Em declarações à agência Lusa, Daniela Figueiredo, investigadora do CINTESIS, no Porto, afirmou hoje que a covid-19 potencia o “agravamento de algumas situações relacionadas com a saúde psicológica” destes doentes que, dado o seu quadro clínico, são de elevado risco de infeção.
“Esta doença por si só já é profundamente exigente. Os tratamentos de hemodiálise implicam uma restruturação quase radical do estilo de vida dos doentes e das suas famílias. Isso, por si só, já leva a que estas pessoas manifestem sintomatologia depressiva bastante significativa e esta situação de pandemia potencia o agravamento destas questões”, sublinhou.
A doença renal crónica assenta numa diminuição lenta e progressiva, durante meses ou anos, da capacidade de os rins filtrarem resíduos metabólicos do sangue.
A investigadora e docente na Universidade de Aveiro considerou, por isso, essencial que estes doentes tenham “apoio psicológico de suporte”, por forma a permitir “gerir a ansiedade que lhes está latente” e a manter um regime alimentar adequado, evitando riscos de infeção e outras complicações associadas à doença crónica.
“Os doentes foram reportando algum sofrimento emocional por estarem isolados, por terem medo de sair. Estão na ambiguidade que precisam de se deslocar três vezes por semana às clínicas de diálise. Isto foi causando muito receio e algum stress emocional. De repente, viram-se a par com desafios acrescidos além da condição que já têm”, destacou a investigadora.
As recomendações surgem no âmbito de um estudo exploratório, publicado no jornal científico Seminars in Dialysis, que mostra o “impacto negativo da pandemia em marcadores de doença renal”.
O estudo, desenvolvido com base em dados qualitativos (entrevistas) e dados quantitativos (marcadores analíticos) de 20 doentes renais crónicos da mesma unidade de diálise, descreve os impactos da covid-19 ao nível da alimentação, atividade física e efeitos psicológicos.
Segundo Daniela Figueiredo, os investigadores verificaram uma “redução dos valores de adequação de diálise”, que, embora dentro dos valores de referência internacionais, se não forem acautelados podem “agravar-se”.
Outro impacto verificado foi ao nível da alteração das rotinas diárias, com estes doentes a reduzirem a sua atividade física, terem uma alimentação menos adequada às necessidades e evidenciarem dificuldades acrescidas na restrição de líquidos, fatores que “têm um papel determinante no tratamento e controlo da doença renal”.
“Estas pessoas tinham mais dificuldade em gerir a sua alimentação porque tinham medo de sair de casa, acabando por restringir a sua alimentação a produtos menos saudáveis e benéficos. Por exemplo, alguns doentes reportaram que a ansiedade lhes levava a ter sempre a boca e garganta secas, isso aumentou o consumo de líquidos o que depois se traduziu, de alguma forma, numa ameaça à sua hemodialise”, sublinhou.
A investigadora e docente destacou ainda que as pessoas com doença renal terminal, numa “combinação explosiva com uma série de fatores de risco” como a idade, diabetes, hipertensão e sistema imunitário mais vulneráveis, são “particularmente suscetíveis à infeção por covid-19”.
O estudo foi desenvolvido no âmbito do projeto “Together We Stand2, financiado pelo programa POCH do Portugal 2020 e pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT).
O próximo objetivo da equipa de investigadores é divulgar o impacto que a pandemia teve nos familiares destes doentes.
A pandemia de covid-19 já provocou mais de um milhão e setenta e sete mil mortos e mais de 37,5 milhões de casos de infeção em todo o mundo, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.
Em Portugal, morreram 2.094 pessoas dos 87.913 casos de infeção confirmados, de acordo com o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde.
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