Em entrevista à agência Lusa nas vésperas do Dia Mundial da Psoríase, que se assinala domingo, o presidente da PSOPortugal contou ter conhecimento de que há hospitais que “protelam a entrega dos medicamentos porque não estão nas suas linhas de contratação e sugerem que a prescrição seja alterada”.
“Isto cria atrasos nos tratamentos, precipita troca para medicamentos que têm menos eficácia e aumenta as dificuldades para os doentes que, desesperados, fazem deslocações de quilómetros entre hospitais e perdem tempo de tratamento em pedidos a dermatologistas. É o calvário da validação”, descreveu Jaime Melancia.
Recordando que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) “há muito que padece com falta de dermatologistas”, situação à qual se soma o “muito tempo de espera para consulta”, Jaime Melancia contou que “muitos doentes com psoríase viram-se forçados a recorrer à medicina privada”.
“Mas os medicamentos biológicos que entretanto foram surgindo, em alguns casos os únicos eficazes, são medicamentos de fornecimento do hospital e as dificuldades nesse processo acumulam-se”, lamentou.
Em causa está, segundo a associação, o facto de os médicos certificados pela Direção-Geral da Saúde poderem receitar medicamentos biológicos ao abrigo da portaria 48/2016.
No entanto, no ano passado, surgiu uma nova portaria, a 99/2022, que introduz um fator de validação de receituário pelas comissões de farmácia dos hospitais, explicou Jaime Melancia, apontando que “os médicos receitam o medicamento que é mais adequado ao doente e os hospitais tentam que os médicos prescrevam medicamentos que estão a ser usados nesses hospitais”.
Um estudo de 2021 do grupo português de psoríase da Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venereologia aponta que 20 a 30% dos doentes com psoríase tem doença moderada a grave, mas apenas 12% estavam em terapêutica sistémica e apenas 3% em terapêutica biológica.
Preocupada com estes números, a PSOPortugal já expôs a situação às entidades reguladoras da saúde, bem como à tutela.
Jaime Melancia acrescentou, ainda, que existem casos semelhantes nas terapêuticas associadas à artrite reumatoide, cuja associação de doentes interpôs providências cautelares contra hospitais que obrigavam os pacientes a mudar de medicamento.
“Não queremos chegar a esse ponto. Temos outra maneira de atuar. Já apresentamos a situação [ao Ministério da Saúde] e vamos agora lançar uma campanha focada nos direitos dos doentes”, referiu.
A campanha arranca domingo e consiste na distribuição de folhetos informativos por médicos, especialistas e doentes.
“Damos a conhecer os direitos dos doentes e pedimos que nos reportem a sua jornada [de levantamento de medicação], boa ou má, de forma a fazermos mais pressão”, explicou Jaime Melancia.
Paralelamente, a PSOPortugal decidiu apoiar uma petição ‘online’ da A.N.D.A.R – Associação Nacional dos Doentes com Artrite Reumatoide que pede a revogação da portaria 99/2022.
A psoríase é uma doença inflamatória crónica, não contagiosa, do foro imunológico que se manifesta principalmente na pele e que afeta mais de 400 mil doentes em Portugal.
Além dos sintomas físicos, os doentes apresentam sofrimento psicológico e constrangimentos sociais e financeiros, que não estão necessariamente relacionados com a extensão da doença.
Estes distúrbios mentais estão sobretudo relacionados com a interação social e exposição em público.
“São conhecidos os casos de ‘bullying’, havendo inclusivamente casos de tentativas de suicídio em doentes psoriáticos”, lê-se na informação remetida pela associação à Lusa.
Um doente psoriático tem em média menos cinco anos de vida.
“Fala-se muito em custos e falta falar em investimento para tratar bem as pessoas. Um estudo científico espanhol mostrou que investir um euro em tratar bem um doente de psoríase, representa cinco euros de retorno desse investimento. Os medicamentos biológicos são muito caros, mas um doente de psoríase com a pele livre de lesões é uma pessoa muito mais produtiva, muito menos absentista, mais feliz, um melhor consumidor”, considerou Jaime Melancia.
O facto de um doente com psoríase poder evoluir para uma atrite psoriática com possibilidades de incapacidade e comorbilidades é outro argumento da PSOPortugal
“Um doente bem tratado deixa de ser um consumidor de recursos do SNS”, concluiu.
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