Tomar decisões não é um processo fácil e muito menos linear. A maneira como se tende a tomar decisões ou a fazer julgamentos varia de pessoa para pessoa e de situação para situação. Associado a um perfil de personalidade específico, o tipo de raciocínio que cada um tende a usar em momentos de escolha ou julgamento contribui para esta diferença.
A investigação verificou que existem dois sistemas de raciocínio associados ao processo de tomada de decisão ou julgamento: Tipo 1 (Intuitivo) e Tipo 2 (Deliberado). Estes diferem quanto à sua velocidade, exigência cognitiva (ao nível da atenção, perceção, interpretação e recuperação da informação) e à profundidade com que a informação é processada:
Tipo 1 - intuitivo, rápido, automático e não consciente;
Tipo 2- deliberado, lento, analítico, consciente e cognitivamente sofisticado.
São variadas as teorias e estudos que têm vindo a tentar explicar a interação entre estes dois sistemas de processamento. De um modo geral, partilham da crença que processos de Tipo 1 (intuitivos) dão origem a representações das situações que têm por base informação anteriormente aprendida através da experiência, que podem ou não ser analisadas de forma mais aprofundada e analítica por processos de Tipo 2 (deliberados) - parar, analisar, procurar mais informação, questionar tais representações.
Por exemplo, quando se identifica uma determinada característica em alguém que estamos a conhecer pela primeira vez, tendemos a associar esta última a um tipo de personalidade que anteriormente, na nossa experiência de relações, verificámos que a continha. Ao dar-nos uma sensação de maior controlo sobre a situação desconhecida, esta associação automática e algo inconsciente ajudar-nos-á a responder de forma rápida e mais segura naquela interação. No entanto, imaginemos que tal característica se inclui noutros tipos de personalidade ou que as respostas que resultaram nas experiências anteriores nesta nova interação não ressoam. Será que não devemos testar a validade e força da nossa impressão ou das respostas que damos por garantidas que são as mais adequadas?
Dada a rapidez com que se tem de responder às variadas situações do dia-a-dia é fácil compreender o uso mais frequente de um raciocínio exclusivamente intuitivo. Ter um conjunto de corta-matos mentais (exemplo, “Se situação X, Então Y”) que ajudam a identificar padrões e ativar respostas automáticas é imprescindível ao nível da gestão de tempo, do cansaço mental e físico, da certeza e de outros fatores que poderiam ficar comprometidos se em cada decisão que se tomasse fosse necessário parar, organizar, analisar com detalhe toda a informação e colocar em causa as associações automáticas fundamentadas pelos nossos conhecimentos anteriores.
No entanto, é importante ter consciência que decisões ou julgamentos feitos exclusiva e permanentemente por intermédio da intuição, podem ser em si enviesados e não refletir exatamente a realidade. Por enviesamento entende-se a tendência para impor as crenças, representações e associações previamente aprendidas à realidade. Por exemplo, face a um conjunto de informação apresentado numa situação existe a tendência para selecionar e recordar apenas aquela que confirma as nossas crenças e que coincide com as regras de reconhecimento da realidade, negligenciando por outro lado outra que poderia gerar uma conclusão diferente. A esta tendência a literatura chama de viés confirmatório e a par com este, existem muitas outras tendências ao nível da perceção, atenção e interpretação da realidade a que qualquer ser humano está naturalmente vulnerável.
Nem todas as decisões podem beneficiar do uso da intuição. Apesar da sua utilidade é preciso ter consciência de que esta nem sempre se encaixa na realidade como previsto, e pelo contrário, pode tirar-nos a disponibilidade para a perceber tal e qual esta é. Erros ao nível da perceção e interpretação da realidade podem gerar interações viciadas e cíclicas com o meio que nos rodeia e connosco mesmos. Questionar de tempos a tempos a nossa intuição poderá a ajudar-nos a sair destas últimas e quem sabe a ganhar com isso.
Sofia Sousa de Macedo - Psicologia Clínica
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