Faustino Lopes, de 36 anos, trocou em 2017 o trabalho nas obras em Bafatá, Guiné-Bissau, para viver da paixão pela pintura, juntamente com o irmão, em Santa Maria, a cidade turística do Sal. Com a pandemia a dar tréguas em Cabo Verde, voltou agora a expor as dezenas de quadros que foi acumulando, junto ao calçadão da praia, esperando por dias melhores.
“Antes da covid-19 conseguia viver da pintura. Depois, sem os turistas para comprar os nossos quadros, vivemos com dificuldade”, começa por contar, à conversa com a Lusa enquanto espreita a passagem de turistas, coisa ainda rara pelo Sal.
Faustino aventurou-se nas artes plásticas ainda na Guiné-Bissau, mas foi no Sal que deu o salto, com quadros inspirados em paisagens, personagens ou simplesmente abstratos, que cuidadosamente espalha pela rua, para cativar os turistas, tal como fazia antes da pandemia.
“Os turistas gostam e levam muito. Agora menos, porque não há turistas. Mas antes da covid-19 estava bom”, reconhece.
Quase 820 mil turistas visitaram Cabo Verde em 2019, cerca de metade com destino ao Sal, à procura do sol e da praia da ilha mais turística de um país cujo Produto Interno Bruto (PIB) depende em 25% do turismo.
Para Faustino, que regularmente enviava as poupanças para a família em Bafatá, tudo mudou em março de 2020, quando Cabo Verde encerrou as fronteiras, acabando-se os turistas a passear por Santa Maria. No Sal, o primeiro avião comercial voltaria a aterrar apenas em dezembro, seguindo-se turistas portugueses e polacos, ainda insuficientes.
“Foram oito meses sem vender um quadro. Vivo com alguns fundos no banco, pouco a pouco fui tirando tudo”, desabafa.
Para já vai dedicando dois dias por semana à venda de quadros na rua, até porque já “começaram a aparecer alguns turistas”.
“Acredito que tudo vai voltar e ficar melhor”, atira.
Aos 43 anos, Samba Sou é um veterano a vender em Santa Maria o artesanato que trabalha, em madeira, com as próprias mãos e, claro, inspirado nas tradições africanas. Deixou o Senegal em 2006 para trabalhar no Sal, mas 2020 foi um ano “para esquecer”.
“Foi muito difícil. Aquela doença do coronavírus estragou tudo no mundo e aqui também, porque a ilha do Sal vive do sol e do turista”, explica.
Há um ano sem conseguir visitar a família no Senegal, Samba conta que a pandemia levou à inversão dos papéis. Hoje é ele a receber ajuda da família, à distância, além do apoio social das autoridades do Sal.
“Em nove meses não vendi nada, nove meses sem fazer negócio. Mas há gente em Cabo Verde que ajuda e eles [família] também mandam dinheiro para mim”, explica, à conversa com a Lusa, depois de preparar a pequena barraca que montou em Santa Maria para chamar a atenção dos turistas, polacos e portugueses, que por estes dias fazem férias no Sal.
Os cidadãos da Guiné-Bissau e do Senegal representam precisamente as duas maiores comunidades de imigrantes em Cabo Verde, trabalhando na construção civil e hotelaria, sendo igualmente as mais impactadas, além dos cabo-verdianos, pela crise económica decorrente da pandemia de covid-19.
Samba Sou admite que “agora está a começar” o movimento de turistas no Sal, apesar de a maioria dos hotéis, que garantem 15.000 camas para uma população residente de 35.000 pessoas, permanecerem fechados.
“Pouco a pouco, mas tem de aparecer mais. Vai ficar melhor”, diz Samba Sou, que embora tenha esgotado as poupanças garante que voltar a Senegal não está em cima da mesa.
“Voltar sim, mas não é para já. Os dias vão ser melhores aqui”, assume.
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