Cá em casa temos um casal de periquitos cuja história já contei . Chamam-se Pipoca (ela) e Piu-Piu (ele). A Pipoca é a segunda companheira do Piu-Piu, já que a primeira
(chamemos-lhe Pipoca I), encontrada por mim no jardim, esgueirou-se por uma porta indevidamente aberta da gaiola e desapareceu sem deixar rasto.

Fui comprar a Pipoca II porque achei que o Piu-Piu ia morrer de tristeza e o critério de escolha da nova companheira foi o de ser o mais parecida possível com a primeira, isto é, de cor amarelo forte. A nova Pipoca devia ser muito novinha quando a trouxe para casa, porque passou semanas a um canto da gaiola, sem se mexer, cheia de medo e com um ar muito infeliz.

Mas lá se foi habituando, e, passados uns tempos, já esvoaçava, pipilando, aparentemente contente. A minha estratégia funcionou em pleno porque o Piu-Piu esqueceu o desgosto e refez a sua vida ao lado da nova companheira.

Quando os vi de namoro pegado, comprei um ninho, desses de madeira com um buraquinho redondo a servir de entrada. Durante meses, o ninho foi ostensivamente ignorado, servindo apenas de poiso para os dois passarinhos descansarem dos poleiros.

Até que um dia, por alturas do Outono, o comportamento da Pipoca mudou. Entrava no ninho, ficava lá dentro, ouviam-se umas bicadas na madeira e, passado um bocadinho lá vinha outra vez cá para fora. Arranjou uma nova brincadeira, pensei eu.

Este ritual de curtas visitas durou todo o Inverno até que, em Fevereiro, quando regressámos de uma viagem, verifiquei que a Pipoca estava recolhida dentro do ninho e só saía para fazer as suas necessidades e exercitar as asas.

«Olá, aqui há periquito», pensei eu cheia de esperança. A gaiola da Pipoca e do Piu-Piu está instalada num compartimento da casa anexo à cozinha, onde todos os dias tomamos o pequeno almoço. É um óptimo posto de observação.

Durante um mês assistimos todas as manhãs a um ritual: a Pipoca saía do ninho, espreguiçava as asas, ia para um dos poleiros de baixo (sempre o mesmo!) e punha-se a jeito para o Piu-Piu cumprir a sua missão na terra e chegar a vias de facto.

Devo dizer que é um acto enternecedor, porque, macho e fêmea, dão-se bicadinhas e olham um para o outro, enquanto se processa a inseminação. Fui a correr para a Internet estudar sites de periquitos e mandei vir livros da Amazon.com.

Veja na página seguinte: O que sucedeu após o choco dos ovos

Aprendi que um ovo demora 18 a 20 dias a chocar e que o bebé sai cá para fora de olhos fechados e sem penas.

Se tudo correr bem e for bem alimentado pelos pais, ao fim de cerca de quatro semanas, só quando já tem penas, é que sai fora do ninho.

As ninhadas podem ser várias porque uma periquita demora apenas 2 a 3 dias a pôr ovos depois de um acasalamento bem sucedido. Como não se deve mexer no ninho porque a mãe pode rejeitar os filhos, evitei espreitar lá para dentro e fui esperando até que, na semana passada, comecei a ouvir um piarzinho muito fininho.

Não resisti. Abri a tampa do ninho perante uma Pipoca em pios de fúria de protesto pela perturbação. Uuufff! Não se tratava de um devaneio histérico de fêmea. Havia mesmo periquito, não um, mas dois, mais 3 ovos por abrir.

Cá em casa está tudo em polvorosa: família, amigos e colaboradores vêm em excursão observar o Piu-Piu a alimentar a Pipoca através do buraco do ninho e certificarem-se de que é mesmo verdade, que dois periquitos em cativeiro e a viver na proximidade de humanos e de 4 cães, estão a criar.

Eu desdobro-me em leituras obsessivas para obter informações: reforcei a dieta com produtos frescos, aumentei as vitaminas, comprei blocos de minerais, novos ovos de choco, dou-lhes água do Luso...

À excitação sucedeu a ansiedade. Que, se calhar, os pais vão rejeitá-los, que a comida pode estar contaminada... Eu sei lá, as criaturas são tão frágeis quando nascem, que é praticamente impossível sobreviverem, sobretudo em condições tão artificiais.

O ritual agora mudou. Já não há acasalamento e, enquanto a Pipoca está no ninho, o Piu-Piu está o dia inteiro a comer e a ir alimentá-la. Os piarzinhos são cada vez mais insistentes e a novidade é que o Piu-Piu também entra para dentro do ninho.

Meu Deus, como é possível uma família inteira, mais alguns ovos ainda por abrir, caberem num espaço tão pequeno! Não sei qual vai ser o desfecho desta história, mas, para já, é maravilhosa.

Texto: Vera Nobre da Costa