De que forma a menopausa pode afetar o corpo da mulher? Quais os principais sintomas?

Com a chegada à menopausa, caracterizada pela ausência definitiva dos ciclos menstruais, há vários sintomas que podem afetar o dia a dia das mulheres.

A redução dos níveis de estrogénios e progesterona, que acontece de forma abrupta nesta fase, está associada à diminuição da massa magra e aumento da massa gorda, nomeadamente da adiposidade central, tudo o que a mulher não quer. De facto, um dos aspetos mais relatados nesta fase é o ganho de peso e a acumulação de gordura visceral, que estão associados a maior risco de distúrbios metabólicos, como resistência à insulina, diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares.

A alteração do peso está relacionada com um aporte calórico excessivo relativo ao gasto energético individual, mas as alterações hormonais podem estar na base deste processo. Por um lado, com a queda dos estrogénios, a eficácia da leptina (“hormona da saciedade”) pode diminuir, e os níveis de grelina (“hormona da fome”) aumentam. Isto faz com que seja mais difícil sinalizar a saciedade, levando a mais apetite e um maior consumo de alimentos. Por outro lado, outros sintomas típicos desta fase, como alterações no humor, maior irritabilidade e fadiga generalizada, também podem ter como consequência uma alimentação “mais emocional”, levando a uma ingestão por vezes hipercalórica. Além disso, a própria queda de estrogénios aumenta a tendência para o armazenamento de gordura, uma vez que os seus recetores na gordura subcutânea ficam inativados, enquanto os recetores de andrógenos na gordura visceral se tornam mais ativos.

Outros sintomas podem acontecer nesta fase, como ondas de calor, transpiração noturna excessiva, afrontamentos, fadiga, memória prejudicada, insónias, entre outros. A menor qualidade do sono pode influenciar o peso corporal, uma vez que diminuiu os níveis de leptina no organismo e gera mais cansaço, havendo a necessidade de comer mais para compensar a falta de energia sentida. Outros sinais que importa destacar são a diminuição da líbido e o ressecamento vaginal, o que aumenta o risco de infeções urinárias e pode ser a causa de relações sexuais mais dolorosas.

No fundo, esta é uma fase vivida de forma diferente por cada mulher, com sintomas e experiências que variam amplamente. Enquanto algumas podem passar pela menopausa com poucos desconfortos, outras enfrentam desafios significativos, tornando importante adotar estratégias individualizadas.

Durante a menopausa, que mudanças hormonais ocorrem e que afetam a saúde do coração?

Durante a menopausa, a principal mudança hormonal é a redução dos níveis de estrogénios e progesterona. Essa diminuição afeta a saúde do coração de várias maneiras. Primeiro, os estrogénios contribuem parar manter a elasticidade das artérias e ajuda a regular os níveis de colesterol. Com a sua queda, ocorre um aumento dos níveis de LDL (colesterol "mau") e uma diminuição do HDL (colesterol "bom"), elevando o risco de doenças cardiovasculares.

Além disso, muitas mulheres podem ter um aumento da pressão arterial, o que também contribui para riscos cardíacos. Outro ponto importante é a resistência à insulina, que pode aumentar, levando a diabetes tipo 2, outro fator adicional de risco cardiovascular.

O ganho de peso e o aumento da gordura na zona abdominal também influenciam este risco. O tecido adiposo é um órgão endócrino ativo que segrega fatores bioativos chamados adipocinas, com um papel importante na regulação da inflamação. O aumento da massa de tecido adiposo tem sido associado a uma desregulação da secreção de adipocinas, levando ao aumento da produção de adipocinas pró-inflamatórias, ou seja, causadoras de inflamação, o que representa uma ligação patogénica no desenvolvimento de doenças cardiometabólicas.

Após a menopausa, quais são os principais fatores de risco para a saúde cardiovascular das mulheres?

Um dos principais fatores de risco para a saúde cardiovascular nas mulheres após a menopausa é o baixo nível de estrogénios, que possuem efeitos protetores no sistema cardiovascular. Além disso, o próprio ganho de peso e a acumulação de gordura visceral, por mecanismos já explicados, estão associados a hipertensão, diabetes tipo 2 e dislipidemias que, por sua vez, estão na base dos problemas cardiovasculares. A pressão arterial tende a aumentar com a idade, e as mudanças no perfil lipídico, como o aumento do colesterol LDL e a diminuição do HDL, são comuns, contribuindo para uma maior inflamação crónica. A inflamação traz mais stress oxidativo, o que está associado ao comprometimento da função ventricular cardíaca e da função endotelial.

O sedentarismo também é um fator relevante, pois a diminuição da atividade física está associada a uma pior gestão do peso, da gordura, do apetite, stress e sono, contribuindo para o aumento do risco cardiovascular.

 De que forma os níveis de colesterol são afetados nesta fase?

A redução dos estrogénios pode levar a um aumento nos níveis de lipoproteína de baixa densidade (LDL), considerado o "mau colesterol ", e à diminuição dos níveis de HDL (“bom colesterol”), que está associado a um maior risco de doenças cardiovasculares. O colesterol LDL, que se tende a acumular nas artérias, favorece o desenvolvimento de aterosclerose, condição que aumenta o risco de enfarte e acidente vascular cerebral. O próprio aumento da gordura acumulada na zona abdominal e a resistência à insulina podem afetar o perfil lipídico de forma negativa. Não descartando a origem hormonal, se o apetite e, consequentemente, a ingestão alimentar é afetada de uma forma negativa, as consequências no perfil lipídico também se farão sentir.

Como a pressão arterial e o aumento de peso se relacionam com os riscos cardiovasculares após a menopausa?

À medida que os estrogénios vão diminuindo, a vasodilatação pode ficar comprometida, aumentando a pressão arterial. Após a menopausa, a queda nos níveis de estrogénios provoca mudanças metabólicas que contribuem para o aumento da pressão arterial e para a acumulação de gordura visceral, fatores diretamente associados ao risco cardiovascular. O aumento da pressão arterial elevada está relacionado com maior rigidez arterial e aumento na resistência vascular. Além disso, o ganho de peso, especialmente gordura visceral, está relacionado com a dislipidemia, resistência à insulina e síndrome metabólica, que são grandes preditores de doenças cardíacas. A acumulação de gordura na zona abdominal também eleva os níveis de inflamação, promovendo o desenvolvimento de aterosclerose e outros problemas cardíacos. Por isso, controlar a pressão arterial e o peso é fundamental para a redução do risco cardiovascular.

 A falta de atividade física e uma alimentação inadequada agravam esses riscos. Que estratégias recomendaria para os mitigar?

De facto, o estilo de vida tem um papel primordial na redução do risco cardiovascular. Por isso, implementar uma rotina de atividade física, com atividades aeróbicas (como corrida, caminhada, atividades na água como natação ou hidroginástica, etc.) e treinos de força para ajudar a manter a massa muscular e o metabolismo, é fundamental, contribuindo também para a gestão do stress e melhoria do sono, também fatores essenciais na mitigação deste risco.

Usar escadas em vez do elevador, caminhar sempre que possível em vez de usar o carro para fazer pequenas distâncias, fazer pausas ativas no trabalho e movimentar-se são pequenos hábitos para começar a ser mais ativa. A prática de exercício físico deve ser feita de forma consistente, só assim ajudará a manter o metabolismo elevado, contribuindo para a saúde cardiovascular, fortalecimento dos músculos, melhoria do humor e do sono e combate ao ganho de peso.

No que diz respeito aos hábitos alimentares, de uma forma generalizada, priorizar uma alimentação anti-inflamatória, rica em antioxidantes, com alimentos de baixo índice glicémico e ricos em fibras, ajuda a manter a saciedade por mais tempo e a controlar o apetite, além de oferecer um aporte nutricional elevado. Na prática, isso inclui o consumo de vegetais, leguminosas, frutas, proteínas como peixes, aves e ovos e gorduras saudáveis como sementes, azeite e oleaginosas. Pelo contrário, reduzir gorduras saturadas e trans, limitando a ingestão de alimentos processados, fritos e carnes gordurosas, ajudará a manter os níveis de colesterol adequados. Estratégias como planear refeições, ter legumes congelados já prontos para cozinhar, ter enlatados de peixe para refeições que precisam de ser mais rápidas, mas ainda assim manterem-se saudáveis quando não há possibilidade de consumir os alimentos frescos. Acima de tudo, descascar mais e desembalar menos, ou seja, fazer uma alimentação mais natural e com menos produtos embalados.

É necessário também ter em atenção que, apesar de uma alimentação saudável, equilibrada, completa e variada, nem sempre é possível atingir as necessidades de alguns nutrientes, principalmente tendo em conta as exigências mais elevadas em algumas fases da vida, como a menopausa, restrições alimentares ou absorção comprometida. Nesses casos, pode ser necessário recorrer à suplementação nutricional para garantir a ingestão adequada de vitaminas, minerais e outras substâncias importantes para a otimização do funcionamento do organismo. Contudo, é fundamental que esta seja orientada por um profissional de saúde, garantindo que seja personalizada às necessidades individuais e que garanta a o objetivo pretendido de uma forma segura.

Recentemente, um estudo KiSel-10 mostrou que a suplementação com selénio e coenzima Q10 pode reduzir a mortalidade cardiovascular em 54%. De que forma estes nutrientes atuam no corpo?

Tanto o selénio como a coenzima Q10 são dois potentes antioxidantes que, para além de outras funções, vão atuar nos mecanismos de defesa contra o stress oxidativo, condição que acompanha o avançar da idade.

Com as amostras recolhidas no estudo kiSel-10, os investigadores já realizaram 22 novos estudos, em que analisaram diversos biomarcadores relacionados com o envelhecimento e saúde cardiovascular. Num dos estudos, analisou-se a Proteína C Reativa (PCR) e a P-selectina, dois marcadores que, habitualmente, aumentam com a idade como sinal de aumento de inflamação e stress oxidativo no organismo. Comparativamente ao grupo que fez placebo, o grupo que suplementou com coenzima Q10 e selénio (na forma de levedura enriquecida com selenometionina), teve impacto positivo nesses valores. Numa mais recente publicação, foi analisado o nível sanguíneo da proteína SIRT1 que, normalmente, diminui com a idade e que tem propriedades benéficas, ajudando o organismo no combate à inflamação. Ou seja, quando os níveis de SIRT1 no sangue descem, as defesas do organismo contra o stress oxidativo também diminuem. Os participantes que tomaram 200 microgramas de selénio e 200 miligramas de Q10 todos os dias, durante quatro anos, aumentaram os níveis SIRT1, enquanto o grupo que tomou placebo, reduziu drasticamente.

O selénio faz parte da glutationa peroxidase, uma enzima antioxidante que protege as células dos danos causados pelos radicais livres, contribuindo para a redução da inflamação e para a manutenção da função endotelial. Além disso, níveis adequados de selénio estão associados à redução do colesterol LDL oxidado, que é um fator chave no desenvolvimento da aterosclerose e outros problemas cardíacos.

Tal como o selénio, a coenzima Q10 é também uma molécula antioxidante, ou seja, neutraliza os radicais livres, protegendo as células do stress oxidativo e da inflamação, mas o seu papel na saúde cardiovascular é potenciado pela sua ação na produção de energia nas células. A Q10 desempenha um papel central na cadeia de transporte de eletrões, processo pelo qual as mitocôndrias (as nossas centrais de produção de energia) produzem ATP (energia celular). O coração, sendo o órgão com mais mitocôndrias, é aquele que precisa de produzir mais energia para o seu correto funcionamento, logo é aquele que mais precisa de coenzima Q10 para produzir energia (ATP) e, por outro lado, de reduzir o stress oxidativo causado pela atividade mitocondrial. Daí que níveis insuficientes de coenzima Q10 possam resultar em fadiga e outros problemas cardíacos.

Assim, a combinação destes dois antioxidantes ajuda a reduzir os danos nas células do coração e dos vasos sanguíneos, reduzindo a inflamação e melhorando a saúde cardiovascular.

O texto menciona que o risco de inflamação crónica aumenta com a idade. Qual a importância de combater essa inflamação e de que forma o selénio e a coenzima Q10 contribuem para essa proteção?

A inflamação crónica está associada à progressão de doenças como aterosclerose, hipertensão e insuficiência cardíaca, aumentando o risco cardiovascular e contribuindo para o envelhecimento precoce.

A deficiência em selénio e coenzima Q10 está associada a um maior stress oxidativo que, por sua vez, aumenta a inflamação, condição que se agrava com a idade. Com o passar dos anos e principalmente a partir da quarta década de vida, produzimos cada vez menos coenzima Q10. Por outro lado, a ingestão de selénio, principalmente nos países da europa, é tipicamente insuficiente. Ambos os nutrientes colaboram, entre outras funções, na neutralização dos radicais livres e no funcionamento das mitocôndrias, pelo que a sua deficiência terá uma ação direta na redução da produção de energia e aumento do stress oxidativo, acelerando o envelhecimento celular.

A insuficiência de selénio é uma realidade em muitas regiões da Europa, devido à baixa presença deste mineral no solo. Que implicações isso tem para a saúde das mulheres na menopausa?

A insuficiência de selénio nos solos faz com que a ingestão a alimentar deste mineral seja, normalmente, baixa, o que tem consequências na saúde, especialmente na saúde da mulher na menopausa, fase em há maior suscetibilidade a mudanças metabólicas e hormonais. Já aqui foi explorado o seu papel importante na prevenção de problemas cardiovasculares, através da redução do stress oxidativo e inflamação, mas existem outras implicações a ter em conta.

Um dos órgãos mais afetados pela falta de selénio é a tiroide, uma vez que é o órgão com maior concentração deste mineral. O selénio é essencial para o funcionamento normal da tiroide, estando envolvido na conversão da hormona tiroidiana T4 (tiroxina) na sua forma ativa, T3 (triiodotironina). A deficiência neste mineral pode levar a disfunções na tiroide, podendo manifestar-se sintomas como fadiga, ganho de peso, sensibilidade ao frio e alterações no humor, sinais comuns e que se podem agravar na menopausa.

É de salientar também o seu papel importante na regulação da resposta imunológica, por isso a deficiência de selénio pode aumentar a suscetibilidade a infeções virais, e doenças autoimunes, como autoimunidade da tiroide (por exemplo, tiroidite de Hashimoto), entre outros. 

Que outros nutrientes ou hábitos saudáveis poderiam ser incluídos?

A estratégia para ajudar a reduzir os sintomas associados à menopausa, incluindo na pré, peri e pós-menopausa, passam sempre por manter um estilo de vida saudável, o que implica ter uma boa alimentação, praticar exercício físico, ter um sono reparador e uma adequada gestão do stress. Tendo em conta que uma alimentação saudável nem sempre é suficiente para garantir um aporte nutricional adequado, pode ser necessário o reforço de alguns nutrientes como vitamina D, magnésio, ómega-3, melatonina, zinco, entre outros.

Especial destaque para a vitamina D, uma vez que a maioria da população, seja em que idade for, apresenta níveis insuficientes, comprometendo função cognitiva, imunitária, etc. Isto acontece porque a alimentação não nos garante um aporte adequado e a exposição solar, processo pelo qual produzimos vitamina D, é baixa na maioria dos meses do ano. Assume especial importância na menopausa porque a vitamina D é essencial para a absorção do cálcio e, nesta fase, a perda de massa óssea intensifica-se, aumentando o risco de osteoporose. O magnésio também tem um contributo neste problema, e está envolvido noutras funções vitais do nosso organismo. A sua deficiência na mulher é comum, e poderá dar um apoio importante na redução da ansiedade, contribuindo para a diminuição do cortisol (hormona do stress), no relaxamento muscular e aliviar sintomas como insónias, enxaquecas, contribuindo também para a saúde cardiovascular. O ómega-3, devido às suas propriedades anti-inflamatórias, promove a saúde cardiovascular, além de auxiliar na função cognitiva. O zinco desempenha um papel importante na função imunológica e na saúde da pele, cabelos e unhas, contribuindo também para a redução do stress oxidativo. Substâncias como óleo de espinheiro marítimo contribuem para a hidratação das mucosas, melhorando sintomas de atrofia vaginal, que estão na base da secura da zona íntima e aumenta o risco de infeções urinárias. Existem muitos outros nutrientes que poderão ter interesse, o que depende da individualidade e dos sintomas de cada mulher.

Para além da otimização do estado nutricional, seja através da alimentação ou do apoio com suplementação, ter um estilo de vida saudável pode fazer a diferença.

Praticar exercício físico vai ajudar a manter o peso saudável, preservar massa muscular, reduzir o stress e melhorar o sono. Usar técnicas de relaxamento, como meditação, respiração profunda, pode ter impacto em sintomas como melhoria do sono, controlo do apetite e redução das ondas de calor e ansiedade. É importante também estabelecer uma rotina de sono, evitar cafeína, criar um ambiente tranquilo e evitar exposição à luz azul dos equipamentos eletrónicos antes de dormir, pois dificulta a produção de melatonina pelo próprio corpo, necessária para um sono reparador e para a neutralização de radicais livres. Não esquecer a importância da hidratação adequada. À medida que a idade avança o conteúdo de água no organismo vai diminuindo, por isso beber água suficiente ajuda a combater o ressecamento da pele e das mucosas, manutenção da cartilagem, entre outras funções. O tabagismo, por aumentar a produção de radicais livres, gera mais inflamação, o que pode piorar os sintomas da menopausa, além de aumentar o risco de doenças cardiovasculares e osteoporose.

Para algumas mulheres, a terapia de reposição hormonal pode ser uma opção para aliviar os sintomas da menopausa, devendo sempre ser discutida com o médico, considerando os riscos e benefícios individuais. No entanto, ter um estilo de vida saudável é a base.