
O nautilus, também conhecido como "fóssil vivo", é um molusco marinho da família Nautilidae, facilmente reconhecível pela sua concha espiralada e ornamentada, que parece saída de uma escultura natural. Mas, por trás da sua beleza hipnotizante esconde-se uma criatura resiliente, que sobreviveu a extinções em massa e guarda segredos evolutivos com mais de 500 milhões de anos.
Trata-se de um dos poucos organismos atuais que pertencem ao grupo dos cefalópodes primitivos, distinguindo-se dos seus primos modernos — como as lulas e os polvos — por manterem uma concha externa. Uma raridade viva, dir-se-ia. Em termos evolutivos, o nautilus pouco mudou desde o Período Cambriano, tendo sobrevivido à extinção dos dinossauros, ao impacto de meteoritos e às mudanças climáticas drásticas do passado geológico.
Um engenheiro natural
Ao contrário dos seus parentes mais modernos, como as lulas e os polvos, o nautilus conserva uma concha externa rígida. Esta estrutura não é apenas decorativa: é uma verdadeira obra-prima da engenharia natural, composta por várias câmaras internas. À medida que o animal cresce, vai selando as câmaras anteriores e enchendo-as com gases para controlar a sua flutuabilidade — um princípio semelhante ao de um submarino.
Este mecanismo, denominado câmara de sifúnculo, permite ao animal mover-se verticalmente na coluna de água com grande eficiência energética. O sifúnculo, um tubo que atravessa todas as câmaras da concha, regula os níveis de gás e líquido para ajustar a densidade do animal. Essa adaptação oferece ao nautilus uma vantagem evolutiva única: consegue viver a grandes profundidades sem sofrer colapsos estruturais, ao contrário de muitas outras espécies.
Cada concha é uma pequena maravilha matemática — tão perfeita que parece obedecer à famosa proporção áurea que tanto fascina artistas e cientistas. No século III a.C., o filósofo grego Arquimedes já estudava formas semelhantes, e no século XVI, navegadores portugueses colecionavam conchas de nautilus como símbolo de conhecimento e prestígio durante as suas viagens pelo Índico e Pacífico.
Estas conchas, por vezes incrustadas em prata ou ouro, eram transformadas em taças ornamentais na Europa Renascentista, e representavam o exotismo dos territórios ultramarinos. Aliás, a sua presença em gabinetes de curiosidades (os antecessores dos museus) reforçava o fascínio europeu por formas naturais de perfeição.

Uma sobrevivência discreta
Os nautilus habitam águas profundas dos oceanos Índico e Pacífico ocidental, entre os 100 e os 800 metros de profundidade, sobretudo em torno da Indonésia, Filipinas, Papua-Nova Guiné e norte da Austrália. São animais de hábitos noturnos e movem-se lentamente, impulsionados por jatos de água.
De dia, mantêm-se nas zonas mais profundas, longe de predadores, e à noite sobem para zonas mais rasas em busca de alimento, como pequenos crustáceos, moluscos e matéria orgânica em decomposição. A sua dieta é modesta, mas eficaz, e o seu olfato altamente desenvolvido compensa a fraca visão, permitindo-lhes localizar presas enterradas no fundo marinho.
Ao contrário dos seus parentes cefalópodes mais ágeis, o nautilus evolui muito lentamente. A sua esperança de vida pode ultrapassar os 20 anos — uma raridade no grupo. E enquanto as lulas e os polvos têm cérebros altamente desenvolvidos e comportamentos complexos, o nautilus mantém uma organização mais simples, com um sistema nervoso primitivo.
Apesar disso, alguns estudos recentes revelaram que os nautilus possuem boa memória de longo prazo, sendo capazes de aprender com estímulos visuais e associar recompensas alimentares a padrões específicos, um feito surpreendente para um animal com um cérebro tão rudimentar. Esta descoberta abre portas para novas investigações sobre os primórdios da inteligência animal.
Um futuro incerto
“A beleza destas criaturas tem sido também a sua maldição. A concha do nautilus, altamente valorizada no comércio internacional de objetos decorativos e joias, levou à sua captura intensiva nas últimas décadas.” Estudos revelam um declínio drástico das populações em algumas regiões, levando à sua inclusão no Apêndice II da CITES (Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas) desde 2017.

Em certos locais das Filipinas, as populações de nautilus diminuíram mais de 80% em apenas 15 anos. Sem políticas de conservação eficazes, e dada a lentidão com que se reproduzem (atingem a maturidade sexual só por volta dos 12 a 15 anos), o risco de colapso populacional é elevado. O aquecimento global e a acidificação dos oceanos afetam também a capacidade de formar conchas resistentes, comprometendo a sobrevivência dos juvenis.
Além da CITES, organismos como o NOAA (EUA) e a IUCN começaram recentemente a estudar com mais atenção as necessidades de proteção do nautilus, promovendo áreas marinhas protegidas e limitando as quotas de recolha.
Um legado cultural e simbólico
O nautilus inspirou desde Leonardo da Vinci ao escritor gaulês Júlio Verne, que o imortalizou como nome do submarino capitaneado por Nemo na obra Vinte Mil Léguas Submarinas. A sua forma perfeita continua a ser usada em logótipos, arte e arquitetura como metáfora da perfeição, do mistério e da resistência do mundo natural.
Na literatura, o nautilus é muitas vezes símbolo de viagens interiores, espirais do tempo e da vida. A concha que cresce por compartimentos evoca também a ideia de progresso e expansão pessoal — um tema recorrente em poesia e filosofia.
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