As eleições de terça-feira 23 de março serão as quartas legislativas no país em menos de dois anos, e talvez as mais estranhas já organizadas em Israel.

Graças a uma ambiciosa campanha de imunização, que permitiu que quase 50% da população (quase dois terços do eleitorado) já tenha recebido as duas doses da vacina, o país iniciou a saída do confinamento, mas os candidatos não conseguiram organizar comícios eleitorais por causa das medidas sanitárias.

Os líderes políticos fizeram campanha por videoconferência, nas redes sociais e nas rádios locais. Também limitaram o acesso da imprensa nos poucos eventos organizados com eleitores.

Após as últimas eleições, Benjamin Netanyahu tentou, em vão, formar governos de direita estáveis, prometendo que anexaria áreas da Cisjordânia, ocupada por Israel desde 1967, um desafio crucial para grande parte dos eleitores da direita.

O 'biopoder'

"Mas desta vez a Pfizer tirou o lugar da anexação", afirmou à AFP a analista política Dahlia Scheindlin, ao destacar a ênfase do primeiro-ministro na ampla campanha de vacinação iniciada em dezembro graças a um acordo com a empresa farmacêutica americana.

Em troca dos dados sobre os efeitos da vacina na sua população, Israel obteve um fornecimento rápido do fármaco da Pfizer/BioNTech e conseguiu comprovar a sua eficácia em larga escala, de acordo com vários estudos publicados nas últimas semanas.

"Somos os primeiros do mundo (a sair progressivamente da pandemia), emergimos vitoriosos", afirmou Netanyahu esta semana, ao declarar-se o melhor candidato para comandar uma possível recuperação económica pós-covid.

Mas a vacina conseguirá imunizar Benjamin Netanyahu contra uma derrota? As pesquisas apontam que o seu partido, o Likud, obteria entre 27 e 30 cadeiras das 120 na Kneset (Parlamento). Seria a formação mais votada, mas sem representantes suficientes para alcançar a maioria necessária para formar o governo (61 deputados) com os seus aliados.

Netanyahu, que está há 12 anos no poder de forma ininterrupta, foi acusado pela justiça de corrupção e peculato numa série de casos, o que alimenta o descontentamento da população e, inclusive, de parte do seu partido.

"A vacina ajuda-o, mas será suficiente?", questiona Gideon Rahat, professor de Ciências Políticas na Universidade Hebraica de Jerusalém. "Claramente, a vacina continua a ser o seu trunfo eleitoral, porque fala das vacinas todos os dias, quer que as pessoas falem sobre isto. Para ele, trata-se de 'vacinas, vacinas, vacinas', a ponto de que poderíamos pensar que foi ele que vacinou a população", completou Rahat.

Guerra na direita

Nas últimas três campanhas eleitorais, Benjamin Netanyahu teve como principal rival o mesmo candidato: o ex-comandante do exército Benny Gantz, um político de centro-direita.

Mas depois de três confrontos sem um vencedor claro, os dois decidiram formar um governo de união, que durou apenas alguns meses. No final, a estrela política de Benny Gantz apagou-se.

Agora, Netanyahu pretende apresentar-se como o único candidato da "verdadeira direita", como repetiu na quinta-feira, para vencer os principais adversários: Yair Lapid, o líder da oposição de centro; Gideon Saar, ex-militante do Likud que formou o partido "Nova Esperança" (conservador), e o grande nome da direita radical Naftali Bennett.

"Netanyahu é muito bom para fazer campanhas negativas contra um candidato, mas ter diante dele vários candidatos deixa as coisas muito mais difíceis", aponta Rahat.

De acordo com as pesquisas, nem os partidos pró-Netanyahu (Likud e as formações religiosas) nem os partidos anti-Netanyahu (esquerda, centro e parte da direita) conseguiriam apoios suficientes para formar um Executivo, o que dá a Naftali Bennett (que ainda não se manifestou a favor de ninguém) uma importância chave no momento de formar um futuro governo.