São muitos os portugueses que sofrem de patologias do foro alérgico. «Foi aos nove anos que tive a minha crise inaugural de asma. Sem pré-aviso, sem aviso de qualquer espécie», recorda Luísa Pires.

«Funcionou como um passaporte de entrada nas urgências do hospital, onde permaneci uma semana, sempre agarrada a um Snoopy já amarelado de tantos abraços», desabafa.

«Hoje em dia já não tenho crises de asma e, mais tarde, percebi que, tal como eu, o mundo estava repleto de alérgicos, entre os quais aqueles que viviam a pensar que estavam constipados 365 dias por ano, os que não percebiam porque é que uma corrida para apanhar o autocarro os deixava sem fôlego ou porque é que as suas horas de sono eram ritmadas por ataques de tosse», sublinha ainda a professora primária.

Por essas pessoas e também por todas aquelas que querem saber mais sobre o mundo das comichões, espirros e falta de ar, conversámos com a jornalista especializada em saúde Cláudia Borges e com Filomena Falcão, médica alergologista. Há uns anos, a quatro mãos, escreveram «Não Consigo Parar de Espirrar – Alergias e asma: (Con)viver com elas», publicado pela editora Esfera dos Livros. Propomos-lhe, assim, uma viagem até uma realidade que está mesmo

agora ao seu lado e, até, dentro da sua própria casa!

Por detrás do atlas

«Quisemos escrever um livro que fosse muito acessível, dirigido para pessoas que, habitualmente, não têm tempo e disponibilidade para ler livros sobre saúde. O nosso objetivo era que retratasse um bocadinho toda a doença alérgica e a asma, que fosse um livro completo, cientificamente correto e, simultaneamente, que utilizasse uma linguagem de fácil compreensão, com curiosidades que suscitassem o interesse dos leitores», explica Cláudia Borges.

«Foi um trabalho de parceria, a quatro mãos. Feito por duas cabeças, mas com um objetivo comum», sublinha a jornalista, acrescentando que «gostaria que as pessoas, quando entrassem numa livraria ou num hipermercado onde o livro está à venda, assim como compram bens essenciais para a sua alimentação, sentissem necessidade de comprar este atlas e de o consultar ao longo da sua vida».

«Chamo-lhe atlas porque gostaria que estivesse na casa das pessoas e que estas, perante uma dúvida, fossem ao índice e, rapidamente, conseguissem consultar o livro e obter uma resposta», justifica.

Boom alérgico

Os ácaros do pó da casa, à semelhança dos fungos, baratas, pelos de animais domésticos, pólens e, embora com menos frequência, alimentos e medicamentos, são os alergénios mais responsáveis pela doença alérgica. Por mais estranho que pareça, o encontro de minúsculas partículas desses agentes com pessoas suscetíveis desencadeia reações alérgicas.

A asma e a rinite são apenas algumas representantes do vasto mundo da doença alérgica, já que a reação alérgica a alimentos, picadas de insetos ou medicamentos ocorre com menor frequência mas, no entanto, a sua gravidade é subestimada já que, na realidade, podem (em certos casos) ser fatais.

A doença alérgica parece ser um problema em crescimento nos países industrializados e o porquê desse aumento foi a questão que colocámos a Filomena Falcão, a coautora do livro, que nos explicou que «felizmente nem toda a gente tem alergias. Mas a doença alérgica aumentou imenso, devido ao ar que respiramos, à alimentação que fazemos, ao estilo de vida que levamos», refere.

A relevância da hereditariedade

«O peso genético não será tão significativo neste crescimento da doença alérgica, visto que as alterações genéticas não ocorrem em 30, 40 anos», refere a especialista. «Contudo existe, claramente, uma maior fragilidade para o meio ambiente, até porque nunca houve tantos médicos como há agora e, ao mesmo tempo, nunca houve tanta doença», sublinha ainda Filomena Falcão.

Mas não tem de ser assim. A importância de valorizar as queixas associadas à doença alérgica e procurar acompanhamento especializado é reforçada por esta médica alergologista pois, se não forem tratadas, «as pessoas têm uma qualidade de vida muito mais baixa do que aquela que poderiam ter. Se ficam cansadas quando correm, deixam de correr. Passam a vida com tosse à noite, pensam que estão constipadas e arrastam a situação», lamenta.

«A qualidade de vida, nestes casos, pode ser muito melhorada. A asma limita a qualidade de vida se não for tratada e pode ser, até, fatal. A rinite alérgica é um fator de risco para a asma e daí também a importância de se procurar acompanhamento médico». adverte. «40 por cento dessas pessoas pode vir a ter asma e quanto mais cedo nos procurar melhor, porque podemos atuar ainda na fase de rinite», diz ainda esta especialista.

Antecipar o risco

Por outro lado, atuar ao nível da prevenção é muito importante. Sabia que pais alérgicos têm grande probabilidade de virem a ter um filho alérgico? «O risco, para esses bebés, é muito maior. Existem consultas de aconselhamento em que delineamos um plano para ajudar os pais. Recomendamos à mãe que deixe de fumar e não esteja perto de fumadores. A exposição ao tabaco aumenta o potencial alérgico do bebé e, depois dele nascer, nunca deve estar exposto ao fumo do tabaco», avisa.

«A casa deve ser arejada, limpa, e o quarto do bebé deve ter o menor número de objetos possível. Se já houver animais domésticos, não dizemos para saírem mas, se os pais já são alérgicos, geralmente não têm animais em casa. Em relação à alimentação, insistimos muito no aleitamento materno, aconselhamos a que se introduzam os alimentos devagar, um por um e consoante um determinado calendário, diferente do dos outros bebés», recomenda.

«É provável que as crianças de risco alérgico venham a ter alergia mas tentamos minimizar esse risco, adiá-lo. E junto sempre ao boletim de vacinas a informação de que aquele é um bebé de risco alérgico, para que se saiba que temos de ter outros cuidados com ele», contou-nos Filomena Falcão.

Texto: Teresa d'Ornellas com Cláudia Borges (jornalista) e Filomena Falcão (médica alergologista)