Erro médico. A expressão é popular, mas também equívoca. «Os erros ocorrem no sistema de saúde, por vezes são responsabilidade dos médicos, outras do sistema, outras de elementos do pessoal que não os médicos», sublinha José Fragata.

«Por isso, o mais correto é falarmos em erros na saúde», refere ainda este especialista, autor do livro «O Erro em Medicina».

Mas as responsabilidades são também partilhadas pelo doente. Não só existem várias medidas que pode tomar para assegurar a qualidade dos cuidados que lhe são prestados, como fazê-lo é um dos seus principais deveres, enquanto paciente. «A bola da segurança está também do lado dos doentes», salienta José Fragata, autor do primeiro livro publicado em Portugal sobre esta temática, em 2004.

«É essencial que os médicos tenham noção de que não são infalíveis, que estejam alerta e tenham uma atitude proativa», da mesma forma que «os doentes devem ter uma atitude atenta e inquisitiva, colocando perguntas». Isto sem esquecer que também os dados que fornecem (ou omitem) aos profissionais de saúde vão interferir na escolha e curso do tratamento.

Doente informado, paciente empenhado

Segundo a Agency for Healthcare Research and Quality, departamento do governo norte-americano, «pacientes pouco envolvidos e informados têm menor probabilidade de aceitar o tratamento do médico e de fazer o que é necessário para que o funcione». Desta forma, «uma boa comunicação entre o doente e o profissional de saúde é fundamental para obter cuidados de enfermagem, farmacêuticos ou médicos eficientes», sublinha o ex-bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, José Aranda da Silva, no livro «Os meus medicamentos».

Erros e complicações

Na origem dos erros na saúde
interagem componentes individuais, de sistema e/ou de ambiente. Por
exemplo, «se num departamento de urgência entram,de repente, 100 doentes
isso cria um ambiente mais propício a erros», exemplifica José Fragata.

Para este médico, o erro é «uma falha não intencional de realização
de uma sequência de atividades físicas ou mentais previamente planeadas e
que, desta forma, falham em atingir o resultado esperado».

Assim,
distingue-se dos casos de violação de regras (como a negligência
médica) e «pode ocorrer sem consequências negativas para os doentes». Na
verdade, apenas uma minoria dos erros resulta em danos ou outros
eventos adversos. Em cada 100 internamentos hospitalares existem dez
erros. Desses, 70 por cento não resulta em eventos adversos, em 25 por
cento pode haver complicações transitórias e em cinco por cento há
complicações graves.

Áreas críticas

Os erros podem ocorrer em qualquer setor, dos procedimentos simples aos mais complexos. A
medicação «corresponde a, pelo menos, um terço de todos os eventos
adversos», afirma José  Fragata. Da prescrição, à dispensa do
medicamento, à administração, são muitas as oportunidades  para que algo
falhe, pelo que o papel proativo do doente se reveste de especial
importância», destaca José
Aranda da Silva.

«Conte com o seu
médico como fonte primária de informação e tenha em conta que, «quando o
farmacêutico lhe dispensa os medicamentos, tem uma segunda oportunidade
para esclarecer a  informação ou fazer novas perguntas», sublinha ainda este especialista.

O que deve fazer nas consultas

Uma vez por ano, leve
todos os medicamentos que está a tomar para a consulta. Segundo José Aranda da Silva, «muitos alimentos e
produtos farmacêuticos que não são considerados medicamentos,  como
vitaminas e nutrientes, podem diminuir a eficácia dos medicamentos e, em
alguns casos, potenciar os efeitos».

«Conferir com o médico se aquilo
que vão levar de novo não colide com aquilo que já fazem chama-se
reconciliação terapêutica e é um aspeto fundamental para os doentes»,
diz José Fragata.

Informe o médico sobre as alergias e reações alérgicas que já teve. Estes
dados são indispensáveis para evitar que lhe sejam prescritos
medicamentos prejudiciais, já que a utilização de um medicamento a que é
alérgico pode desencadear um choque anafilático que, em último caso,
poderá ser fatal.

Descubra como os fármacos prescritos a podem
mesmo ajudar. «Os
doentes portugueses estão sobremedicados, nomeadamente em relação a
antidepressivos eansiolíticos. É culpa dos doentes, dos médicos e uma
questão de cultura. É mais fácil medicar um doente do que ouvir meia
hora de conversa», conta José Fragata. Sobretudo se está a tomar vários
medicamentos, pergunte ao médico se são todos são necessários, as
alternativas existentes e quais os custos e benefícios de cada uma.

Certifique-se de que percebe a letra e a linguagem do médico. Esta
tarefa está agora facilitada pela prescrição eletrónica. A
transferência automática de dados «diminui erros de transcrição e
permite um melhor tratamento dos dados por parte do Serviço Nacional de
Saúde», refere José Aranda da Silva. Se não entender algo que o seu
médico lhe diz, pergunte. «É essencial que os médicos adequem a sua
linguagem ao entendimento dos pacientes», defende José Fragata.

Esclareça os resultados das análises e exames. Mais
importante que ler os relatórios quando chegam às suas mãos, é pedir ao
médico que os interprete. «Os doentes têm todo o direito de ler os
relatórios, mas é uma perda de tempo, só se confundem. Obtenha os
medicamentos sempre na mesma farmácia. Desta forma, poderá «usufruir
dos melhores serviços de uma farmácia», considera José Aranda da Silva.

«O farmacêutico deve ser informado sobre a sua história
atual de saúde e da medicação», refere este especialista. Se tiver que visitar uma farmácia nova,
«é importante informar o farmacêutico, tão exatamente quanto possível,
sobre a sua história clínica ou fornecer-lhe uma cópia da sua
medicação», acrescenta ainda.

Assegure-se de que o medicamento que está a comprar é o receitado. Segundo
a Agency for  Healthcare Research and Quality, um estudo do
Massachusetts College of Pharmacy apurou que 88 por cento dos erros
médicos envolvem a toma do medicamento errado ou na dose errada. Uma simples pergunta pode impedir estes erros.

 Confira o significado das indicações do rótulo. Por
exemplo, saiba se «quatro doses diárias» são tomas de seis em seis
horas ou em determinadas alturas do dia. Pergunte quanto tempo demora a
fazer efeito, o que fazer caso se esquecer de tomar, como armazenar o
medicamento e esclareça todas as dúvidas que ainda tiver.

 Informe-se sobre a melhor forma de dosear os medicamentos. No caso dos
medicamentos líquidos, uma colher de chá nem sempre é uma medida fiável,
já que os tamanhos podem variar. Uma  alternativa possível é usar uma
seringa para medir a dose certa. Saiba também se partir ou esmagar os
comprimidos ou cápsulas afetará a ação do medicamento.

Aconselhe-se sobre o transporte dos medicamentos. Se precisar de retirar
os medicamentos do recipiente de origem, peça conselho ao farmacêutico
sobre o recipiente a usar. «O uso de caixas de medicamentos pode causar
alguns problemas, tais como comprimidos partidos ou lascados, troca de
um medicamento por outro e interações entre o medicamento e o metal das
caixas», alerta José Aranda da Silva no seu livro.

O que deve fazer no hospital

Se possível, escolha um hospital com vasta experiência na cirurgia de que necessita. Quanto
maior a experiência do corpo clínico, maior a probabilidade de obter
bons resultados. Pode tentar pesquisar e aconselhar-se junto de diversos
profissionais de saúde antes de tomar uma decisão. A escolha de um
profissional e de uma unidade de saúde será sempre mais fácil no setor
privado do que, obviamente, no público.

Peça a um familiar ou
amigo que o acompanhe. Quando não o pode fazer, é importante ter alguém
que zele por si e fale com os profissionais, de preferência alguém com
conhecimentos ou experiência na área da saúde. Lembre-se que isso não
lhe dá direito de ser inoportuno ou perturbar o trabalho dos
profissionais. «Também precisamos de tempo para tratar os doentes», diz
José Fragata.

Antes de uma cirurgia, certifique-se de que o cirurgião sabe exatamente qual é o seu caso, a
área a operar. O conselho é da American Academy of Medical Physicians
(AAMP). Tentando não ferir suscetibilidades, «pode dizer, enquanto ainda
estiver acordado, não se esqueçam que eu sofro desta patologia e deste
lado», sugere José Fragata. No entanto, «os doentes quando vão para o
bloco devem ir com o local da cirurgia marcado com tinta própria. Isso,
hoje em dia, é uma das verificações obrigatórias do chamado checklist
cirúrgico», refere ainda.

Assegure-se que os profissionais de saúde que
contactam diretamente consigo lavaram as mãos. Este é outro conselho da
AAMP, mas segundo José Fragata, embora seja «perfeitamente razoável» que um doente confira com o profissional de saúde que o fez, deve procurar uma forma delicada de
colocar a questão, já que ainda «não estamos neste nível de cultura de
segurança e os médicos provavelmente iriam receber isso menos bem».

Lavar as mãos «é a medida que, segundo a Organização Mundial de Saúde,
de forma isolada mais combateria a infeção hospitalar», acrescenta o médico.

Elimine possíveis focos de infeção. Objetos como flores
e joias estão interditos da generalidade dos quartos de hospital por
promoverem a presença de bactérias. Quanto ao comando da televisão, deve
certificar-se de que o limpam antes de o usar, recomenda o site do
famoso Dr. Oz. Como medida de controlo de infeção, qualquer médico deve
desinfetar o estetoscópio antes de auscultar cada paciente e qualquer
profissional de saúde deve usar máscara perante sintomas inesperados
como tosse, espirros ou pingo no nariz.

Quando tiver alta, peça
ao médico que lhe explique o plano de tratamento A investigação sugere
que, ao dar alta, os médicos assumem que os pacientes já sabem o que
podem ou não fazer em casa, o que muitas vezes não acontece, alerta a
Agency for Healthcare Research and Quality. Fique a par dos medicamentos
a tomar, se interferem ou não com os que já toma e quando pode retomar as atividades do dia a dia.

Perguntas que deve fazer ao médico

«É
verdade que não é muito fácil com dez minutos de consulta, mas os
doentes têm que estar vigilantes e fazer perguntas», aconselha José
Fragata. Estas são as questões que deve colocar:

- Qual a ação do medicamento?
- Como devo tomá-lo e durante quanto tempo?
- Quais os efeitos secundários?
- O que fazer se eles se verificarem?
- Que alimentos, bebidas ou atividades devo evitar enquanto o tomo?

Deveres do paciente

- Ter uma atitude atenta e inquisitiva
O paciente tem
o direito de questionar quem está envolvido no seu tratamento e deve
fazer as perguntas necessárias para perceber os seus problemas de saúde e
as formas de os tratar.

- Ser fiel ao tratamento
Se um doente não segue as prescrições médicas, o médico tem o direito de não o tratar. Respeite sempre, por isso, as indicações do especialista.

Texto: Rita Miguel com José Aranda da Silva (ex-bastonário da Ordem dos Farmacêuticos e docente universitário) e José Fragata (cirurgião
cardiotoráxico e Diretor do Serviço de Cirurgia Cardiotoráxica do
Hospital de Santa Maria)