As camélias, muito apreciadas pelos portugueses, pertencem à família Theaceae, das Teáceas ou das Cameliáceas, e, dentro desta, ao género Camellia. O género Camellia compreende cerca de 300 espécies, de que são mais representativas a planta do chá ou chazeiro (Camellia sinensis) e as espécies ornamentais (Camellia japonica, Camellia sasanqua e Camellia reticulata e, em menor grau de interesse, a Camellia saluenensis, a Camellia chrysantha e a Camellia oleifera).
A par dessas, existem outras espécies utilizadas na obtenção de um número cada vez maior de híbridos interespecíficos. A Camellia japonica, (tsubaki em japonês, palavra que significa árvore de folhas luzidias) e a Camellia sasanqua (sazanka, em japonês) deram origem à maior parte das variedades ornamentais que existem atualmente. O género Camellia caracteriza-se por incluir espécies arbustivas ou arbóreas de porte médio, de folhas alternas, coriáceas e escuras.
Lustrosas, exibem pecíolos curtos, flores com cálice e corola pentâmeros, espiralados, sendo as pétalas um pouco coalescentes na base. As cores das flores das camélias podem variar muito e existe uma explicação para isso. As flores, de acordo com a variedade cultivada, apresentam diversas cores ou tonalidades. Podem ser brancas, vermelhas, rosadas, matizadas, violáceas ou amarelas, variando a sua dimensão, em média, entre menos de cinco centímetros até mais de 12,5 centímetros de diâmetro.
Por vezes, uma mesma cameleira pode exibir flores com tonalidades completamente diferentes. Não é tão raro quanto isso, apesar de não ser essa a norma. Pode, por exemplo, apresentar uns exemplares brancos e outros vermelhos ou rosados e, ainda, flores listadas, estriadas, salpicadas, rajadas, marmoreadas ou matizadas, como por vezes sucede. Apesar de não serem as mais tradicionais nem as mais comuns, podem ser observadas em jardins espalhados pelo mundo.
O porquê da variação das flores das camélias
Duas razões básicas justificam o fenómeno de variação nas flores das camélias. Uma variação genética e uma infeção por vírus. A variação genética está inscrita nos próprios genes da planta e é traduzida pelo aparecimento de manchas, de estrias, por um picotado ou por mudança da cor nas pétalas. A infeção por vírus ocasiona, além disso, transtornos no vigor da planta. Os matizados daí resultantes têm proporcionado variedades premiadas, como a camélia japónica Ville de Nantes.
Existem também novas camélias que foram originadas por mutações espontâneas, com influência na cor ou na forma, mediante mecanismos difíceis de explicar que se relacionam com a própria evolução da espécie. Inclusivamente, na própria planta, podem coexistir ramos com flores de formas e cores distintas. Estes ramos mutantes são designados por sports e é possível obter, por vezes, a partir deles, por via vegetativa (enxertia), uma nova variedade cultivada.
O recurso a esse processo tem permitido obter novas variedades de plantas com características perfeitamente fixadas. Dentro do género Camellia, existem atualmente identificadas cerca de três centenas de espécies, as quais têm vindo a ser submetidas a contínuas hibridações, naturais ou induzidas, ao longo dos anos. No género Camellia, o número de cromossomas próprios é de 30, sendo 15 o número básico de cromossomas (n) nos gâmetas ou células reprodutoras.
Estas células sexuais, masculinas e femininas, que apresentam apenas um conjunto de cromossomas (n), são designadas por haploides. Esses gâmetas têm como origem células somáticas (2n) que foram submetidas a um processo denominado gametogénese, onde normalmente ocorre uma importante divisão celular, denominada meiose ou redução cromossómica (meiose I e meiose II), através do qual uma célula somática (2n), ao ser transformada numa célula sexual, origina quatro células haploides (n), reduzindo a metade o número de cromossomas próprios de uma espécie.
Daí que, mediante a sua união com uma outra célula sexual, acabe por surgir um novo ser (2n). No reino vegetal, este mecanismo nem sempre funciona desta maneira, apesar desta tender a ser por norma a regra. Por vezes, não se dá essa redução cromossómica (gâmetas não reduzidos), surgindo então os indivíduos poliploides (xn), os quais possuem mais do que dois conjuntos de cromossomas (genomas), o que constitui um novo mecanismo denominado poliploidia.
A poliploidia, a existência de mais de dois genomas no mesmo núcleo, de ocorrência comum, é considerada um dos processos evolutivos mais marcantes na origem e na evolução das plantas silvestres e também das variedades botânicas que têm vindo a ser cultivadas nos últimos anos. Cerca de 40% das espécies vegetais cultivadas são poliploides, tendo surgido através de gâmetas não reduzidos ou através do cruzamento de indivíduos de espécies diferentes.
Uma vez que a maioria das espécies é autoincompatível, a natureza recorre à polinização cruzada, daí que ocorram espontaneamente formas híbridas triploides, tetraploides, pentaploides, hexaploides, heptaploides e octaploides. As formas mais comuns em camélias são as diploides e triploides. O conhecimento destes mecanismos em plantas cultivadas tem levado investigadores a induzir a poliploidia no género com o recurso a produtos químicos específicos, como a colchicina.
Essa situação verifica-se porque, geralmente, as espécies poliploides são maiores e mais produtivas. Estes aspetos são relevantes e as técnicas têm sido utilizadas com sucesso, por exemplo, na obtenção de plantas de chá com folhas de maiores dimensões (para se aumentarem os níveis de produção por hectare), nas camélias ornamentais (para se conseguir um aumento do tamanho da flor) e nas camélias oleíferas (na tentativa de obter um acréscimo na produção de óleo).
Texto: Jorge Garrido (engenheiro agrónomo)
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