"Uma coisa é clara. Nós temos de lutar contra as alterações climáticas, mas temos também de proteger as plantas e os animais, com o ser humano como parte deste ecossistema e não como alguém que está acima", sublinhou Angela Merkel, em conferência de imprensa, depois de ter anunciado os vencedores do Prémio Gulbenkian para a Humanidade, atribuído a duas organizações intergovernamentais dedicadas a produzir conhecimento científico e apoiar os decisores políticos no combate às alterações climáticas e à perda de biodiversidade.

A Plataforma Intergovernamental Ciência-Política sobre Biodiversidade e Serviços de Ecossistemas (IPBES) e o Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC) são as duas organizações que venceram a terceira edição do Prémio, no valor de um milhão de euros.

Angela Merkel, que é desde esta terceira edição a presidente do júri do prémio, sucedendo ao antigo Presidente da República, Jorge Sampaio, referiu ainda que as alterações climáticas e a perda da biodiversidade são duas crises simultâneas e relacionadas, cujo combate é “essencial para a sobrevivência da humanidade”.

Destacando o trabalho das duas organizações e o seu contributo na tomada de decisão dos governos, Angela Merkel insistiu ainda que tanto o IPCC como a IPBES “estão a elaborar uma base científica para a sobrevivência da humanidade”.

“A informação científica ao longo dos anos tornou-se muito mais clara e mais confiável, mas infelizmente nunca houve boas notícias”, acrescentou, alertando que “os sinais são cada vez mais dramáticos”, tornando também mais o desafio para os decisores políticos e sociedade civil.

Angela Merkel disse ainda que só assumiu a presidência do júri em setembro, depois de os vencedores já terem sido escolhidos pelos restantes membros, adiantando que a escolha foi muito boa porque a informação científica deve estar na base das decisões políticas.

Pelo IPCC, o presidente Hoesung Lee agradeceu a distinção “atribuída numa altura crítica”, argumentando que “os impactos e riscos (das alterações climáticas) são cada vez mais complexos e difíceis de gerir”, e os relatórios que a organização tem produzido comprovam-no.

“Qualquer atraso ou fracasso em organizar uma ação climática global, concertada e coletiva só irá diminuir o período de tempo para garantir o futuro”, alertou, sublinhando também que “a ciência é um dos instrumentos mais importantes” nesse combate e que o Prémio Gulbenkian para a Humanidade, que irá ajudar a financiar as bolsas do IPCC, representa um “importante reconhecimento e incentivo”.

Em declarações aos jornalistas, Hoesung Lee comentou também o impacto da guerra na Ucrânia no combate às alterações climáticas, afirmando que os objetivos no âmbito do Acordo de Paris, designadamente o limite do aumento da temperatura média global, não foram alterados e, por isso, "se aumentarmos as emissões agora, vamos ter de as reduzir de forma muito mais rápida no futuro".

"É o que diz a ciência e é o que a natureza exige de nós, temos de fazer uma escolha", afirmou.

A secretária executiva do IPBES, Anne Larigauderie, afirmou que a atribuição do prémio é igualmente um reconhecimento da importância da biodiversidade, lembrando que, de acordo com um balanço feito em 2019, cerca de um milhão entre oito milhões de espécies de plantas e animais estão sob ameaça de extinção.

“Nunca antes os ecossistemas estiveram em tal nível de degradação e estiveram tanto em risco como agora e isso é devido à ação dos seres humanos”, disse, destacando também o potencial da natureza no combate às alterações climáticas, um dos motivos pelos quais o IPBES e o IPCC começaram a trabalhar em conjunto.

Questionada sobre a falta de uma resposta por parte dos governos que corresponda, de facto, à emergência climática, Anne Larigauderie sublinhou o papel da ciência, defendendo que o objetivo é que "com mais evidência, possamos acelerar a ação para resolver os problemas relacionados com a perda de diversidade e com as alterações climáticas".

O Prémio Gulbenkian para a Humanidade será entregue formalmente pela presidente do Júri, Angela Merkel, numa cerimónia que se realiza hoje a partir das 18:00 na Fundação Gulbenkian, em Lisboa.

No ano passado, o prémio foi entregue à "Global Covenant of Mayors for Climate & Energy", uma aliança constituída por mais de 10.600 cidades e governos locais de 140 países, depois de ter premiado, na primeira edição, a ativista sueca Greta Thunberg.