Em entrevista publicada hoje no Diário de Notícias, o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior disse querer alargar o ensino da Medicina até 2023, destacando Aveiro, Vila Real e a Universidade de Évora onde a abertura dos cursos poderá ocorrer.
A intenção manifestada por Manuel Heitor foi recebida com algum agrado pelo SNESup, mas a presidente do sindicato que representa os docentes e investigadores do superior é cautelosa e avisa que não se pode dar um passo maior que a perna.
“Somos, de um modo geral favoráveis, ao alargamento das vagas no ensino superior, porque Portugal continua a precisar de apostar na qualificação dos seus recursos humanos”, começou por dizer Mariana Gaio Alves, em declarações à Lusa.
No entanto, para o SNESup, “não basta aumentar o número de vagas” e, por isso, em eventuais novos cursos deve ser sempre assegurada a qualidade da formação e a sua adequação ao mercado de trabalho.
Concretamente, Mariana Gaio Alves destaca duas preocupações, relacionadas com a qualidade e estabilidade do corpo docente, por um lado, e com a articulação entre a oferta no sistema de ensino e a procura no sistema de saúde.
“Abrir três cursos de medicina significa que temos de ter professores contratados com qualificação própria e uma estabilidade também do corpo docente destes cursos que permitam garantir a qualidade da formação que vai ser ministrada”, explicou.
Segundo a dirigente sindical, a precariedade que afeta de forma transversal os docentes do ensino superior é particularmente preocupante no caso dos cursos de Medicina, em que o equilíbrio entre professores efetivos e convidados nem sempre é respeitado e a balança tende muitas vezes para os segundos.
“Mas é fundamental que exista um corpo docente estável nas escolas de medicina, porque é esse corpo docente estável que assegura o plano de estudo, a articulação entre as várias unidades curriculares, entre os vários estágios que os estudantes realizam”, acrescentou.
Por outro lado, a presidente do SNESup defende que a criação de nova oferta deve ter por base uma articulação entre o Ensino Superior e a Saúde, para que os novos cursos deem resposta às necessidades do setor, em vez de contribuírem para o excesso de médicos em determinadas especialidades, enquanto se mantém a falta de profissionais noutras.
A intenção do Governo em alargar o ensino da Medicina não é novidade e, já no ano passado, Manuel Heitor tinha referido que a manutenção das vagas nos cursos existentes tornava clara a necessidade de disponibilizar o ensino desta área noutras instituições, públicas ou privadas.
No entender de Mariana Gaio Alves, a decisão das instituições que não aceitaram o aumento de lugares disponíveis é, por outro lado, ilustrativa da necessidade de resolver as atuais fragilidades do ensino da Medicina antes de alargar a oferta a mais alunos.
“Porque se aumentarmos o número de vagas indefinidamente e não aumentamos nem o número de professores, nem os professores que estão contratados e vinculados com estabilidade, nem os recursos financeiros existentes nas instituições, vamos necessariamente assistir a uma deterioração das condições em que o ensino é ministrado”, justificou.
A mesma lógica estende-se a outras áreas e, por isso, comentando também o aumento excecional das vagas em resposta ao recorde de candidatos pelo segundo ano consecutivo, a presidente do SNESup reitera que é necessário que “a entrarem mais alunos no sistema, o sistema se reconfigura para acolher estes alunos da melhor forma”, sob pena de acentuar um outro problema associado à taxa de abandono.
Em reação às mesmas declarações do ministro do Ensino Superior, o presidente do Conselho de Escolas Médicas Portuguesas (CEMP), Fausto Pinto, criticou as intenção expressdas por Manuel Heitor, defendendo que "a formação médica em Portugal não passa por novas escolas ou aumento de vagas, porque isso não vai contribuir em nada para resolver o problema da suposta falta de médicos".
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