Cada vez mais, em diversos contextos e de diferentes formas, ouvimos falar sobre a Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA). Quase sempre, reflete-se sobre este tema como se ele fosse exclusivo da infância e da adolescência, e esta ideia está muito longe de corresponder à realidade. Os últimos 20 anos de investigação têm-nos vindo a mostrar que em quase metade dos casos, a PHDA persiste na idade adulta, ainda que com uma manifestação inevitavelmente diferente daquilo que são os seus sintomas em termos comportamentais (o que é visível ao outro). Para além destes casos, temos ainda os adultos que não foram identificados em idades precoces e que na vida adulta pedem ajuda. Muitas das vezes, este pedido de ajuda relaciona-se com dificuldades associadas a outras problemáticas (e.g. a ansiedade, a depressão, o uso de substâncias), mas no final da história bem contada podemos estar perante um adulto com uma PHDA – eles são perto de 3% da população geral.
É verdade que os sintomas continuam centrados naquilo que é característico nesta perturbação: desatenção, hiperatividade e impulsividade - mas no adulto, tudo isto se mostra (e se sente!) de forma diferente, até porque as exigências, as rotinas e os contextos de vida são muito diferentes dos das crianças e dos adolescentes. Na verdade, os adultos com PHDA continuam a ter dificuldade em regular a atenção e a mantê-la focada numa tarefa, em particular se essa tarefa for monótona, desinteressante e não gerar motivação (algo que condiciona positivamente a capacidade de regular a atenção), continuam a ter dificuldade em organizar o que têm para fazer e em gerir o seu tempo, mantêm a enorme tendência para “deixar andar” até que o tal prazo afinal até já passou, continuam a falar demasiado, quando não é suposto, e a interromper ou antecipar o que os outros querem dizer, sentem-se impacientes e inquietos…
Por esta altura uma das perguntas que o leitor estará a colocar a si próprio é: Então isto tem impacto na vida profissional do adulto com PHDA ou não? A resposta é simples e inequívoca: Sim! Tome-se como exemplo aquele relatório que ficou por fazer e só foi entregue um mês depois – “Não consigo manter-me a ler por mais de alguns minutos sem me perder com um pensamento. Os relatórios da empresa demoram semanas e acabo sempre a ter que levar trabalho para casa”, ou aquela reunião a que se faltou porque até se marcou outra à mesma hora – “a minha vida é um caos, parece que nunca me consigo organizar como é suposto”, ou o colega (ou o chefe…) que já não tolera fazer os mesmos pedidos várias vezes - “O meu chefe tem sempre que me dizer as coisas duas ou três vezes. Acho que está a começar a duvidar da minha capacidade para esta função”, e mesmo as reuniões em que os outros são constantemente interrompidos com comentários que parecem sair de forma impulsiva - “Não consigo evitar. Parece que o que eu tenho para dizer é mais importante, mas acho que os meus colegas já não me suportam”. A realidade é que hoje em dia sabemos que todas estas dificuldades tendem a resultar numa perda de produtividade relevante, ou se quisermos, num baixo rendimento no trabalho, e sabemos também que resultam em remunerações abaixo da média e em mudanças frequentes de emprego (quer por vontade própria, quer por vontade de quem emprega).
Por todos estes motivos, começar a conhecer e a identificar é fundamental. A sinalização é o primeiro passo, pôr de lado frases como “Eu sempre fui assim…”, “Não há nada que se possa fazer, eu nunca vou conseguir mudar…” é o seguinte. Uma intervenção devidamente estruturada, dirigida aos diferentes contextos de vida pode, acima de tudo, melhorar a qualidade de vida do adulto com PHDA, da sua família e de todos os que consigo interagem diariamente.
Mariana Rigueiro Neves – Consulta da PHDA no Adulto
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