A par das equipas médicas, dos equipamentos robustos e do extenso conhecimento clínico inerente ao setor da saúde, existe um conjunto de tecnologias digitais que prometem, entre outros, aprimorar os processos de diagnóstico e até de cura de inúmeras patologias. 

O uso de Inteligência Artificial tem ganho uma relevância teórica considerável à escala europeia e Portugal tem contribuído para vários estudos realizados neste âmbito – o que permite posicionar o País como o quinto na lista dos Estados-membros mais envolvidos nesta matéria. As Universidades do Minho, do Porto e de Lisboa são responsáveis por 8% do total da investigação relacionada com o uso da inteligência artificial na área da saúde.

Porém, a investigação existente sobre a aplicação da Inteligência Artificial na área da saúde não é acompanhada por uma idêntica aplicação no terreno, o que poderá ser justificado por uma falta de legislação, pelo receio da população ou por um pouco de ambos. 

Neste âmbito, a Organização Europeia de Consumidores (BEUC), de que fazemos parte, reconheceu o potencial destas novas tecnologias, tendo formulado um conjunto de recomendações, dirigidas aos legisladores europeus, que estão atualmente a preparar a necessária regulamentação para fazer face a diversas dúvidas.

Em boa verdade os consumidores já utilizam um conjunto de tecnologias digitais, como o motor de busca, o televisor inteligente e aplicações diversas de telemóveis que funcionam com algoritmos – o que faz com que consciente ou inconscientemente já estejamos perante a presença de inteligência artificial no nosso dia-a-dia. No entanto, as dúvidas persistem.

Importa relembrar que são os seres humanos quem dá as instruções ao algoritmo, limitando-se este a responder em função dos objetivos traçados. Como tal, é possível controlar e legislar esses objetivos, para prevenir abusos e injustiças, especialmente numa área tão sensível quanto a da saúde.

Contudo, existe um conjunto de dúvidas que não tem permitido a implementação da Inteligência Artificial na saúde. Desde logo, a questão financeira: Que investigação científica deve ser financiada? Quais os mecanismos apoiados financeiramente pelos Estados-membros que devem ser criados para promover a correta transposição desta investigação para a prática clínica? 

Por outro lado, é importante perceber qual a operacionalidade desta nova integração, nomeadamente, de que forma será feita a interoperabilidade dos registos de saúde eletrónicos entre os vários Estados-membros para efeitos de estudos alargados ou como se poderá garantir a segurança das aplicações e dos equipamentos médicos que dependem da Inteligência Artificial. Em questões de ética surgem igualmente dúvidas. Se um médico tomar uma decisão confiando no algoritmo, e esta se revelar incorreta, a quem pedir responsabilidades: ao profissional de saúde ou a quem programou o sistema?

E se considerarmos os pacientes na equação, existem muito mais temas em aberto, os quais passam pela forma como se poderá prestar informações aos cidadãos ou assegurar que as pessoas num estudo possam exercer controlo sobre os seus dados. 

O objetivo de longo prazo formulado pela Comissão Europeia é, assim, ver introduzida a Inteligência Artificial no domínio da saúde de forma refletida e regulada. Mas, para isso, deve ser desenhado um quadro legislativo comum aos Estados-membros. A futura regulamentação, que se encontra em fase de redação, tem de responder a várias questões que pairam neste momento sobre a implementação da inteligência artificial na prática clínica.

A Inteligência Artificial só deve estender-se ao domínio da saúde com um quadro regulatório forte e detalhado, que respeite e proteja os direitos dos cidadãos. 

Um artigo de opinião de Rita Rodrigues, Diretora de Comunicação da Deco Proteste.