Sérgio Sousa investiga há três anos as características de uma doença rara – Síndrome Nicolaides-Baraitser – Em todo o mundo, existem pouco mais de trinta casos reconhecidos. Este trabalho já valeu ao médico geneticista do Hospital Pediátrico de Coimbra duas distinções internacionais no espaço de um ano.
Sérgio Sousa, de 32 anos, foi galardoado com o John M Opitz Young Investigator Award, graças a um artigo publicado sobre a doença, na prestigiada revista de Genética Médica "American Journal of Medical Genetics". A entrega do prémio será no dia 20 de Novembro, no final da 14ª Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Genética Humana, no auditório da Fundação Bissaya Barreto.
Esta é a segunda vez que o médico do Hospital Pediátrico recebe uma distinção internacional pelo trabalho desenvolvido com a síndrome Nicolaides-Baraitser, uma doença rara da qual se conhecem pouco mais de três dezenas de casos em todo o mundo. Sérgio Sousa já tinha sido galardoado em 2009 com o Isabelle Oberlé Award, na Conferência Europeia de Genética Humana, que decorreu em Viena (Aústria).
"É importante ver o nosso trabalho reconhecido, sobretudo numa área como as doenças raras e a Genética Médica, pouco conhecida e valorizada pela restante comunidade médica em Portugal e onde esse reconhecimento é invulgar”, admite Sérgio Sousa.
"Nesta área e no momento presente, em cerca de metade dos doentes observados com atraso do desenvolvimento psico-motor não conseguimos ainda identificar as causas genéticas responsáveis. Muitas perguntas ficam sem resposta. Esta incógnita, e sobretudo a desilusão das famílias que observamos, tornam o nosso quotidiano por vezes pouco gratificante. E é precisamente por isso que este tipo de reconhecimento é muito motivador: ele compensa o investimento que fazemos durante anos no conhecimento de novas patologias", explica.
No artigo publicado no American Journal of Medical Genetics, Sérgio Sousa descreve o conjunto de características que as crianças com síndrome de Nicolaides-Baraitser podem apresentar. "Trata-se de uma síndrome muito rara e até agora pouco conhecida. O objectivo do trabalho foi precisamente identificar de que forma é que ela se manifesta nas crianças. Só assim poderemos diagnosticá-la melhor e avançar para o conhecimento das suas causas genéticas, o que poderá permitir, por sua vez, avanços na área da terapêutica", revela o investigador
Estudo começou em 2007 e envolveu doentes de 15 nacionalidades
A síndrome Nicolaides-Baraitser foi descrita, pela primeira vez em 1993, quando os médicos Paola Nicolaides e Michael Baraitser identificaram numa doente de 16 anos um conjunto de sinais e sintomas que pareciam indiciar uma patologia ainda por identificar. Desde então e até 2003, foram apenas registados quatro casos com características similares.
"Ao longo dos últimos três anos, o meu trabalho foi precisamente identificar novos doentes com esta síndrome, provenientes de vários países europeus, e perceber como é que ela se manifesta e como evolui", explica Sérgio Sousa, que já analisou mais de duas dezenas de casos de Nicolaides-Baraitser. De resto, este é um trabalho também com impacto para a vida dos doentes e dos seus familiares.
"Tratando-se de uma doença praticamente desconhecida, a maioria destas famílias não estava a par da existência de outras pessoas na mesma situação”, acrescenta o mesmo especialista, para quem ”a sociedade fecha os olhos a estas doenças raras e os pais sentem-se muito desapoiados”. Este trabalho permitiu, por exemplo, sublinha, ainda, Sérgio Sousa, que “fosse possível um encontro mundial, no Reino Unido, com os pais de portadores desta doença, que se sentem reconfortados por alguém dar atenção a este problema e se dedique a estudá-lo”.
Tudo começou quando, em Setembro de 2007, Sérgio Sousa, então interno de Genética Médica do Centro Hospitalar de Coimbra, partiu para Londres para realizar um estágio de quatro meses no Great Ormond Street Hospital for Children, o maior hospital pediátrico da Europa. "A umas semanas do final do meu estágio, observámos um menino de nove anos com atraso mental e características muito particulares, a quem o professor Raoul Hennekam - um dos maiores dismorfologistas do mundo - sugeriu o diagnóstico de síndrome de Nicolaides-Baraitser. Nunca tinha ouvido falar de tal patologia e o estudo que tive de fazer em seguida mostrou-me que pouco ainda se sabia sobre ela", conta Sérgio Sousa.
Quando regressou a Coimbra, multiplicaram-se os contactos com centros de todo o mundo e as deslocações ao estrangeiro, com doentes identificados oriundos de 15 nacionalidades e quatro continentes. A síndrome Nicolaides-Baraitser. Segundo o estudo conduzido por Sérgio Sousa, as crianças com a síndrome de Nicolaides-Baraitser apresentam diversas características, entre as quais, atraso mental, atraso severo no desenvolvimento, graves dificuldades na fala, convulsões, microcefalia (cabeça de dimensão abaixo da média), pouco cabelo, deformações nas mãos e nos pés e enrugamento progressivo da pele.
"Em Portugal não há ainda qualquer caso diagnosticado, mas temos alguns sob suspeita. De facto, embora apenas se conheçam cerca de três dezenas de casos em todo o mundo, haverá por certo muitos mais, ainda por identificar", admite Sérgio Sousa. A causa da síndrome não é ainda conhecida. Mas a descrição das suas características é um passo fundamental para que seja descoberta, reconhece o especialista. "Estamos já, em colaboração com centros da Holanda e da Bélgica, a utilizar os meios mais avançados de sequenciação do genoma para descobrirmos o que está na origem desta síndrome. Talvez nos próximos meses já tenhamos alguma resposta", revela.
19 de Novembro de 2010
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