11 de abril de 2013 - 11h18
O psiquiatra Afonso de Albuquerque afirma que a ignorância e o preconceito da sociedade sobre a doença mental levam frequentemente os familiares a “negar a possibilidade” da existência da doença em alguém que lhe é próximo.
“A discriminação do doente mental existe desde sempre”, tem é “tomado várias formas ao longo dos séculos”, disse à agência Lusa o psiquiatra, autor do livro “A discriminação do doente mental no Ocidente”, que é lançado hoje no Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa.
O psiquiatra refere no livro que, perante os primeiros sinais de doença, com frequência na adolescência ou no adulto jovem, os familiares começam, em regra, por não lhes atribuir o significado real e a confundi-los com reações a situações do stress e do dia-a-dia ou a algum problema.
Quando os sintomas se mantêm ou se agravam, é frequente serem vistos como “mau comportamento” que necessita de ser criticado ou punido, a não ser que tenham conhecimento de casos diagnosticados na família.
Mas “o público em geral continua relativamente ignorante sobre a doença mental e tem preconceitos que frequentemente levam os familiares a negar a possibilidade da sua existência em alguém que lhe é próximo”.
Para o psiquiatra, este “clima de silêncio, de crítica ou de negação familiar não facilita ao doente a partilha com a família das suas angústias, perturbações ou ideias auto e heterodestrutivas que porventura o façam sofrer”.
Afonso de Albuquerque iniciou a sua carreira hospitalar no Hospital Júlio de Matos em 1968 e conta que raramente observou um jovem a sofrer de doença mental grave que não tivesse sido inicialmente considerado pela família como “drogado”.
“Estas convicções familiares erradas (drogado, mau feito, preguiçoso)” levam ao adiamento do diagnóstico e do tratamento adequado da doença, alerta.
A doença mental também teve sempre “pesadas consequências” relativamente à habitação e à vizinhança dos doentes.
Após 70 anos de existência do Hospital Júlio de Matos, na avenida do Brasil (Lisboa), alguns vizinhos continuam a queixar-se de que os doentes andam pelas ruas e batem às portas das casas, ou que incomodam os transeuntes e os automobilistas com “pedidos de dinheiro ou de cigarros” ou com “bizarrias do comportamento, intimidando assim as pessoas e as crianças”.
“Também são frequentemente expulsos com dureza dos cafés ou de outros estabelecimentos com porta aberta, para não ‘incomodar’ a clientela ou os empregados e também porque têm pouco dinheiro para gastar”, conta.
Outro receio é que as residências próximas dos doentes graves possam baixar o valor económico das casas ou estabelecimentos.
O psiquiatra disse à Lusa estar convicto de que “esta discriminação vai continuar, mas há possibilidades de fazer alguma coisa”.
”A população sabe que isto está a acontecer, nomeadamente os familiares e amigos de doentes que sofrem também na pele esta situação”, sublinha.
Lamenta ainda o impacto das notícias a relatar atos de violência atribuídos à doença mental.
“Os estudos mostram que o interveniente principal nesta discriminação, nesta má imagem e de certa rejeição do doente mental é a comunicação social, que de uma maneira geral quando se refere ao doente mental fá-lo de uma forma negativa, porque matou alguém ou aconteceu algum escândalo”, sustena.
Lusa