O estudo, designado “VIBSonCANCER – Diagnóstico de Cancro a Nível Molecular por Espectroscopia Vibracional”, é liderado por Luís Batista de Carvalho e Maria Paula Marques, da Unidade de I&D “Química-Física Molecular” da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC). Financiado pelo Programa Operacional do Centro, Portugal 2020 e União Europeia, através do FEDER, com 240 mil euros, o projeto tem a colaboração dos polos de Coimbra (IPO Coimbra) e do Porto (IPO Porto) do Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil.

De uma forma geral, o projeto focou-se no desenvolvimento de métodos óticos de diagnóstico que podem usar radiação de laser ou de infravermelho (as chamadas espectroscopias de Raman e de infravermelho), com o objetivo de auxiliar os médicos na deteção precoce de cancro e avaliação de margens cirúrgicas. 

Isto porque as atuais técnicas de diagnóstico, as designadas técnicas histopatológicas, se baseiam em alterações morfológicas, ou seja, na forma das células e no seu ambiente, o que permite ao patologista determinar se elas estão normais, displásicas (alteradas) ou neoplásicas (cancerígenas). As técnicas propostas no VIBSonCANCER, além de não serem invasivas, permitem obter informação química para além da morfológica, sendo que as alterações a nível químico podem preceder as variações da forma celular. Esta informação adicional pode ser essencial para o médico poder efetuar um diagnóstico rigoroso e precoce da doença.

"As nossas técnicas não substituem as atuais, nem o pretendem fazer. O que nós queremos é fornecer informação que não é possível obter por outros métodos. Com as técnicas espectroscópicas nós analisamos a composição química, ou seja, utilizamos na mesma um microscópio ótico, mas também outro tipo de equipamento que permite visualizar, mais do que a morfologia, a composição química. Ora, quando há alterações celulares, esta composição química varia primeiro do que a forma, por isso, facilita o diagnóstico precoce", afirma Maria Paula Marques.

Técnica que já entrou na clínica de alguns hospitais

Enquanto atualmente só é possível avaliar a um nível morfológico, a técnica proposta pela equipa da FCTUC permite ver e analisar "alterações de composição química, por exemplo, de proteínas ou de lípidos. Trata-se de uma técnica que já entrou na clínica de alguns hospitais em países como os Países Baixos, a Inglaterra e o Canadá, em estudos piloto", esclarece a docente da FCTUC.

Para avaliar a eficácia da espectroscopia vibracional, a equipa testou várias amostras de tecidos, as designadas amostras cirúrgicas que são retiradas a doentes com o seu consentimento, e também amostras de margens cirúrgicas, ou seja, tecido em torno dos tumores que já não será maligno. Os resultados foram muito positivos, demonstrando o elevado potencial destes métodos. "Conseguimos detetar diferenças de composição química entre o tecido maligno e não maligno. E dentro dessas diferenças, há alguns constituintes celulares e do tecido que variam mais, os chamados marcadores. Testámos vários tipos de tecido maligno e não maligno, como, por exemplo, de cancro de mama, de língua, de próstata e de colo do útero", frisa a cientista.

Com os biomarcadores, a equipa vai poder apurar as técnicas, de modo a que sejam facilmente analisadas por qualquer clínico, mesmo que não seja espectroscopista, e poderem ser usadas no bloco operatório, por exemplo, para avaliar margens cirúrgicas intraoperativamente, ou quando se retiram biópsias fora do bloco, para distinguir se um tumor é maligno ou não. As margens cirúrgicas, explica Maria Paula Marques, representam um "grande problema para os cirurgiões. Quando retiram um tumor, os cirurgiões nunca podem ter a certeza absoluta da margem cirúrgica, sendo passível de erro. Atualmente, a percentagem de erro nessas margens tem valores ainda demasiado elevados".

Em suma, conclui a cientista, este projeto pretende contribuir para o "desenvolvimento de técnicas de espectroscopia vibracional de vanguarda. A nossa abordagem aplica métodos mais sensíveis e não invasivos para detetar cancro precocemente de uma forma rápida, uma vez que a deteção precoce permite um maior sucesso da quimioterapia ou de outro tratamento, uma maior sobrevida e um melhor prognóstico de tipos de cancro que são muitas vezes difíceis de diagnosticar em fases muito iniciais, como é o caso do cancro do pulmão".

Tendo em vista a translação da tecnologia para a clínica, os cientistas estão já a desenvolver um protótipo, esperando que estes métodos de diagnóstico mais rigorosos e não invasivos tenham um impacto importante no sucesso da quimioterapia e contribuam para o desenvolvimento de tratamentos personalizados com melhores prognósticos.

Para além de Luís Batista de Carvalho e Maria Paula Marques, a equipa inclui as investigadoras Ana Batista de Carvalho, Inês Pereira dos Santos, Adriana Mamede, Mariana Vide Tavares e o Dr. Paulo Figueiredo (IPO Coimbra).