Não há nada de mal em desejar a perfeição. Organização, capacidade de síntese, foco, atenção aos detalhes, autodisciplina, capacidade de se esforçar e de treinar acima da média são aspetos positivos de um perfecionismo saudável e integram uma visão equilibrada de nós. Tudo muda, contudo, quando o desejo de perfeição se eleva acima do nosso significado como pessoa, limitando a nossa própria felicidade.
Essa é a outra face do perfecionismo, aquela em que ele se torna uma característica desviante da personalidade humana, de tipo obsessivo-compulsivo, isto é, uma patologia. O perfecionismo traduz-se num esforço permanente para melhorar o desempenho pessoal e alcançar o êxito dos objetivos, perseguindo um padrão que se considera ser o ideal, abaixo do qual o perfecionista se classifica como insuficiente, perdedor e falhado.
Significa ainda dar uma importância exagerada a tudo, ao ponto de nunca se alcançar um estado de satisfação com a vida em geral. O perfecionista reclama perfeição em tudo o que o rodeia e em todos, começando por si próprio, ao ponto de ficar dominado pelo desejo constante de alcançar mais e melhor. No seu nível mais extremo, doentio, atinge níveis de exigência pessoal (e com os outros) angustiantes, absorventes e extenuantes.
No campo profissional, embora seja visto por muitos como sinónimo de sucesso, o perfecionismo é um dos responsáveis pela baixa produtividade, pelo medo de errar e pela incapacidade de seguir soluções não lógicas (criativas) para resolver problemas. Veja também a galeria de imagens que lhe indica 7 passos rumo à liberdade.
Como nasce um perfecionista
Geralmente, os perfecionistas cresceram em famílias onde tiveram sempre de demonstrar que eram capazes de superar obstáculos, objetivos sempre mais elevados e onde a falha não era permitida, sendo até penalizada. Foram pessoas educadas em famílias e sistemas educativos (ou mesmo religiosos) onde o seu valor era medido pelo que conseguiam obter, tendo ouvido muitas vezes expressões como «sofrer faz parte do crescimento» e «para seres alguém, tens de te esforçar e ser melhor do que os teus colegas».
São pessoas que passaram a vida a ser avaliadas em escalas educacionais, familiares e sociais de valor. A tal ponto que deixaram aos outros o poder de avaliar quem são e o valor daquilo que fazem. Passaram muito tempo a tentar corresponder ao valor que esperavam deles, porque daí resultava o facto de serem ou não aceites.
O que está a perder
O perfecionista não consegue saborear a simplicidade da vida e a capacidade de atribuir o valor real às coisas que nos acontecem e às tarefas que temos de desempenhar. Perde o prazer das coisas mais simples pois, para ele, nada pode falhar, não consegue aproveitar o momento e vive com uma enorme rigidez que o impossibilita de fluir naturalmente com a vida e de procurar soluções fora da caixa. Não raras vezes, perde o timing ideal dos processos e da resolução dos problemas, tão preocupado que fica em que tudo seja perfeito.
Com isso, perde a possibilidade de ser bem-sucedido, o que aumenta a sua frustração e ansiedade, fazendo com que coloque na próxima vez a necessidade extrema de não voltar a falhar Esta luta diária para corresponder às expetativas dos outros, para não sermos excluídos, para sermos amados desgasta-nos, angustia-nos e torna-nos adultos com medo.
Veja na página seguinte: Ser imperfeito é bom?
Ser imperfeito é bom
Uma das vantagens mais importantes da imperfeição é retirar-nos de uma vida em exigência relativa ao que esperam de nós e ao que nós esperamos de nós mesmos. Afasta-nos dos padrões doentios de luta e esforço. Relativizar é outra grande vantagem da imperfeição. Sistematizar em nós que, de facto, o mundo não é perfeito. Nós não somos perfeitos, o nosso emprego não é perfeito, os nossos filhos não são perfeitos, os nossos chefes não são perfeitos…
Esse é, contudo, o resultado da nossa humanidade. Aceite-se como é! Está a fazer o melhor que pode face às condições e ao conhecimento que tem neste momento. Quando conseguimos sentir- nos confortáveis pelo que somos, ao invés de estarmos em permanência a tentar ser quem achamos que deveremos ser, passamos a sentirmo-nos muito mais seguros.
Dar o primeiro passo
Devemos olhar para os outros e para nós não através dos olhos de uma escala que tudo classifica e mede, mas com os olhos do coração. Isto não significa aceitarmos ser menosprezados ou dominados pelo outro ou que deixemos de parte a nossa capacidade de escolha. Significa olhar para a pessoa (e para nós mesmos) aceitando que o erro existe como base de superação pessoal e não como autoflagelo.
Na cabeça de um perfecionista
Quem vive em função da perfeição, sente uma elevada frustração ao perceber que nem tudo funciona exatamente como deseja e que existem sempre partes da equação que não consegue controlar. Estas são outras das características de um perfeccionista:
- Anula a sua forma inata de estar e de sentir porque vive a vida através de esquemas de pensamento planeados milimetricamente para evitar o erro. Acaba por anular a sua autenticidade, aquilo que realmente é.
- Impõe-se amarras angustiantes porque quer que tudo funcione segundo as suas linhas de orientação pré-programadas. Passa a vida a questionar tudo à sua volta e tudo o que existe (ou falta) em si e nos outros.
- Simples questões do dia a dia afetam o seu equilíbrio físico e emocional. A ruga que apareceu, o quilo a mais, mais um cabelo branco, o tempo que chove ou que está quente, a casa que precisa de obras, o chefe que não muda, o filho que não estuda.
- Vive a vida na crítica e na procura da falha. Sempre que as coisas não correrem como planeado tenta encontrar falhas. Em si, nos outros, no sistema, no mundo…
- Deixa de ter tempo para si mesmo e passa a viver uma vida assoberbada onde não há lugar para a tranquilidade, para sentir e para ser leve e alegre.
Texto: Nazaré Tocha com Teresa Marta (coach para a coragem e CEO da Academia da Coragem)
Comentários