A autossabotagem é um comportamento de evitação que nos leva a ter atitudes contrárias ao que sabemos ser correto fazer em determinada circunstância. É uma fuga à realidade e à responsabilidade relativa à liderança da vida, já que a pessoa trai a sua ação assumindo comportamentos contrários aos necessários para alcançar os seus objetivos. Todos nós, por medo de alguém ou de uma situação, podemos recorrer a um comportamento de autossabotagem.
Fazê-lo pontualmente é normal e significa que estamos saudáveis, que os nossos mecanismos de defesa estão a funcionar. No entanto, quando se torna um comportamento recorrente que se instala em nós como sendo o nosso verdadeiro eu, pode gerar situações psicopatológicas e perturbações da personalidade. Trata-se de uma autossabotagem permanente que acaba por se instalar, levando a pessoa a não saber funcionar de outra forma.
Na psicoterapia existencial, a autossabotagem é vista como um ato de má-fé do indivíduo relativo a si próprio, como referiu Jean-Paul Sartre, em 1942, um comportamento que não só afasta o sujeito do seu propósito como o leva a viver uma espécie de dupla personalidade que usa sempre que receia fazer o que é necessário para operar uma mudança significativa. Existem várias causas para isto acontecer, mas a razão fundamental é evitar o medo.
Uma situação que nos leva a preferir não ver, a fugir de sentir e de contactar com as nossas dores emocionais, com aquilo que nos magoa. As causas psicoemocionais da autossabotagem prevalecem, portanto, sobre fatores comportamentais (o que recebemos da sociedade/família/educação), que pressupõem uma aprendizagem passiva resultante da cópia e repetição de atitudes com as quais fomos contactando ao longo da vida (pais e pessoas de grande proximidade).
O impacto desse gesto
Levada ao extremo, a autossabotagem torna-se viciante. Uma espécie de adição, de dependência, que a pessoa passa a usar em permanência para não agir e não mudar a sua vida. Assim, como qualquer adição, a autossabotagem deve ser transformada sob pena de a pessoa não conseguir sair dos problemas que diz serem limitadores da sua felicidade. Os seus efeitos mais negativos são o desenvolver uma autoimagem de alguém incapaz de alcançar objetivos ou fazer mudanças na sua vida.
Mas não só. Implicam também a diminuição do respeito próprio e, consequentemente da autoestima, da sensação de frustração crónica e de insatisfação para consigo mesmo, irritabilidade consigo e com os outros e aumento dos níveis de stresse. Destaca-se ainda a sensação de descontrolo perante o rumo da vida. De ficarmos reféns das circunstâncias sabotadoras que nós mesmas criámos, ao ponto de ser muito difícil distinguir aquele que é, afinal, o nosso comportamento natural, fora da autossabotagem.
Autossabotagem no amor e no trabalho
A autossabotagem é transversal a todas as áreas e o autossabotador desempenha o seu papel a full time. Nos relacionamentos, os processos mais comuns de autossabotagem são os que resultam em constantes fins das relações amorosas. A pessoa tem tanto receio que a relação acabe que faz tudo para que isso aconteça. O mesmo se passa com os relacionamentos familiares e de amizade, em que a pessoa cria mau ambiente ou se coloca no papel de vítima, desconfiando da possibilidade de as coisas simplesmente funcionarem e serem boas.
No trabalho, podemos ver a autossabotagem em situações muito prejudiciais, que podem, por exemplo, afetar a sua imagem de competência e até evitar uma promoção, como adiar a entrega de relatórios importantes, chegar atrasada a reuniões, não atender chamadas dos chefes ou responder com mensagens a dizer que está fora... São muitos os exemplos de situações que acabam por ser reflexo desse comportamento.
Veja na página seguinte: Como está (provavelmente sem se aperceber) a sabotar a sua vida
O que fazer para ganhar com a mudança
Travar o processo de autossabotagem traduz-se em inúmeros ganhos. Ganhamos autenticidade e uma tomada de consciência de quem somos e de como isso está a prejudicar quem desejamos ser. Ganhamos determinação pessoal para resolver tudo o que consideramos não estar a funcionar na nossa vida. E, como consequência, ganhamos alegria, bem-estar pessoal e amor, por nós e pelos outros.
Eliminar a autossabotagem traz-nos ainda novas oportunidades e aumenta muito a concretização de objetivos, o que por sua vez aumenta a nossa autoconfiança e a nossa autoestima. Podemos também ganhar o amor de uma vida ou a possibilidade de sermos mães, em casos mais complicados de autossabotagem.
Como está (provavelmente sem se aperceber) a sabotar a sua vida
Escolhemos a autossabotagem como estratégia de disfarce e de evitação de coisas que não queremos ver em nós ou nos outros, de mudanças que não queremos fazer e de medos que não assumimos. É tempo de se libertar de tudo isso. Comece aqui. Agora! Estes são os fatores a ter em conta para o conseguir:
- Modéstia extrema
Promove uma imagem de incapacidade e pode afastar os outros pois fazemos com que os outros se sintam obrigados a elogiarem-nos em permanência. Cria uma imagem de falsidade, conduzindo a desentendimento e aborrecimento. A modéstia extrema irrita os outros. Pare com isso. Comece por identificar quem é que na sua vida teve, ou ainda tem, o mesmo comportamento e por que razão o terá desenvolvido.
De seguida, questione qual a necessidade emocional que a sua modéstia extrema está a colmatar e de que falta a está a compensar. Geralmente, a modéstia extrema ocorre em pessoas com ferida de humilhação e que cresceram a ouvir expressões como «Tiveste uma excelente nota, não fizeste mais que a tua obrigação». Assim, se aprendeu a esconder as suas vitórias e os seus sucessos, reconheça a si próprio que já não precisa de o fazer.
Elogie-se. Pelas pequenas coisas, pelas grandes, elogie-se sempre que sentir que esteve bem. Peça também a amigos e familiares que o elogiem sempre que conseguir elogiar-se. Uma frase simpática nunca fez mal a ninguém. Muito pelo contrário!
- Procrastinar
Trata-se de escolher fazer uma coisa não importante, que nos dá prazer, e deixar de fazer o mais importante. Faz-nos perder liderança porque ficamos reféns do mais tarde e do eterno «Não tenho tempo». Desregula o tempo necessário para as tarefas, levando-nos a fazer tudo sobre pressão. Pare com isso! Identifique e liste os assuntos em que costuma procrastinar.
Perceba se aquilo que a leva a procrastinar tem a ver com hábitos que sempre viu a sua mãe/pai fazerem. Se assim for, tome consciência de que está a repetir um padrão e que o pode mudar. Identifique, depois, os benefícios que obtém por procrastinar. São benefícios reais ou fugas para não contactar com questões que não quer resolver?
Identifique, de seguida, os benefícios que obtém quando deixa de procrastinar. Compare os resultados. Mude a sua atitude. Comece por fazer de facto o que sente que deve, pelo menos uma vez por semana, e observe como isso a faz sentir-se bem. Pense assim «Liberto a necessidade de me castigar com pressão, fingindo que é assim que funciono bem» e «Continuar à espera da melhor altura coloca a minha vida em suspenso, quebra o ciclo de renovação e impede que as coisas fluam facilmente para mim».
Pensamentos e frases como «Resolver tudo à última hora é um padrão que prende a minha vida na rotina luta-esforço», «A minha criatividade e o meu sucesso aumentam quando termino as coisas com tempo para as rever» e «O meu stresse diminui e a minha qualidade de vida aumenta quando deixo a necessidade de terminar as coisas à última hora» são outras das afirmações que deve valorizar.
Veja na página seguinte: Como lidar com a autocrítica negativa
- Autocrítica negativa
Leva à perda da autoestima e à formação de um autoconceito negativo que, muitas vezes, faz com que se entre em depressão e se deixe de conseguir avaliar bem os acontecimentos. Cria uma profunda tristeza na pessoa e nos que com ela privam. Pare com isso! Analise as suas crenças e perceba como aquilo em que acredita está a condicionar de forma negativa o seu diálogo interior. Neste processo, comece por aceitar os seus erros de forma natural, vendo-os como aprendizagem e como base da sua autossuperação.
Monitorize o seu discurso de forma a identificar a autocrítica e os pensamentos destrutivos que verbaliza ou que tem. Proceda à substituição do discurso negativo por um mais positivo e benéfico para si. Ao focar a sua atenção no seu próprio discurso e ao identificar o que o tem prejudicado até ao momento, pode começar a construir um diálogo interior positivo que deseja ver refletido na sua vida. Após mudar o seu diálogo interior, implemente-o!
- Falta de autocontrolo
Faz-nos perder a sensação pessoal de liberdade, ficamos condenados a gerir a nossa vida com esse receio. Leva-nos a acusar os outros pelos males do mundo e por não conseguirmos ser felizes ou capazes de assumir o controlo da nossa vida. Pare com isso! Identifique as razões/circunstâncias que a levam a perder o controlo, os chamados acontecimentos-gatilho.
Perceba, de seguida, se pode ou não afastar-se dessas razões e se as mesmas continuam a ser importantes para si ou apenas se habituou a descontrolar-se quando ocorrem. Elimine, depois, todas as situações que já não são importantes, mas que continua a usar como sabotagem pessoal.
Escolha, em cada situação, trabalhar proativamente pensando «Vale a pena perder o controlo por causa disto? O que ganho?». Aplique, por fim, a proatividade e elimine a reatividade em cada situação em que habitualmente perde o controlo.
Assim pensa um autosabotador
As três coisas que uma pessoa que é um dos maiores inimigos de si próprio faz:
1. Antecipa
O autossabotador usa pensamentos e frases como «Isto é bom de mais para acontecer comigo», «Não tarda, está tudo a desmoronar-se», «Seria bom de mais se durasse» ou ainda «Já vi isto acontecer outras vezes, bastam dois meses para ele estar a dizer isto ou aquilo» e por aí fora...
2. Vitimiza-se
O autossabotador não quer negociar; prefere representar o papel da vítima, dar explicações sem fim, mostrar que é único, não dar saída. «É o meu feitio, nada posso fazer contra isso» são os tipos de frases que mais se lhes associam.
3. Desculpabiliza-se
Uma situação comum de autossabotagem são as desculpas relativas à falta de dinheiro ou de tempo para fazer alguma coisa mas, geralmente, acabamos sempre por arranjar dinheiro e tempo para os comportamentos sabotadores que nos retiram dos objetivos traçados.
Texto: Teresa Marta (coach para a coragem e CEO da Academia da Coragem)
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