Ao longo de 33 anos, o prestigiado ‘The Presidents Club’ tinha por hábito organizar um jantar com todos os membros do clube com o objetivo de angariar fundos para instituições de caridade. Realizado no maior dos secretismos, nunca se soube ao certo no que consistia a festa de black tie exclusiva para homens.
Tudo mudou na semana passada, quando o Financial Times publicou uma investigação jornalística sobre os bastidores daquele que, durante décadas, foi considerado um marco na agenda da alta sociedade londrina.
No passado dia 18 de janeiro, 360 figuras ilustres e influentes do mundo da política, da alta finança e do entretenimento encontraram-se neste evento, a decorrer no The Dorchester Hotel, em Mayfair, que tinha como foco principal um leilão de caridade cujos fundos angariados revertiam a favor do Great Ormond Street Hospital. Mas este não era um leilão qualquer: um almoço com o secretário dos Assuntos Externos Boris Johnson e tomar chá com o governador do Banco de Inglaterra Mark Carney eram apenas alguns dos “prémios de prestígio” a serem licitados pelos presentes.
Philip Green, do grupo Arcadia, Peter Jones, estrela do programa Dragons’ Den, Makram Azar, do Barclays, Nadhim Zahawi, ministro das famílias e crianças e Michael Sherwood, do Goldman Sachs, eram alguns dos nomes que constavam na lista de convidados do ‘Presidents Club Charity Dinner’ que tinha como patronos o antigo líder da Fórmula 1 Bernie Ecclestone e o apresentador televisivo Vernon Kay.
Para o efeito foram contratadas 130 hospedeiras “altas, magras e bonitas.” Era este o critério de seleção tido em conta pela agência responsável pela contratação das jovens que, anualmente, marcavam presença neste evento que, ao longo dos anos arrecadou 22 milhões de euros para caridade. Determinada a descobrir o que se passava, uma jornalista do Financial Times, com o apoio de duas hospedeiras, decidiu infiltrar-se na 33º edição do ‘Presidents Club Charity Dinner’.
Uma noite de gala cheia de regras e restrições
Foi acordado um valor de 170 euros para cada uma das hospedeiras contratadas para a festa, evento esse que começava por volta das 20h e se prolongava por seis horas. “Algumas raparigas adoram, e para outras é o pior trabalho do mundo e nunca mais vão voltar a fazê-lo… Têm de aturar homens irritantes e se conseguirem fazê-lo não há problema”, disse Caroline Dandridge, fundadora da agência, a uma das hospedeiras. Grande parte são estudantes ou aspirantes a modelo e atriz que vêem neste tipo de trabalhos uma oportunidade para ganhar algum dinheiro extra.
No final da noite, o táxi de regresso a casa era pago pela Artiste, agência especializada neste tipo de serviços, e que dizia a todas as jovens que "seria necessário ficaram até às 2h da manhã". Apesar de na altura da contratação receberem um briefing sobre o evento só para homens, muitas delas não tinham noção do que iam encontrar e das regras que tinham de cumprir.
Para além de não terem acesso ao telemóvel ao longo da noite, as 130 jovens contratadas tinham de cumprir à risca o dress code imposto pela agência onde sexy era a palavra de ordem. Roupas reduzidas, lingerie a condizer e saltos altos eram mandatórios, na cor preta. À chegada do The Dorchester Hotel eram obrigadas a assinar um acordo de confidencialidade que as proibia de falar sobre o evento que, este ano, foi apresentado pelo humorista David Walliams. Para além de não terem tempo de ler na íntegra o acordo de cinco páginas, nenhuma das jovens teve acesso a uma cópia do mesmo.
Uma noite de apalpões, comentários lascivos e propostas indecentes
De acordo com a jornalista Madison Marriage, todos os membros do ‘The Presidents Club’ tinham acesso a um catálogo onde constavam os artigos que iam a leilão nessa noite. No início, as hospedeiras desfilavam pelo palco do salão como forma de se apresentarem aos homens presentes sendo, de seguida, distribuídas pelas diversas mesas. O seu objetivo era claro: entreter os convidados.
“Um grande número de homens ficava de pé com as hospedeiras enquanto esperam pelas entradas de salmão fumado. Outros sentavam-se e insistiam em dar-lhes a mão. Não se percebia porque é que os homens, que estavam sentados à mesa com as hospedeiras junto a si, sentiam a necessidade de lhes dar a mão. […] Para muitos, isto era uma forma de as puxarem para o seu colo”, escreve a a jornalista sobre o jantar onde os comportamentos inapropriados abundavam.
Apalpões, comentários lascivos, atos exibicionistas e propostas de teor sexual foram alguns dos comportamentos a que muitas das hospedeiras estiveram expostas ao longo da festa e que deixou chocadas algumas das novatas.
“Nunca tinha feito isto na minha vida e não o voltarei a fazer. É assustador”, referiu uma jovem de 19 anos sobre o facto de um homem, na casa dos 70, lhe ter perguntado se era prostituta.
De forma a assegurar-se de que as hospedeiras desempenhavam bem o seu papel, a agência de Caroline Dandridge colocou uma equipa no terreno que observava todos os movimentos das jovens. Foram ainda instalados sistemas de vigilância que permitiam à Artiste saber quem passava demasiado tempo na casa de banho.
O jantar, onde foram arrecadados dois milhões de euros, era seguido de uma after party realizada numa sala mais pequena do The Dorchester Hotel onde as propostas indecentes se repetiam. “Quero que bebas este copo, tires as cuecas e dances em cima daquela mesa”, disse um dos convidados a uma das hospedeiras.
As reações à investigação, que apanhou de surpresa muitos dos intervenientes, não se fizeram esperar. “O The Presidents Club organizou recentemente o seu jantar anual, angariando diversos milhões de libras para crianças desfavorecidas. A organização está chocada face às alegacões de mau comportamento descrito pelos repórteres do Financial Times. Comportamentos desse tipo são inaceitáveis. As alegacões serão investigadas prontamente e serão tomadas as ações necessárias” disse em comunicado membro do clube que vai ser desmantelado.
O The Dorchester Hotel, que ao longo dos anos foi palco do evento, afirmou em comunicado “não ter conhecimento de quaisquer alegações” assim como a agência Artiste que deixou claro nunca ter recebido queixas que indicassem a existência da prática de assédio sexual.
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