amor, em 2010, conta. «Tinha conhecido, dois anos antes, o meu marido e decidi mudar de vida». De sorriso enorme, nos lábios e nos olhos, apresenta-nos o espaço, que agora é também o seu.

«O Largo de Camões é o sítio principal das Feiras Novas, onde se coloca o coreto. É aqui que começam as festas no sábado com os bombos que vêm das freguesias. Vêm centenas tocar, vê-se as crianças pequenas pelas ruas com os bombos…É um momento muito emocionante».

As Feiras Novas trazem à vila milhares de pessoas no segundo fim de semana de setembro e são o motivo da nossa visita. De manhã todas as esplanadas do largo estão abertas, para receber um sol generoso. Corre uma brisa suave, vinda do rio. A tranquilidade e a música, que chega de grandes colunas, estrategicamente colocadas, falam de uma vida suave e alegre nesta terra. Com tempo apenas para estar.

Amanda, apaixonada pelas festas de Ponte de Lima, encaminha-nos pelo casco antigo, para a Mercearia da Vila, ponto importante da história das Feiras. «Fui eu que criei em 1999 a Matilde, que se tornou um símbolo da festa», conta-nos o anfitrião, Rodrigo Melo, visivelmente orgulhoso.

A feira e a religiosidade

A boneca, também conhecida como Maria da Ponte, representa a mulher minhota, com os seus enormes olhos negros. Pequenas bolas em volta do cabelo apanhado numa poupa representam Nossa Senhora das Dores, padroeira da festa. «Tem um vestido grande, vermelho, com uma série de desenhos, relacionados com a quantidade de pessoas que vêm às Feiras Novas. É um ícone», entusiasma-se Amanda. Ela conhece bem a história desta celebração antiga, cuja fama vai além-fronteiras. «Ponte de Lima sempre teve uma feira», começa a contar. «Era uma feira onde se vendiam coisas, havia uma feira de gado… Na época de Dona Teresa, resolveram fazer uma feira franca, sem nenhum tipo de impostos. E isso atraiu muito mais pessoas».

As Feiras Novas ganharam o nome em oposição às antigas. Começaram por ser apenas feiras para vender e trocar coisas. Nesses tempos, juntavam-se muitos comerciantes na vila, ponto de passagem para a Galiza. As celebrações ganharam contexto religioso e estenderam-se por mais um dia, segunda-feira. «Começou a fazer-se a procissão da Nossa Senhora das Dores. Isso fez com que as pessoas do meio rural começassem a vir. Era algo novo. As crianças iam todas vestidas, estavam figuradas».

Ao som das castanholas

O cortejo etnográfico foi outra novidade interessante, com os habitantes a representar o modo de vida das suas freguesias. «Vêm vestidos com as roupas típicas de lá e representam as actividades normais de cada freguesia. É muito engraçado».

Hoje, garante a cicerone, «as Feiras Novas são festas grandiosas». Da tradicional mercearia, que manteve o balcão e os armários da época, saímos para calcorrear o casco histórico. Percorremos as antigas ruas empedradas, enquanto Amanda, com uma leveza contagiante, nos fala do seu momento preferido nas Feiras Novas, quando as ruas se enchem de pessoas a tocar concertinas. «Gosto muito de me introduzir no meio dessas pessoas que não conheço e aprender a dançar, tentar tocar castanholas. Nesse dia, parece que nos conhecemos todos».

Numa noite mais animada, a médica do Hospital Conde de Bertiandos chegou mesmo a comprar castanholas e passou a noite a tocar: «Já tinha bebido um par de cervejas, tenho de dizer a verdade. Então cheguei a um ponto em que me apercebi de que conseguia tocar castanholas muito bem. Só que no dia a seguir, tentei tocar castanholas mas já não sabia…».

No domingo, é dia de cortejo histórico e todos garantem lugar junto ao rio logo pela manhã. Outro ponto obrigatório é a chamada rampinha, onde se juntam centenas de jovens à noite a ouvir música e a beber. «É uma festa tremenda e eu como espanhola estou habituada a festas. Os meus amigos, quando vêm, dizem o mesmo. Nunca viram uma festa como esta».

Não é só nas Feiras Novas. Amanda adora viver aqui todo o ano. Corre na ecovia e descansa na Avenida dos Plátanos. Do outro lado do rio, gosta dos jardins, onde se faz um festival em Maio. Mas o concelho é também dono de uma biodiversidade incrível. E é nas Lagoas de Bertiandos, zona húmida com protecção especial, que passamos o dia seguinte. Verde e mais verde. Ar puro. Vida. Como a que habita Amanda. E se sente sobre a pedra iluminada pelo sol, a senhora da vila de Ponte de Lima.​

Texto de Sónia Balasteiro

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