2 de setembro de 2014 - 15h48

O responsável pela organização de um encontro mundial sobre tratamento de agressores sexuais, que começa quarta-feira, no Porto, defendeu hoje um plano nacional de combate a este tipo de crime em vez de “medidas avulsas” sem qualquer eficácia.

Segundo Ricardo Barroso, especialista em psicologia e ciências sociais da Universidade de Trás os Montes e Alto Douro, com investigação desenvolvida nesta área, deveria avançar-se para “algo muito bem pensado e estruturado para que dentro de 5/6 ou dez anos possam surgir resultados visíveis sobre a redução da incidência e reincidência deste tipo de crimes”.

O processo de registo e notificação, as especificidades comportamentais de agressores sexuais adolescentes, as características de agressores sexuais ‘online’ e as novas metodologias de intervenção farmacológica e psicoterapêutica são assuntos em destaque na conferência mundial da IATSO (International Association for the Treatment of Sexual Offenders), que reunirá até sábado, na Faculdade de Psicologia e de Ciências das Educação da Universidade do Porto, cerca de 300 especialistas, 98% dos quais estrangeiros.

Questionado pela Lusa sobre a proposta de lei que prevê a criação de um registo de identificação criminal para agressores sexuais em Portugal - que, segundo a edição de hoje do Correio da Manhã, incluirá uma base de dados informática acessível aos pais de crianças até aos 16 anos - o investigador disse não ter dúvidas de que existe por parte do Ministério da Justiça uma intenção clara de intervir eficazmente neste âmbito.

Falta um plano concreto

Contudo, lamenta a inexistência, até ao momento, de “um plano concreto, devidamente fundamentado e com objetivos a curto, médio e longo prazo, sem ter de ser a ‘correr para cumprir o calendário da legislação europeia’”.

“O resultado disso não terá grandes efeitos, parece-me. Os estudos tendem a sugerir que o registo de agressores sexuais numa base de dados, do ponto de vista da eficácia do controlo/prevenção da reincidência tem alguma eficácia desde que o acesso a esta base seja feito única e exclusivamente por entidades policiais e de reinserção social e desde que enquadrada num conjunto de outras medidas, algo que, infelizmente, não está a ser feito em Portugal”, considerou.

Além disso, acrescentou, “a ser verdade o que a notícia
transmite (sobre o acesso público das informações), a legislação pura e
simplesmente será considerada ilegal em termos europeus, tal como
aconteceu em França em 2006 e no Reino Unido em 2004, uma vez que é
permitida a constituição de uma base de dados desta natureza, mas não o
acesso/a exposição pública da mesma. Isto é perfeitamente claro e tenho a
certeza que o Ministério de Justiça sabe disto”.

Assim, diz
Ricardo Barroso, “uma medida desta natureza é, por si só, totalmente
inútil se não for acompanhada de outras medidas. É necessário haver
intervenção psicoterapêutica com estes agressores, seja em contexto
prisional, seja em contexto de liberdade condicional e é também muito
importante a formação especializada aos próprios técnicos (psiquiatras,
psicólogos) porque é uma área sensível e que requer muita
especialização, tanto na intervenção com vítimas, como com agressores”.

Psiquiatras,
psicólogos, criminologistas, juristas, entre outros profissionais,
procuram discutir nesta conferência da IATSO, no Porto, os mais recentes
estudos sobre instrumentos e técnicas de avaliação do risco de
reincidência, bem como sobre as melhores metodologias de intervenção e
tratamento destes agressores.

Com o tema escolhido para o
congresso em Portugal (“Criminal Policies in Sexual Violence: From
Research to Legislation and Treatment”) procurar-se-á salientar “a
necessidade da legislação e da prática profissional se basear em
investigações altamente qualificadas, em particular em termos da sua
eficácia interventiva/preventiva”.

Para abordar a eficácia do
processo de registo e notificação dos agressores sexuais foram
convidados dois considerados dos maiores especialistas mundiais nesta
matéria que apresentarão estudos recentes sobre esta medida: Terry
Thomas (University of Leeds, Reino Unido) e Bill Hebenton (University of
Manchester, Reino Unido).

Por Lusa