O consumo de tabaco é um problema de saúde pública mundial cujo impacto na saúde oral e geral dos consumidores representa apenas uma peça do puzzle de todas as ameaças que este hábito pode causar, nomeadamente em termos económicos, sociais e ambientais. O ponto de partida para este artigo prende-se com a consciencialização de que qualquer tipo de hábito tabágico (convencional, eletrónico ou aquecido) é prejudicial à saúde, sendo, no fim de linha, a causa de morte mundial de cerca de 6 milhões de pessoas por dia. 

Numa sociedade em que o marketing digital apresenta um crescimento exponencial, de fácil acesso e se torna cada vez mais impactante, a informação ganhou uma volatilidade que pode culminar em interpretações erradas daquilo que está a ser transmitido. Os cigarros eletrónicos têm, na verdade, ganhado muita popularidade nos últimos anos porque, de certa forma, apresentam-se no mercado como inofensivos para os utilizadores. A estratégia de difusão das marcas utiliza uma mensagem positiva, enfatizando as vantagens do produto e enaltecendo o design cativante das máquinas, a variedade de sabores disponíveis, a ausência de odor comparativamente com o tabaco convencional e a facilidade de acesso.

Tudo isto leva-nos a questionar, se, efetivamente, os cigarros eletrónicos são menos prejudiciais que os cigarros convencionais? 

Apesar de existir evidência publicada neste âmbito, os resultados devem ser interpretados com precaução, uma vez que existe uma grande heterogeneidade inerente ao próprio produto, no que diz respeito à variedade de dispositivos, sabores e formulações. Para além disso, não se deve menosprezar a existência relativamente curta desta modalidade de tabaco, com génese em 2009 nos Estados Unidos da América. Posto isto, o desenvolvimento e mutação constantes do produto dificultam a realização de um estudo que contemple todos estes fatores de confundimento. 

Não obstante, esta evolução do cigarro normal para o eletrónico segue um princípio interessante, uma vez que o seu objetivo inicial constituía a criação de uma ferramenta para a cessação tabágica. E, na verdade, existe alguma evidência da sua eficácia nesse sentido, uma vez que a substituição de cigarros convencionais por eletrónicos parece ser mais aceite que a terapia de substituição de nicotina. Claro está que a sua efetividade comprovada carece de mais estudos, e deve estar integrada com aconselhamento profissional e farmacológico, quando apropriado.

 Dada a sua natureza recente, o impacto a longo prazo destes dispositivos na saúde geral é desconhecido, pelo que há uma grande preocupação com os jovens, que são precocemente expostos à nicotina e outros agentes. Inclusivamente, existem estudos que sugerem um possível impacto no desenvolvimento cerebral de jovens utilizadores.

É ponto assente que fumar tabaco tem grandes impactos negativos na saúde oral. Embora alguns estudos sugiram que os cigarros eletrónicos são menos prejudiciais que os cigarros convencionais, é importante destacar que o uso de cigarros eletrónicos aumenta a suscetibilidade do utilizador ao desenvolvimento de alterações nos tecidos orais comparativamente com ex-fumadores ou não-fumadores.

As alterações orais mais reportadas são:

- Alteração do microbioma oral, devido à alteração do ph.

- Hipossialia (diminuição do fluxo salivar normal) e diminuição do fluído crevicular (fluido que preenche o sulco periodontal) que afeta o potencial remineralizante (de proteção do dente) da saliva. Logo temos uma maior suscetibilidade para o desenvolvimento de lesões de cárie.

- Devido ao efeito vasoconstritor do fumo e da nicotina, existe uma redução da hemorragia ao nível da cavidade oral, o que gera um falso parâmetro de saúde gengival. Mascara mais facilmente uma doença periodontal, sendo o tabaco um dos seus principais agentes causais.

- E ainda, o aumento da prevalência de candidíase hiperplásica, a lesão mais frequente em utilizadores de cigarros eletrónicos, possivelmente pela alteração do ph e composição salivares por ação dos compostos químicos presentes nas formulações.

Em súmula, os cigarros eletrónicos constituem, à semelhança dos convencionais, um fator de risco para a saúde oral e devem ser evitados, especialmente por aqueles que já têm patologia existente. É importante frisar que o melhor método para proteger a saúde oral é não fumar.

Por isso, o melhor mesmo é prevenir e não fumar!

As explicações são dos médicos dentistas Carlota Mendonça e Hugo Madeira, especialistas na Clínica Hugo Madeira.

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