Depois de trabalhar em outras áreas relacionadas com o corpo e bem-estar - como o yoga, pilates -, como se tornou sexóloga?
Estudar sexologia pareceu-me o passo seguinte natural. Sempre me interessei por anatomia e fisiologia, assim como pela forma humana de manifestar sentimentos. Após anos a explorar práticas de cura somática - como yoga, pilates e várias formas de trabalho corporal -, decidi estudar de forma mais aprofundada a sexualidade, pois sempre senti que desempenha um papel importante em quem somos e em como nos comportamos. O meu trabalho com clientes individuais, quando estava focada na cura somática, enfatizava a importância da postura, do alinhamento, da respiração e do movimento. Foi através destas modalidades físicas que descobri o poder da polaridade, tanto no movimento como em relação à gravidade. Ao conhecer as práticas do tantra e da espiritualidade, fiquei especialmente fascinada com a relação entre a energia sexual e a nossa corporificação geral. Ao explorar o tantra, percebi que abraçar a nossa sensualidade pode ter um impacto profundo no nosso bem-estar geral. Esta descoberta levou-me a explorar a interseção entre a intimidade física e emocional, algo que despertou o meu interesse em seguir a carreira de sexóloga. Queria compreender como a expressão sexual podia ser integrada de forma holística na saúde e no bem-estar geral. Isto levou-me a estudar mais a ligação entre o sistema nervoso, as emoções e a sexualidade. Através dos meus estudos em sexologia, adquiri uma compreensão mais profunda da relação mente-corpo.
E hoje também é diretora de Educação na Satisfyer. Qual é o seu papel/missão?
Como Diretora de Educação da Satisfyer, o meu papel tem sido ajudar pessoas a compreender os benefícios e o papel da sexualidade nas nossas vidas. Também estou frequentemente em contacto com os média para oferecer ajuda em temas e tendências relacionados com saúde sexual. O prazer sexual é uma parte normal e saudável da vida e traz, igualmente, muitos benefícios para o nosso bem-estar físico e mental. Dito isto, a sexualidade tem sido, historicamente, um tema tabu na sociedade, muitas vezes rodeado de vergonha, sigilo e julgamento. O sentimento de vergonha tende a perpetuar uma desconexão entre o corpo e a mente e, em última análise, esgota a sexualidade. A falta de poder no domínio da sexualidade pode impedir indivíduos de se envolverem plenamente em muitas áreas da sua vida, quer seja na intimidade, no sentirem-se confortáveis na própria pele, ou a expressarem com confiança desejos e limites.
A nossa sexualidade é a base da nossa expressão e ajuda-nos a criar sinergia com quem somos, tanto enquanto seres primordiais como indivíduos únicos. Ao ignorarmos ou suprimirmos este nosso aspeto, não só limitamos o nosso potencial de realização física e emocional, como, em conjunto, limitamos o nosso potencial para brincar e cocriar intimidade com os outros. Ao eliminar o estigma relativo à sexualidade e ao realçar as vantagens únicas do bem-estar sexual, conseguimos fazer progressos significativos e posicionar os nossos produtos como ferramentas essenciais para o bem-estar e para o autocuidado. Mais recentemente, fiz uma parceria com a Satisfyer para desenvolver uma série distinta de meditação para o bem-estar sexual, as High Touch Meditations, disponíveis na nossa aplicação Satisfyer Connect. Estas visam ajudar os utilizadores a relaxar mais profundamente no seu prazer enquanto usam os seus Satisfyers. A marca destaca-se na categoria de bem-estar sexual com mais de 300 produtos, e a minha função é ajudar a compreender os benefícios e as aplicações específicas dos nossos diversos designs.
Ao concentrarmo-nos no bem-estar sexual, podemos melhorar os nossos relacionamentos, aumentar a nossa autoestima e aumentar a nossa qualidade de vida em geral
A Satisfyer promove o bem-estar sexual, mas o que significa este conceito e porque também importa?
O bem-estar sexual implica nutrir o bem-estar físico, mental e social relativo à sexualidade de alguém. Significa que não minimizamos as nossas necessidades sexuais e reservamos tempo para satisfazer os desejos de prazer e intimidade do nosso corpo. Quando priorizamos o bem-estar sexual, estamos a priorizá-lo como uma faceta holística da nossa saúde e felicidade geral. A sexualidade é muitas vezes um dos maiores recursos inexplorados que temos, mas devido aos estigmas que existem, este recurso é muitas vezes ignorado ou subutilizado. Ao concentrarmo-nos no bem-estar sexual, podemos melhorar os nossos relacionamentos, aumentar a nossa autoestima e aumentar a nossa qualidade de vida em geral. Quando reconhecemos e abordamos os nossos desejos e necessidades sexuais, preparamo-nos melhor para nos conectarmos com nós próprios e com os outros a um nível mais profundo. No fim de contas, aceitar a nossa sexualidade como uma parte fundamental do nosso bem-estar pode realmente ampliar a nossa experiência de vida.
Qual é o género que procura/compra mais produtos da Satisfyer?
Em geral, as mulheres tendem a ser as nossas principais consumidoras. No entanto, há uma tendência crescente de homens que também exploram o bem-estar sexual para o seu próprio prazer e descoberta. A pesquisa também mostra que os homens tendem a sentir-se mais confortáveis e abertos para explorar produtos de bem-estar sexual se os parceiros sugerirem. Provavelmente, acho que isso se deve à pressão que os homens muitas vezes sentem para ter um bom desempenho ou medo que têm de serem substituídos por um produto. Eu garanto sempre aos casais que os nossos produtos, por mais incríveis que sejam, nunca vão substituir o toque e a ligação humana. Podem, no entanto, aumentar a excitação e dar-lhe uma vantagem extra na satisfação do parceiro no quarto.
Quero que pensem neles como excelentes ferramentas para aumentar a experiência de prazer. Para além disto, a introdução de produtos de bem-estar sexual pode igualmente funcionar como um valioso quebra-gelo para casais que têm dificuldade em expressar desejos ou necessidades específicas. Em última análise, qualquer pessoa pode beneficiar da incorporação deste tipo de produtos na sua relação íntima, visto que podem melhorar a comunicação, a exploração e a satisfação em geral.
Acho que, em geral, os homens ainda sentem pressão em relação à sua performance, e as mulheres muitas vezes continuam a ter que corresponder a um padrão que exige que sejam simultaneamente uma deusa do sexo e uma Madonna pura
Visto que este mês se assinalou o Dia Internacional da Mulher, a Satisfyer está a promover uma campanha que procura apoiar e empoderar o sexo feminino. Na sua opinião, a sexualidade feminina continua a ser um tabu na sociedade?
Ainda existem muitos tabus e pressões sobre as mulheres relacionados com a sexualidade. Recebemos muitas mensagens confusas de pessoas de diferentes culturas, religiões e contextos familiares. Se relacionarmos isto com o facto de que a maioria de nós não tem uma educação sexual abrangente o que acontece é que, muitas vezes, acabamos por ter grande parte da nossa educação sexual a partir das expectativas irrealistas da pornografia. Acho que, em geral, os homens ainda sentem pressão em relação à sua performance, e as mulheres muitas vezes continuam a ter que corresponder a um padrão que exige que sejam simultaneamente uma deusa do sexo e uma Madonna pura. É um cisma que nos atormenta há algum tempo. Esta pressão pode levar a sentimentos de vergonha, culpa e inadequação ao explorar a sexualidade. Ironicamente, a sexualidade é a única área da vida na qual não era suporto termos de nos esforçar, mas não poderíamos estar mais longe da verdade, e penso que à medida que mais pessoas começarem a reconhecer que há sempre mais para aprender e descobrir, podemos começar a nivelar as disparidades de género.
E, quando se fala de sexualidade, muitas vezes olhamos para ela de uma forma muito simplista, como sendo preto ou branco. Algo que praticamos ou não. Que é bom ou mau. Como algo vergonhoso, ou que nos vergonha porque não conseguimos cumprir os nossos deveres sexuais de forma frequente com o nosso parceiro. Estas são apenas algumas das ideias opostas que, muitas vezes atrapalham, o nosso prazer. É essencial que exploremos estes aspetos com nuances, moldados tanto pelas nossas experiências pessoais como pelas normas culturais que nos foram incutidas desde a infância. E não são apenas as nossas opiniões sobre o sexo que inibem a nossa capacidade de desfrutar dele; são também as mensagens negativas que interiorizamos sobre os nossos corpos. É imperativo que as mulheres aprendam a amar os corpos em que estão, se quiserem experimentar maiores níveis de prazer no quarto. Felizmente, tem havido muito progresso no que diz respeito ao sexo feminino abraçar o seu prazer, mas certamente ainda existem muitos tabus que precisamos de superar.
Os produtos de bem-estar sexual podem contribuir para o empoderamento das mulheres e da sua saúde sexual?
As mulheres que têm acesso a ferramentas de prazer e se permitem a explorar os seus corpos conseguem ter um melhor controlo do seu próprio prazer, sem que isso dependa de um parceiro. Alguns grandes exemplos disto vêm de um estudo realizado em Portugal, publicado no Journal of Sex and Marital Therapy, que descobriu que não só a masturbação é comum entre o sexo feminino, como que aquelas que a praticam regularmente relatam maior satisfação nas suas vidas sexuais. Ficou claro que a masturbação pode aumentar a confiança sexual e a capacidade de comunicar desejos no quarto.
Por exemplo, as mulheres que utilizam produtos de bem-estar sexual acham mais fácil iniciar relações sexuais, têm mais fantasias sexuais e têm menos dificuldade com excitação e inibição. As que usam vibradores também têm maior probabilidade de participar em atividades de promoção de saúde, como exames ginecológicos regulares. Em último lugar, os vibradores trazem benefícios adicionais à saúde, como melhorar a saúde do pavimento pélvico, e são até recomendados, por alguns médicos, como auxiliares para quem deseja prevenir problemas de incontinência urinária ou como ferramentas para ajudar a curar cicatrizes após o parto. Em última análise, o seu valor transcende o mero prazer momentâneo. Desempenham um papel crucial na facilitação do envolvimento muscular, ativação nervosa e circulação sanguínea nos órgãos genitais, que são vitais para manter os tecidos saudáveis e otimizar a sua função. É por isso que podem ser úteis para mulheres em qualquer idade e fase de vida.
A sexualidade é a única área da vida na qual não era suporto termos de nos esforçar
Na sua opinião, o que é que ainda é preciso ser feito para que mais mulheres tenham uma saúde sexual positiva?
Em primeiro lugar, as mulheres precisam honrar as suas necessidades e desejos únicos. Cada mulher é diferente quando se trata de prazer, não só porque, em termos de anatomia, estamos ligadas de forma diferente, mas também porque as nossas mentes contribuem para o nosso desejo e prazer sexual. É importante que vejamos a nossa sexualidade como algo contínuo. Não é algo que começa e termina apenas no quarto. Começa com a nossa dieta, mentalidade, hábitos de sono, ciclo menstrual e outros aspetos que influenciam a nossa saúde e bem-estar sexual. Como mulheres, também somos sensíveis ao nosso ambiente e precisamos de reservar tempo para honrar os nossos corpos e dar-lhes o apoio de que necessitam para prosperar. Para além disto, é imperativo educarmos o sexo feminino sobre a complexidade única da anatomia sexual feminina.
Por exemplo, a glande do clitóris, que é geralmente considerada a zona erógena mais confiável para o orgasmo feminino, é, na verdade, apenas a ponta do iceberg quando se trata de prazer feminino. Existem muitas outras partes do clitóris que contribuem para a satisfação sexual que são internas e que podem ser atingidas de outras formas. Colmatar estas lacunas de compreensão pode ajudá-las a tornarem-se mais confiantes no prazer próprio e também lhes permitir partilhar melhor com os parceiros as suas necessidades para atingir o prazer. Por último, as mulheres precisam de colocar aos seus prestadores de cuidados de saúde as questões que têm em relação à sua saúde sexual. Penso que muitas ainda sentem que é embaraçoso fazer perguntas, mas os prestadores de cuidados de saúde estão lá para as apoiar, e quanto mais perguntas fizerem, melhor se poderão educar e abordar mais rapidamente os desafios de saúde sexual à medida que estes surgem.
E o que cada um de nós pode fazer para ajudar?
É importante que estejamos dispostos a envolver-nos com este tema, a falar abertamente com aqueles que nos são próximos e a continuar a abolir o estigma relacionado com o prazer. Quanto mais abertos pudermos ser sobre saúde e prazer sexual, também mais à vontade estarão os outros para discutirem estes tópicos.
É importante que vejamos a nossa sexualidade como algo contínuo. Não é algo que começa e termina apenas no quarto
Tendo em conta que este é o mês de celebrar a Mulher e lembrar as suas lutas, que mensagem gostaria de lhes deixar como sexóloga e Diretora de Educação da Satisfyer?
Gostaria que as mulheres soubessem que não precisam de ser perfeitas, uma deusa do sexo ou ter uma idade específica para poder explorar a sua sexualidade. Quero que saibam que o seu prazer é importante e que, ao explorá-lo, não só experimentarão maior saúde e bem-estar, mas também descobrirão aspetos sobre si mesmas que, de outra forma, seriam ignorados ou perdidos. O autocuidado sexual é uma mudança de paradigma nas mulheres que atendem às suas próprias necessidades e desejos, o que, em última análise, pode ajudá-las a estar mais presentes e alinhadas com os seus próprios corpos e emoções. Que comecem por acreditar que o seu corpo tem capacidade para ter prazer e, como um tesouro enterrado, requer curiosidade, exploração e cuidado para ser descoberto. Mas uma vez que o façam, começam a reconhecer o poder e o potencial que têm dentro de si para brilharem como um diamante, apesar das pressões da vida.
Comentários