“Para identificarmos os verdadeiros génios, podemos começar por retirar a maioria dos atores, atrizes e artistas. Por mais talentosos que possam ser, aqueles que trabalham usando algo já formado por outrem não são génios. A criatividade e a criação são fundamentais, e é por isso que Kanye West, Lady Gaga e Beethoven, mas não Yo-Yo Ma, podem ser considerados génios. O mesmo acontece com os grandes atletas: por mais impressionantes que os recordistas Phelps e Federer possam ser, não ganham pontos de criatividade”. Em poucas palavras o norte-americano Craig Wright, autor do livro Os Traços Escondidos dos Génios (Temas e Debates), afasta da equação os “falsos positivos” no que toca ao génio.

O excerto aqui apresentado, retirado da introdução ao livro do professor emérito da cátedra de Música da Universidade de Yale, serve como porta de entrada para aquilo que o autor define como génio, como nos explica na conversa que aqui publicamos. Para Craig Wright, génio não se confunde com talento, tão pouco com fama ou com capacidades prodigiosas. O autor, nascido em 1944, no estado do Oklahoma, entrega-nos a fórmula do génio sob a forma de uma lista: “os 14 segredos das mentes brilhantes que mudaram o mundo”, como lemos no subtítulo ao livro. Não se trata de uma receita para formar génios, antes, como sublinha o investigador, um caminho para fazermos um “trabalho melhor na educação dos nossos filhos”, entre outras metas.

Na sua equação da genialidade, Wright inclui, entre outros elementos, a ética de trabalho, a resiliência, a originalidade e a imaginação infantil, a curiosidade, a obsessão, a descontração e a concentração. Exclui, contudo, muito daquilo que temos como uma manifestação de genialidade dos tempos que correm, nomeadamente a relação omnipresente entre a acumulação do “vil metal” e a manifestação do génio: “o dinheiro é o combustível do génio, mas não é o génio em si”, enfatiza o autor que, sobre o seu livro conclui: “irá obrigá-lo a pensar no rumo que dá à sua vida (…) distribui o seu tempo, vota em eleições democráticas e, mais importante ainda, em como ser criativo”.

Há no seu livro uma frase bela de Charles Baudelaire: “O génio não é mais do que a infância recuperada por vontade própria”. Quer explicar-nos porquê?

Sim. As crianças não conhecem limites. Nascemos como seres dotados de curiosidade. Pais protetores e a sociedade colocam geralmente barreiras frente aos impulsos criativos das crianças. Pablo Picasso sabia que as crianças nascem com esta imaginação criativa. Picasso foi ensinado desde tenra idade a pintar como um académico e isso funcionou contra a sua criatividade. Como ele disse certa vez: “Quando eu era jovem, podia pintar como Rafael, mas levei uma vida inteira para aprender a pintar como uma criança”.

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Leciona anualmente o “The Genius Course”. É uma oportunidade para fazer génios ou para revelar génios?

Não, é simplesmente uma oportunidade para os alunos olharem para dentro de si, refletirem sobre seus pontos fortes e fracos e tentarem alinhar o que lhes interessa na vida com seus pontos fortes. É também uma oportunidade para sugerir que não, e enfatizo este não, prestem muita atenção ao que os seus pais ou professores lhes dizem.

Atualmente banalizámos a palavra “génio”? Estamos a confundir talento com génio?

Isso é um bom ponto de discussão. Atualmente, temos o balcão Genius Bar nas Apple Store, referimo-nos a coberturas geniais para sobremesas, até os aspiradores têm um funcionamento genial e os exemplos continuam. Isso é banalizar a palavra. Em meu entender, é muito fácil definir ou identificar quem é um génio: um génio é alguém que muda o mundo, para o bem ou para o mal. Mas, como julgo dizer usando de precaução no meu livro, cada pessoa pode definir um génio como bem entender.

cérebro
cérebro créditos: Hugöl Hälpingston/Unsplash

Sim, mas no seu livro vai um pouco mais além na definição de génio. Quer detalhá-la?

De facto, no início do livro defino génio de forma mais completa. “Génio é uma pessoa com extraordinários poderes intelectuais cujas obras ou visões originais mudam a sociedade de uma forma significativa, para o bem ou para o mal, ao longo das culturas e ao longo do tempo”. Assim, se procura “pontuar” os génios, de certa forma classificando-os, diria que é alguém cuja influência é transversal a diferentes culturas, ainda perdura e afeta as nossas vidas quase diariamente, ao longo dos séculos. Dou-lhe três exemplos: William Shakespeare, Galileu Galilei e Marie Curie. Estes, sem dúvida, devem ser colocados no Hall of Genius.

No seu livro apresenta-nos os 14 segredos das mentes brilhantes. Quer revelar-nos alguns deles?

Sim. Eis algumas das características que considero comuns aos génios: A curiosidade; uma paixão duradoura; a capacidade de trabalhar de forma árdua; a autoconfiança, ou seja, não prestar muita atenção ao que os outros pensam; a capacidade de desenvolver uma rotina que alterne o pensamento relaxado e desfocado — é quando lhe ocorrem as melhores ideias — e o pensamento focado e executivo  — é quando esboça a sua nova invenção ou compõe uma nova musica — quando “obtém o produto fora da caixa”

O QI pode ser uma medida para a genialidade?

Um teste de QI é apenas uma medida de algumas das habilidades, verbais e quantitativas, envolvidas na realização de um determinado tipo de teste. Um teste de QI não mede a capacidade de uma pessoa para nenhum dos cinco traços de caráter que referi na resposta anterior.

Um prodígio pode não ser um génio?

Absolutamente, a maioria dos prodígios não são génios e nunca serão. Eles são simplesmente jovens capazes de imitar um determinado feito numa idade muito precoce. A maioria dos prodígios nunca cria nada, nunca muda o mundo.

Porque nos diz que o génio se revela com mais facilidade numa metrópole ou numa cidade universitária?

O génio tem a capacidade a que chamo de “pensamento combinativo”, ou seja, a capacidade de reunir coisas de campos ou áreas díspares que ninguém jamais combinou antes. Se se mudar para uma cidade grande ou uma universidade, especialmente uma com grande número de imigrantes, é provável que fique exposto a novas ideias que podem ser combinadas de formas até então inéditas. É assim que a inovação acontece.

Diz-nos que o génio muda a sociedade para o bem e para o mal. O génio tem sempre implícita a mudança?

Sem dúvida.

“A capacidade de os nossos filhos raciocinarem sobre a informação na internet resume-se a uma palavra: desoladora” – Michel Desmurget, neurocientista
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Quer dar-nos alguns exemplos de génios do presente?

Para o bem ou para o mal, para o melhor ou para o pior: Elon Musk, Jeff Bezos, Bill Gates, Lin Manuel Miranda, Paul McCartney, Yayoi Kusama, Vladimir Putin. Lamento incluir a listar apenas uma mulher. Ao omitir mais nomes, estou simplesmente a revelar a minha ignorância do mundo.

Uma vez que refere as mulheres. O mundo é mais fácil para um génio homem do que para um génio mulher?

Excelente pergunta. A minha resposta muito pobre à pergunta anterior, ou seja, a incapacidade de identificar mais génios femininos, sugere que sim. Neste âmbito, ainda não alcançamos um "terreno de jogo nivelado" na área de reconhecimento público de realizações humanas excecionais.

Naturalmente, não somos todos génios. Assim sendo, o que podemos aprender com o seu livro?

Como fazer um trabalho melhor na educação dos nossos filhos. Que as notas, as escolas de elite, a obediência às regras e a conformidade com as normas sociais podem ser a pior coisa que podemos encorajar nos jovens, pelo menos se quisermos que eles mudem o mundo.