O que se viveu durante o último ano está longe de corresponder a uma verdadeira telemedicina: em 99% dos casos as teleconsultas foram, na verdade, chamadas telefónicas e metade dos médicos sente que os doentes têm dificuldades técnicas nas teleconsultas, refere a Ordem dos Médicos em comunicado.
Os resultados fazem parte do Estudo da Opinião dos Médicos Sobre o Uso da Teleconsulta no Serviço Nacional de Saúde Durante a 1ª Fase da Pandemia Covid-19, desenvolvido pela Associação Portuguesa de Telemedicina (APT), com o apoio da Ordem dos Médicos, e que é agora divulgado. O estudo foi coordenado pelas médicas Catarina O’Neill e Margarida V. Matias, do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental.
O inquérito contou com a resposta de 2225 médicos que trabalhavam no SNS durante a primeira vaga de SARS-CoV-2.
As conclusões do trabalho apontam para vários problemas. Nas respostas, segundo Catarina O’Neill e Margarida V. Matias, 47% dos médicos referiram dificuldades na adaptação do utente ou cuidador às tecnologias de comunicação, 23% destacaram a impossibilidade de receber documentos do utente e 20% as dificuldades de entregar documentação ao utente.
Ao nível da relação clínica, os médicos alertaram para a impossibilidade de realizar o exame físico (83%) e dificuldade na transmissão de informação clínica ao utente ou cuidador (43%). “Foram também identificadas pelos médicos dificuldades na perceção do estado clínico, inexistência de comunicação não-verbal, dificuldades em estabelecer uma relação médico doente adequada, não reconhecimento da teleconsulta como consulta pelo utente e comunicação dificultada em alguns grupos de utentes em situações mais vulneráveis”, destacam as autoras.
“Reconhecemos que o contacto entre médico e doente, da forma que foi feito, foi a solução possível para ultrapassar os constrangimentos da pandemia. O estudo revela que estes contactos foram maioritariamente efetuados através de telefone. Precisamos, pois, de um investimento digital que seja consistente e estruturante, assegurando a criação de condições adequadas nas instituições de saúde para a realização de teleconsultas – em instalações, em infraestruturas tecnológicas (redes, equipamentos, plataformas específicas), para que os registos, relatórios e requisições possam ser processados adequadamente. Contactos telefónicos não são teleconsultas e os inquiridos são claros quando, ao pretenderem manter esta modalidade de consulta, sustentam a necessidade de recorrer ao suporte vídeo nas teleconsultas. Poderá estar assegurado, nestas circunstâncias, o futuro da teleconsulta, exibindo assim sinais muito positivos para a afirmação da telessaúde no Serviço Nacional de Saúde, designadamente para incrementar a capacidade de resposta do SNS após o surto pandémico” refere o presidente da APT, Eduardo Castela.
Além de 99% das consultas terem sido apenas telefonemas, só 41% dos médicos utilizaram telefones ou telemóveis da instituição. Em 15% dos casos foram sempre utilizados os telefones e telemóveis pessoais e em 44% dos casos, as duas modalidades. Cerca de 67% dos médicos referem que enviaram documentação pelo email e 41% por correio. Há ainda 62% de médicos a referirem que receberam documentos por email e 12% por correio.
Nas poucas situações em que foi utilizado vídeo (só 8% da amostra teve essa experiência), foram maioritariamente utilizadas plataformas não específicas para telesaúde: WhatsApp (49%), Microsoft Teams (25%), Zoom (22%), Skype (21%), GoogleMeet (6%), RSE Live (3%) e Medigraf (2%). Quanto a qualidade, só 14% dos médicos consideram que a teleconsulta é equiparável a uma consulta presencial em todas ou na maioria das situações.
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