“A situação dos povos indígenas é muito delicada, principalmente hoje que temos um número significativo de povos isolados e de recente contato”, disse à AFP em Manaus Maria Cordeiro Baré, 40 anos, líder do povo Baré, que ocupa as margens do rio Negro, da bacia do Orinoco, na Venezuela, até à região onde fica a capital do Amazonas, no Brasil.

“Então, no nosso caso, tanto a covid-19 quanto outras doenças que não fazem parte da nossa realidade e que já tivemos no passado acabam por comprometer a saúde e a vida dos povos indígenas”, acrescentou.

No passado, doenças trazidas pelos primeiros colonizadores europeus, como a varíola, dizimaram cerca de 95% da população indígena das Américas.

Segundo Maria Baré, o temor com a chegada do novo coronavírus é crescente nas comunidades indígenas e já altera sua rotina.

“Por causa disso, várias organizações, como a Apib (articulação dos povos indígenas do Brasil), estão a cancelar reuniões e assembleias para evitar aglomerações e que os indígenas acabem contaminando os demais quando voltarem às suas comunidades”, acrescentou.

O estado do Amazonas e sua capital entraram em emergência sanitária esta semana, com medidas restritivas à circulação de pessoas, aulas e controle de passageiros em portos e aeroportos. As visitas a comunidades indígenas também foram suspensas.

Há três casos confirmados da doença no estado do Amazonas.

Acessos restritos por mar e ar

No interior, a confirmação dos casos na capital também levou à adoção de medidas de contenção para tentar impedir a chegada de pessoas infectadas.

Em plena floresta amazónica, Carauari, cidade com 29 mil habitantes, a 788 km de Manaus, não tem estradas. É acessível apenas por barcos e pequenos aviões. A viagem de barco partindo da capital leva sete dias e de avião, cerca de três horas.

Além de transportar pessoas, barcos e aviões abastecem com alimentos, produtos industrializados e processados o pequeno município, predominantemente rural, onde os ribeirinhos se dedicam sobretudo ao cultivo de subsistência, à pesca e à extração de produtos da floresta, como o açaí.

Ainda sem registo de casos do novo coronavírus, o a cidade tem apenas um hospital com 50 camas e acionou um plano de contingência implementado pelo presidente do município Bruno Luiz Ramalho para impedir a chegada de pessoas infectadas.

Passageiros que chegam ao porto e ao aeroporto passam por uma entrevista e triagem com equipas médicas. Ainda não há previsão do encerramento destes acessos, o que afetaria o abastecimento da cidade.

“A previsão é que o controle de passageiros não se restrinja a barcos vindos de Manaus, mas a todos os passageiros vindos de voos ou de barcos vindos da capital e de municípios vizinhos da parte de cima do rio (Juruá, que banha a região)”, explicou à AFP Manoel Brito, diretor do hospital UBS Maria del Pilar.

“A dificuldade do acesso aqui para a região dificulta a chegada de pessoas provenientes de outros estados, o que minimiza o risco de alguém entrar contaminado. Mas por outro lado, com essa dificuldade logística, teremos problemas em transferir pacientes (mais graves) porque num caso desses, tem de ir de UTI aérea e temos poucas condições para isso”, acrescentou.

População segue medidas preventivas

A preocupação com a chegada do novo coronavírus também se sente nas ruas da cidade.

“Não querem que ninguém vá mais daqui para Manaus e que saia de Manaus para vir para cá e trazer a doença de lá. Sou daqui de Carauari, sempre vivi aqui. Em janeiro completei 80 anos. Nunca tinha visto uma situação destas na minha vida”, disse Raimunda da Silva dos Santos, sentada numa cadeira na calçada da sua casa, a poucos metros do porto.

“Ficamos a pedir a Deus para que essa epidemia não venha para cá. Fazemos o possível, lavamos as mãos, para prevenir, como mostra a TV. Eu tenho medo, sim, sinto-me ameaçado porque às vezes vem gente de fora” que pode trazer a doença, admitiu José Barbosa das Graças, 52 anos, em frente do seu pequeno comércio.

Segundo ele, nas rodas de conversa, o medo da chegada do coronavírus é tema recorrente.

“Toda a gente está preocupada porque esta doença ataca mais velhos e crianças. Só Deus e Nossa Senhora para nos acudir. A nossa cidade é pobre, não é como as outras (afetadas), que têm recursos”, desabafa, angustiada, Raimunda Viana, 88 anos, na porta de sua casa de palafita às margens do rio.

Em Portugal, a Direção-Geral da Saúde (DGS) anunciou esta sexta-feira a existência de seis mortes e 1.020 casos de COVID-19

O número total de infetados cresceu 235 em relação a ontem, uma subida que representa um aumento de 30% em relação aos dados de quinta-feira.

De acordo com o boletim diário da Direção-geral da Saúde (DGS), registaram-se até ao momento 1.020 casos confirmados de COVID-19 em Portugal, 850 aguardam resultado laboratorial, 5 recuperados e 9008 em vigilância pelas autoridades.

Pandemia alastra

Ao todo, já morreram em todo o mundo 10.049 pessoas e há 246.522 casos contabilizados. Apenas um terço recuperou (88.486).

Itália superou a China esta quinta-feira no número de mortes por coronavírus, com 427 novos óbitos em 24 horas, o que levou a um total de 3.405, segundo dados oficiais do governo italiano.

Assim, Itália (3.405) tornou-se o país com mais mortes por COVID-19, à frente da China (3.245), Irão (1.284) e Espanha (1.002).

A doença parece estar a infetar as pessoas a um ritmo mais rápido: os primeiros 100.000 casos demoraram três meses a aparecer, mas os segundos surgiram num intervalo de apenas 12 dias, adverte a Organização Mundial de Saúde que alerta para a rápida propagação da pandemia.

Devido à pandemia, foram vários os Estados-membros da UE que adotaram medidas para promover o isolamento social, tentando assim conter o surto. Portugal incluído.

A doença já se alargou a 176 países e territórios, o que levou a Organização Mundial da Saúde a declarar a situação como de pandemia.

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