Dados da EURORDIS (Organização Europeia para Doenças Raras) indicam que cerca de 50% das doenças raras manifesta-se durante a infância. Para muitas delas, um diagnóstico precoce é crucial, pois pode possibilitar tratamentos que melhorem significativamente a qualidade de vida dos pacientes. Mas receber um diagnóstico de doença rara tem forte impacto social e psicológico, além de envolver, em muitos casos, avultadas despesas (nem sempre comparticipadas). E quando o diagnóstico surge na infância é duro, não só para a criança, como para toda a sua família.

A história de Nicole Giroux e da sua filha Lila, diagnosticada com um tumor cerebral inoperável aos 15 meses, é apenas um exemplo das lacunas existentes no tratamento de doenças raras em crianças. Lila esteve cinco anos à espera de obter um diagnóstico preciso, devido à falta de dados. O que nos leva a um enorme desafio: a escassez de recursos e a limitação de amostras disponíveis para estudar estas doenças.

Uma das apostas está no desenvolvimento de tecnologia para investigação médica, que se ergue como uma contribuição poderosa, e um passo crucial para suprir a necessidade de diagnósticos mais rápidos e precisos.

A cloud emergiu como uma ferramenta fundamental em diversos setores e a medicina não é exceção. A cloud já permite gerir e partilhar dados de forma segura (com garantia da privacidade dos pacientes e participantes de estudos clínicos) e eficiente, para que os mesmos sejam acedidos de diferentes pontos do mundo, por cientistas de diferentes projetos. A ciência, por tradição, fazia-se localmente, em silos, e a partilha de conhecimento existia quando se publicavam artigos científicos ou se promoviam grandes conferências. Um dos avanços tecnológicos mais significativos para a medicina é, sem dúvida, a partilha de dados em tempo real, mais abrangente e colaborativa, essencial para doenças raras que muitas vezes recebem pouca atenção e financiamento. Esta abordagem já está a transformar a investigação pediátrica.

Através de plataformas na cloud, os resultados e diagnósticos de pacientes podem ser partilhados de forma mais ampla e imediata. Por exemplo, os investigadores do Nationwide Children’s Hospital nos Estados Unidos utilizam a cloud como uma ferramenta para processar dados genéticos e diagnósticos de doentes oncológicos pediátricos com cancro, além de os partilharem com a Base de Dados de Cancro Infantil do National Cancer Institute. Uma vez na cloud, os dados são anonimamente partilhados e disponibilizados a um grupo alargado de investigadores, que os podem consultar e utilizar em tempo real.

Além dos avanços na gestão de dados, o uso de IA na investigação médica está a emergir de forma promissora. Hoje, já se conseguem o identificar doenças genéticas raras, por exemplo em bebés, personalizar planos de tratamento ou interpretar de imagens de ecografias para diagnosticar doenças cardíacas, à distância. A IA está a tornar o diagnóstico mais acessível e preciso.

No Children’s National Hospital há neste momento uma equipa que com recurso a uma simples câmara de telemóvel consegue avaliar características faciais de recém-nascidos e identificar condições genéticas. Esta ferramenta já foi testada em 30 países e vai ajudar a rastrear crianças que vivem em locais onde os recursos são limitados e que não têm acesso a médicos especialistas. A expansão destas tecnologias para regiões menos favorecidas deve ser uma prioridade. Uma das grandes conquistas tecnológicas será quando, independentemente da sua localização, todas as crianças possam beneficiar dos mais recentes avanços científicos.

A Cardiopatia Reumática Crónica é outra condição médica em que a IA tem sido aplicada – através da disponibilização de exames imagiológicos de baixo custo, acessíveis a doentes com menos recursos. Assim, estamos a democratizar o acesso a diagnósticos e tratamentos de alta qualidade. No Uganda, por exemplo, prevê-se que 200.000 crianças sejam rastreadas nos próximos anos.

O mundo corporativo possui uma valiosa oportunidade de apoiar estas causas tão vitais, como é a pesquisa pediátrica e infantil. Contribuir para áreas de investigação que tradicionalmente têm recursos limitados é um exemplo poderoso de como as empresas podem utilizar o seu conhecimento e recursos para criar um impacto social positivo e duradouro. E há cada vez mais empresas que querem fazer a diferença. Impulsionar a investigação em saúde pediátrica e compreender melhor as doenças raras tem um potencial transformador da tecnologia na área da saúde.

Abordar este tema, das doenças pediátricas raras, requer um esforço colaborativo de várias partes interessadas. Ao promover parcerias sólidas entre os setores público e privado, a academia e os prestadores de cuidados de saúde, é possível caminhar para um futuro onde nenhuma criança seja deixada para trás na luta contra doenças raras.