As lesões dos membros superiores são, como esperado, uma minoria num desporto como o futebol. Se contarmos só com antebraço, punho e mão então não chegam a justificar 1% do tempo perdido pelos jogadores sem poder jogar. Ainda assim, têm impacto na equipa. Uma fratura no escafoide (um dos ossos do punho) durante um treino do Vitória de Setúbal, na temporada de 2000-01, obrigou Fernando Brassard a abandonar a carreira de guarda-redes com apenas 29 anos. Mais tarde tornou-se treinador de guarda-redes da Federação Portuguesa de Futebol. Ainda recentemente o guarda-redes do FC Porto Diogo Costa, em 2019 sofreu uma luxação num dedo e ficou várias semanas sem jogar, pondo em perigo a sua presença na Champions League desse ano. Mais recentemente Matheus Uribe, médio do FC Porto, sofreu uma lesão do punho que necessitou de cirurgia. Felizmente a norma é o retorno a 100% à pratica desportiva e à competição após os tratamentos.

Em primeiro lugar os jogadores lesionam-se de três formas: em queda de mão ao chão em corrida, no choque contra outros jogadores e ao defender a bola com as mãos. Claramente todos os jogadores correm riscos, embora haja diferenças consoante a posição em campo. Efetivamente um terço das lesões ocorre no guarda-redes e deve-se maioritariamente a contacto com a bola, dois terços ocorrem nos outros jogadores, geralmente por choque com outro jogador ou por queda de mão ao chão. No entanto, nas ligas profissionais devido ao nível de exigência o cenário muda e os guarda-redes têm um risco de lesão do punho e mão sete vezes superior ao dos outros elementos da equipa. De notar que num chuto certeiro, por vezes, a bola atinge 100 a 120 Km/h.

Outro problema é que as lesões ocorrem quer em treino quer em jogo. A maior parte das lesões durante o treino ocorrem nos jogadores em campo por colisão e as lesões dos guarda-redes ocorrem durante o jogo. Nos jogadores profissionais há menos lesões durante o treino e mais no jogo, a altura mais perigosa é mesmo a segunda metade da partida.

Devemos ter em atenção que o grupo etário de maior risco são os adolescentes, geralmente rapazes. Ainda assim as lesões mais graves ocorrem em adultos. Aliás, nos profissionais, as lesões mais frequentes desta localização são mesmo as fraturas graves do punho. Já as jogadoras tendem a ser menos violentas, têm menos lesões e de menor gravidade. 

Devemos ter em atenção que também ocorrem lesões em jogos informais com amigos ou colegas de trabalho. A segurança é sempre importante.

As fraturas e luxações das falanges são mais frequentes nos guarda-redes e ocorrem sobretudo durante o jogo. Mas as fraturas dos ossos do punho e da palma da mão (metacárpicos) são muitas vezes submetidas a cirurgia e podem implicar ausências mais longas. As fraturas dos metacárpicos são as mais frequentes, ocorrem por qualquer destes três mecanismos. As do rádio no punho e do escafoide são as mais graves e, geralmente, devem-se a quedas ou defesa de bola – claramente se percebe o risco constante para os guarda-redes. Aliás, são eles que, uma vez lesionados, independentemente do tipo de lesão, são obrigados a manter-se mais tempo fora do campo.

Nos atletas profissionais e perto das datas de competição são muitas vezes preferidas soluções cirúrgicas para estas fraturas. Concretamente os tipos de cirurgia que permitam o regresso mais rápido à atividade.

Devido à magnitude do problema a FIFA criou um plano de treino de prevenção das lesões, entretanto atualizado, o FIFA 11+. Já foi provado que a sua implementação reduz efetivamente o número de lesões em cerca de 30%, com impacto também nas lesões de punho e mão. Embora exista um programa similar específico para a prevenção das lesões dos ombros nos guarda-redes (FIFA 11+S), ainda não foi criado um programa vocacionado para as lesões do punho e mão.

No punho e mão temos, no entanto, outro meio de prevenir lesões: o equipamento, que tem aqui um papel protetor importante. A qualidade e especificações técnicas das luvas têm vindo a ser desenvolvidas nesse sentido. Igualmente, a cultura em campo é um fator que pode e deve ser alterado. Nomeadamente as crianças e adolescentes devem respeitar categorias de peso e idade, jogar com bolas adaptadas à sua dimensão e ter treinos e regras adaptadas à sua condição de indivíduos em crescimento. Temos de proteger o futuro dos nossos jogadores de todas as idades!

Tal como a nossa Seleção promove treinos em segurança, também todos os outros jogos - sejam de competição ou lazer - devem promover as medidas que permitam jogar assegurando a saúde dos atletas. E não esqueçamos - as lesões devem sempre ser valorizadas e devidamente avaliadas pelo Médico.

Um artigo da médica Carla Ricardo Nunes, ortopedista na Unidade de Punho e Mão do Hospital CUF Tejo - Unidade de Medicina Desportiva e Performance.

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