A Joana foi submetida a cirurgia devido a incontinência fecal. Como é viver com um problema destes, considerado ainda tabu?

Foi muito complicado na fase inicial, da aceitação e do diagnóstico, tanto a nível familiar como profissional. As coisas complicaram-se após a esfincteroplastia [cirurgia de reparo de algum defeito ou lesão no esfíncter anal]. No meu caso, só a neuromedulação sagrada ajudou e voltei a ter autonomia e qualidade de vida.

Percebi logo depois do nascimento da minha filha que tinha incontinência, mas não olhei para o que me estava a acontecer desta forma. Pensei que fosse uma consequência normal do parto e que, com o tempo, iria desaparecer.

O tempo foi passando, mas o tabu, o medo, a vergonha e os mitos que envolvem este tipo de doenças atrasaram a procura de ajuda. Só consegui falar sobre o assunto com a minha obstetra, na qual tinha bastante confiança.

É isto mesmo que o Movimento pela Continência e Disfunção Pélvica quer ser para todos os que nos procuram, um movimento no qual tenham confiança, estando à vontade para abordarem o seu problema. A nossa página no Facebook e e-mail estão sempre abertos para receber mensagens com quaisquer dúvidas ou medos que possam surgir durante o processo de procura por ajuda especializada. Ninguém se deve sentir sozinho durante esta fase, que pode parecer muito solitária.

O que falta fazer para normalizar este problema, retirando-lhe os tabus, e incentivar a procura de ajuda?

Em primeiro lugar, é crucial procurar ajuda junto de profissionais de saúde e nunca desistir até haver um diagnóstico e uma solução para o seu caso. Ser resiliente e lutar para ter qualidade de vida é essencial.

Há ainda um longo caminho a percorrer para conseguirmos normalizar a conversa sobre estas patologias e a procura por ajuda, não normalizando a patologia em si, claro. A nossa missão passa assim por contribuir para a melhoria das condições de vida dos doentes que sofram de incontinência e disfunções do pavimento pélvico, nomeadamente no que se refere à integração social e comunitária.

Joana Oliveira
Joana Oliveira Joana Oliveira, presidente do Movimento pela Continência e Disfunção Pélvica

Criar visibilidade para os problemas associados à continência e disfunção do pavimento pélvico, encorajando o debate público e aberto e a quebra de estigma e tabus associados a estas doenças são assim os principais objetivos do Movimento. Pretendemos ser a voz dos doentes e ser ouvidos pela sociedade e pelos decisores políticos, incentivando ainda à alteração da lei de incapacidade.

É também muito importante garantir que mais profissionais de saúde saibam identificar estas doenças, não as desvalorizando. Passando a primeira dificuldade, a vergonha da pessoa afetada, é necessário que esta seja corretamente encaminhada, de forma a receber o tratamento mais adequado de forma precoce.

Exercício físico e incontinência urinária

Conversámos com Inês Alves, club manager do ginásio Mais Fit Gaia, sobre como colocar o exercício físico ao serviço de uma melhor saúde urinária.

Qual é o papel do exercício físico na prevenção da incontinência e outras disfunções pélvicas? E no tratamento destas?

O exercício físico, quando orientado por profissionais especializados, tem um papel importante na prevenção de várias patologias e na saúde em geral, pois permite uma melhor consciencialização corporal, mobilidade e ativação de musculatura específica que concorre para a melhoria de estados críticos.

No caso da incontinência e outras disfunções pélvicas, existem exercícios específicos que ajudam na ativação e no fortalecimento do pavimento pélvico e da musculartura envolvente, auxiliando na prevenção e no tratamento destas patologias.

Que exercícios são aconselhados?

Os exercícios de Kegel são os mais recomendados, mas podem ser associados e intensificados através de outros movimentos, como a mobilidade pélvica e o fortalecimento da musculatura do pavimento pélvico, ou até mesmo exercícios respiratórios. No entanto, torna-se fundamental a orientação dos mesmos por um profissional do exercício.

De que forma é que os ginásios podem ter um papel mais importante na promoção do reforço do pavimento pélvico?

Os ginásios têm um papel preponderante na intervenção de todos os aspetos que melhorem a qualidade de vida das pessoas e na prevenção e no tratamento de patologias associadas.

Qual o trabalho do Movimento pela Continência e Disfunção Pélvica?

O movimento tem como objetivo mostrar a todas as pessoas que sofrem de incontinência ou disfunção pélvica que não estão sozinhas. Queremos incentivar todas as pessoas que sofrem perdas de urina, gases ou fezes a procurarem ajuda especializada de forma precoce, para que seja adotado o tratamento mais adequado.

O nosso principal foco passa por tornar mais fácil o ato de falar sobre estas doenças, normalizando a incontinência e disfunção pélvica, mas não a sua existência. É fundamental falar sobre as perdas de urina, gases ou fezes e não ter vergonha de procurar ajuda. A espera é a nossa pior inimiga!

Queremos ainda apoiar todas as pessoas que procuraram ajuda e tratamento, mas sentem que não têm apoio suficiente na comparticipação de medicamentos ou materiais de apoio à doença. E até quem sente que a solução demorou demasiado a chegar.

Todos juntos poderemos normalizar o diálogo sobre a incontinência e a disfunção pélvica, ajudando cada vez mais pessoas.

De que forma vão assinalar a Semana da incontinência Urinária, que se assinala entre os dias 12 e 18 de março?

A propósito da Semana da Incontinência, que este ano se assinala entre os dias 12 e 18 de março, o Movimento pela Continência e Disfunção Pélvica, em parceria com os ginásios Level Health Club, em Almada, e Mais Fit, em Vila Nova de Gaia, está a dinamizar aulas focadas no reforço do pavimento pélvico. O objetivo passa por normalizar a conversa sobre esta patologia e alertar para a importância do exercício físico como forma de prevenção e até tratamento da incontinência. Lançámos também o instagram do movimento, de forma a conseguirmos chegar a mais pessoas.